Imagine a sensação de um paraplégico ao se locomover na posição vertical após tantos anos sentado em uma cadeira de rodas. A sensação de uma pessoa com paralisia cerebral ao escrever um livro apenas com sopros que acionam as letras que passam na tela do computador. Ou ainda o alÃvio de alguém que teve a mão amputada e pôde novamente almoçar e escovar os dentes sozinho. Mas criatividade é o que não falta aos funcionários do Equiphos, grupo de tecnologia da Rede Sarah de Hospitais que, ao longo das últimas três décadas, levou o conceito estético do design de interiores para a criação de aparelhos médicos usados nos quartos hospitalares de BrasÃlia e em outras capitais do paÃs. Parte do trabalho e da história desses profissionais pode ser vista na II Bienal Brasileira de Design, que segue até 5 de novembro no Museu Nacional Honestino Guimarães, ao lado da Rodoviária do Plano Piloto. Uma idéia, traços em folha de papel e mão na massa — essa é a receita dos desenhistas industriais e arquitetos do Equiphos para resgatar a qualidade de vida e a auto-estima de pacientes em reabilitação nos hospitais da Rede Sarah. Com sede em BrasÃlia, os trabalhos desenvolvidos pelo grupo transformaram a vida de pessoas como o professor de quÃmica Augusto Hosanna, 33 anos. Em 1999, um acidente de carro próximo ao Paranoá lhe tirou os movimentos das pernas. “Foi um baque grande. Eu tinha a vida ativa, sempre de um lado para o outro”, lembrou. Quatro anos depois, a convite da equipe de design do Sarah, o morador do Sudoeste experimentou novamente a liberdade de se locomover na posição vertical. “Precisávamos de pacientes para testar um novo modelo de cadeira de rodas. QuerÃamos inovar, colocar paraplégicos de pé”, contou o designer William Gouvêa, 48 anos. Surgiu então o ortomóvel, que deu certo e realizou sonhos. “Posso usar todo o quadro-negro e olhar os alunos de cima. Colar na minha aula? Nem pensar”, adverte Augusto. O aparelho, reconhecido mundialmente como uma pérola do design (ganhou IF Award 2004, na Alemanha) é um dos destaques da bienal em BrasÃlia. Um vÃdeo projetado na exposição revela o funcionamento da cadeira. Basta soltar a trava de segurança e um simples movimento de braço aciona o sistema mecânico que levanta o paciente. “O segredo é o ângulo em que as peças foram colocadas”, explicou William. E quem disse que criatividade não faz bem à saúde? Augusto e outras dezenas de pacientes do Sarah comemoram as melhoras no quadro clÃnico após o uso do ortomóvel. “Meu intestino funciona melhor, ganhei auto-estima e a boa circulação do sangue diminui as dores no corpo”, disse o professor. Dia-a-dia Entre as criações da equipe do Sarah expostas no salão do Museu Nacional Honestino Guimarães (homenagem ao lÃder estudantil vÃtima da ditadura), pode ser visto um carrinho de brinquedo desenvolvido pelo artista plástico Athos Bulcão (1918-2008), uma máquina de etiquetas que diminui os riscos de troca de medicamentos durante procedimentos de riscos e uma mão mioelétrica (veja quadro ao lado). Boa parte da demanda do Equiphos vem dos médicos e pacientes, que buscam soluções para problemas enfrentados no dia-a-dia. Uma delas surgiu do excesso de tempo numa mesma posição por pessoas incapazes de se movimentar. “Fizemos um colchão inflável dividido em gomos. A máquina alterna o enchimento dos gomos pares e Ãmpares para que a pele não fique o tempo todo em contato com a superfÃcie”, detalhou o desenhista industrial William. Ele desenvolveu o projeto em 2000, ao lado dos colegas Cláudio Duarte, 59 anos, Henry Magalhães, 38, e Antônio Carlos Gouvêa, 59. O começo Em meados de 1976, um grupo de arquitetos e desenhistas industriais se reuniram na capital do paÃs. O motivo do encontro: começar os preparativos para a inauguração da primeira unidade da Rede Sarah de Hospitais. Entre eles, o arquiteto João Filgueiras de Lima, o Lélé, que deu a idéia de montar uma equipe para a criação de objetos hospitalares que marcariam a abertura dos atendimentos no prédio, no inÃcio da W3 Sul, em 1980. Era o começo do Equiphos. Naquele tempo surgiu o primeiro grande projeto do grupo, premiado nacional e internacionalmente. A cama-maca permitia ao paciente ajustar a inclinação do leito e dava mais mobilidade para o trânsito entre as diferentes salas do hospital. O designer Daniel Simon comenta visita à BrasÃlia e à II Bienal Brasileira de Design Ouça o que o designer Lonrenzo Ramaciotti diz sobre a visita à BrasÃlia e à II Bienal Brasileira de Design Leia mais na edição impressa do Correio Braziliense