Acompanhada da mãe, com a aparência abatida, tom de voz baixo, porém firme. Essa era a imagem da professora Elizabeth Barros, 26 anos, no início da tarde de ontem, quando falou ao Correio na sede do Sindicato dos Professores (Sinpro). Ela é acusada pela servidora pública Rejane Vieira Urani, 36 anos, mãe de um aluno de 5 anos, de ter segurado a criança com as mãos para trás e incentivado os coleguinhas a baterem no rosto do menino. Versão negada pela professora. ;Quando soube disso fiquei assustada e comecei a chorar. Eu disse que não tinha feito aquilo, que não sou esse monstro;, desabafou.
A agressão teria ocorrido na terça, em uma sala de aula da Escola Classe 56, no Setor O de Ceilândia. A mãe do menino registrou ocorrência contra a professora na 24ª DP (Setor O), após ter sido procurada pelo pai de um colega do filho. Elizabeth teve a demissão anunciada pela Secretaria de Educação na quarta-feira. Ontem, diferentemente do que havia informado na quarta, o governo disse que a professora foi suspensa das atividades até que uma sindicância apure os fatos. ;A minha vida está um inferno. Fui pré-julgada sem sequer ter sido ouvida. Desde então só o que faço é tentar mostrar o que realmente aconteceu.;
Ela disse não ter comunicado o fato à direção da escola para preservar o garoto, que corria o risco de ser expulso por conta do histórico de agressividade. Na noite de ontem, a diretora Luiza Brito confirmou que o aluno era agressivo, mas disse não se lembrar de quantas ocorrências estão registradas no livro da escola. Ainda segundo ela, existia, sim, a possibilidade de ele ser expulso.
A mãe da criança confirmou ter sido alertada pela direção sobre o comportamento do filho. Segundo ela, o garoto esteve envolvido em dois casos. ;Ele e um coleguinha brincavam de empurar. O menino caiu, bateu a boca na lixeira e sofreu um corte. No dia seguinte, uma menina o empurrou. Ele devolveu, ela caiu e machucou a orelha. Não apóio esse comportamento e sempre o corrijo. Mas nada justifica o que essa professora fez.;
A briga
Elizabeth Barros contou à reportagem que a confusão teve início por volta das 10h, momento em que ela voltava com os meninos do banheiro para a sala de aula. Ao formar a fila, o garoto supostamente vítima das agressões teria começado a simular uma luta com um dos coleguinhas. Sem conseguir fazê-lo parar, Elizabeth decidiu deixá-lo na sala com as meninas e seguir com o restante dos alunos para o banheiro.
A professora disse ter ficado fora da sala por aproximadamente cinco minutos. Ao retornar, percebeu a confusão. ;Ele (a suposta vítima das agressões) brigava com as meninas e logo outros alunos entraram na briga. Ele estava de costas para a porta, era o que estava mais perto de mim, o mais alto e forte da turma. Eu segurei os dois braços dele para trás e o puxei para tirá-lo da confusão;, contou Elizabeth.
Segundo a professora, nos segundos seguintes ela pediu insistentemente para o garotinho se acalmar. ;Eu dizia: ;Pára com isso, pára com isso;. Mas não adiantava. Mesmo puxando-o para trás, ele continuava se debatendo com as pernas e atingindo os coleguinhas, que partiam para cima dele para revidar;, detalhou.
Durante a confusão, Elizabeth disse ter visto o garotinho levar um tapa no rosto de outro que ele acabara de atingir com um chute. Nesse momento, os estudantes teriam começado a ;fazer chacota; com o menino, dizendo: ;A tia te segura, a tia te segura, você não pode mais bater na gente;. Ao perceber que não conseguia controlar a situação, Elizabeth teria gritado com a turma ordenando que todos se sentassem. Só então, conseguiu dispersar as crianças. O que se seguiu, segundo Elizabeth, foi uma conversa com todos. Passou uma atividade, colocou no castigo o aluno que viu bater no rosto do garotinho ; ele ficou sentando em uma mesinha ao lado da dela durante a tarefa ; enquanto o menino que teria começado a briga foi levado para a sala de outra professora.
