Três meses de tolerância zero à dupla álcool e volante. Três meses consecutivos de queda nas mortes e acidentes com mortes no Distrito Federal. O Correio teve acesso com exclusividade ao levantamento preliminar do Departamento de Trânsito (Detran). Ele revela redução de 19,7% nas mortes e de 22,2% nos acidentes com morte nas pistas do DF. O período analisado é o de 87 dias antes e depois da entrada em vigor da Lei Federal nº11.705/08, a lei seca.
As vidas poupadas reforçam os argumentos dos defensores da lei. As mortes caíram de 127 para 102: 25 a menos. ;Nesses três meses tivemos um único acidente com morte durante a madrugada. E o condutor estava alcoolizado. Este é um dado muito importante. Antes da lei seca, a maior parte dos acidentes com morte ocorriam nesse período;, analisou o diretor-geral do Detran, Jair Tedeschi. Os números definitivos só serão fechados em 30 dias. Mas Tedeschi acredita que, mantida a tendência, o percentual de queda das mortes e dos acidentes com morte durante a vigência da seca será ainda maior quando os dados forem comparados com os do mesmo período do ano passado.
Mesmo com o balanço positivo do órgão de trânsito, a legislação que impôs a boa parte dos brasileiros um comportamento mais racional ao volante ainda causa polêmica. Há, entre os motoristas, quem ache um exagero a rigidez da tolerância zero. Entre os donos de bares e restaurantes sobram reclamações de falência, demissões, além de ações na Justiça para derrubar a lei.
Inconformados, representantes dos sindicatos patronal e dos empregados em hotéis, bares restaurante do DF se dizem mergulhados numa das piores crises do setor. Os patrões falam em 500 demissões e 400 trabalhadores de aviso prévio. Os empregados estimam em 1 mil a quantidade de desligamentos, sendo 40% deles por causa da intolerância à combinação de álcool e volante.
A situação, segundo o presidente do Sindicato dos Hotéis, Bares, Restaurantes e Similares de Brasília (Sindhobar-DF), Clayton Faria Machado, só se agravou nos últimos três meses. ;Brasília tem sido, se não a única, a principal capital mais fiscalizada. Estive em São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e não vi nada parecido com isso aqui. Não existe esse legalismo de Brasília;, criticou Machado.
O Sindhobar, em parceria com a Associação Brasileira de Restaurantes e Empresas de Entretenimento (Abrasel-DF), mantém o site www.bebercomresponsabilidade.com.br por meio do qual colhe assinaturas em favor do que chama de ;adequação da lei de tolerância zero;. A intenção, segundo Clayton Machado é encaminhar o documento ao Congresso Nacional. ;Essa lei está tendo o efeito contrário entre a juventude. Antes, as mães deixavam recado no site criticando a postura do sindicato. Agora, nos apóiam porque os filhos elegem o amigo da vez e ultrapassam todos os limites;, relatou. Clayton Machado disse ter mais de 10 mil assinaturas favoráveis à iniciativa de tornar a legislação mais branda.
Crise maior no Plano
Os reflexos da lei seca sobre o comércio de bares e restaurantes foram maiores nas casas do Plano Piloto, avalia Elesbão Ferreira Oliveira, presidente do Sindicato dos Empregados no Comércio Hoteleiro, Restaurantes, Bares e Similares (Sechosc). ;As pessoas mudaram o comportamento. Antes, faziam o happy hour no Plano. Agora, vão direto para suas cidades e ficam nos bares perto de casa para não ter de dirigir;, afirmou. Segundo ele, os impactos em demissões só não foram mais intensos porque muitos patrões não têm dinheiro para demitir.
Sebastião de Santana, sub-gerente do bar Nu Céu, na 405 Sul, disse que a lei seca provocou uma redução de quase 40% no movimento do local. Antes da nova legislação, os clientes começavam a lotar o estabelecimento a partir das 18h. Agora, o que se vê são muitas mesas vazias e poucos clientes. ;Tivemos de reduzir o espaço de atendimento e também o número de funcionários. Aproximadamente12 empregados do bar perderam seus empregos em razão da queda brusca do nosso número de clientes;, relatou.
Concordando ou não, o jeito é se adaptar. E cada um à sua moda encontra uma saída para beber e ficar longe de problemas com o Detran. Foi o que fez um grupo de amigos que bebia em um bar de Taguatinga Sul na noite de quinta-feira. ;Paramos de beber no Plano Piloto. Agora, fazemos o chope de fim de tarde perto de casa. Todos nós moramos por aqui e ficamos mais bairristas. ;, opinou o comerciante Ismar Cruz, 42 anos. Novato em Brasília, o comerciante Silvio Guimarães, 56, vivia em Tucuruí (Pará), até um mês atrás. ;Lá não existe esse negócio de lei seca, nem bafômetro, nada. Por via das dúvidas, procuro tomar cuidado;, disse. (Colaborou Lívia Nascimento).
O número
117 é o número de acidentes com morte antes da lei seca
91 é o total desses acidentes depois lei seca
-22,2% foi a queda registrada no período
127 é a quantidade de mortes antes da lei seca
102 é o total de mortes registrado depois da lei seca
-19,7% foi a queda no período