Elizabeth disse ter sido surpreendida na manhã de quarta com as acusações da mãe do garoto. Ao saber que ela tinha dado queixa à polícia e que a imprensa estava a caminho da escola, disse ter se desesperado. Chegou a procurar atendimento em um hospital. Por isso, alega, não teria se sentido em condições de se defender num primeiro instante. ;Minha imagem agora é a da professora que gosta de deixar os alunos brigando. O que eu ganharia com isso podendo perder o contrato temporário e tendo um concurso público anunciado?;
Faz quatro anos que Elizabeth Barros se dedica à educação infantil. Primeiro em escolas públicas de Águas Lindas (GO). E, desde fevereiro, na rede pública do DF por contrato temporário.
Fui pré-julgada sem sequer ter sido ouvida. Desde então só o que faço é tentar mostrar o que realmente aconteceu
Apuração da polícia pode ser concluída na segunda
A professora Elizabeth Barros vai prestar depoimento hoje à tarde na 24ª Delegacia de Polícia (Setor O de Ceilândia). O delegado-chefe, Vivaldo Neres, ouviu ontem a diretora e uma coordenadora da Escola Classe 56, além do pai de um aluno. Ele já intimou a servidora pública Rejane Vieira Urani, 36 anos, a mãe do menino supostamente agredido, e outros dois pais. Neres não acha necessário ouvir as crianças. ;O que as crianças disseram para os pais é o que elas diriam para mim;, justificou o delegado, que pretende resolver o caso rapidamente, se possível até segunda-feira.
Neres não considera ;conduta normal de um professor; segurar os braços do aluno. ;Se ela tivesse feito algo normal, as crianças não teriam comentado. Algo estranho ocorreu;, completou Neres, que também não acredita na hipótese de as crianças terem inventado a história. ;Não estou fazendo acusação leviana. Não tem como criança inventar isso;, comentou a mãe do garoto. O menino deve voltar à escola na segunda-feira.
A professora acusada de ter incitado as agressões filiou-se ontem ao Sindicato dos Professores (Sinpro), que assumiu a defesa dela. O presidente da entidade, Washington Dourado, disse que moverá duas ações: contra a mãe do garoto e contra o Estado. ;Vamos pedir reparação dos danos financeiros e morais. E pediremos que a sindicância não seja conduzida pela diretora da regional de Ceilândia. Quando ela disse que a professora teria admitido conduta imprópria, perdeu a isenção.;
A nova ;tia;
A turma do garoto conheceu ontem a professora que ficará no lugar de Elizabeth Barros até o fim do ano. Márcia Lima, 32, também tem contrato temporário e, desde fevereiro, atuou em duas escolas ; em Taguatinga e em Ceilândia. Perguntada pelas crianças onde estava a ;tia Beth;, ela respondeu que a antiga professora ;teve de resolver uns problemas e que não deve voltar;. As crianças não comentaram o episódio da terça. ;Coloquei música, fizemos leituras, eles ficaram envolvidos e nem tocaram no assunto;, contou.
Diante da repercussão do caso, colegas de trabalho de Elizabeth Barros saíram em defesa dela. ;Acho que as crianças não entenderam o fato de ela ter segurado o menino;, opinou Lya Fernanda Holanda, 27 anos. ;Não acredito que seja verdade;, emendou Ana Maria Fernandes, 48. As professoras destacaram que o garoto já havia brigado antes na escola.
Apesar do histórico de agressividade, a equipe psicopedagógica da regional de ensino nunca havia sido acionada. Só ontem a direção do colégio pediu ajuda das especialistas. ;Pode ser que as professoras tenham achado que resolveriam sozinhas;, afirmou a pedagoga Wellyeny Carvalho. A partir da semana que vem, o aluno terá acompanhamento para trabalhar a agressividade e para minimizar possíveis danos provocados pelo episódio. (AB e DA).