Uma nova ameaça à diretoria do Centro de Ensino Fundamental (CEF) 4 do Lago Oeste, uma semana após o início do segundo semestre letivo na rede pública de ensino, marcou a volta às aulas no lugar. Uma pichação atrás da porta do banheiro feminino, encontrada no último dia 4, afirmava que a próxima vítima seria a professora Márcia Brants, que assumiu a direção do local no início de julho. Cautelosa, ela registrou ocorrência na 35ª Delegacia de Polícia (Sobradinho II). Desde o início de julho, dois policiais do Batalhão Escolar da PM fazem a segurança nos três turnos do colégio.
Em 20 de junho, o professor e ex-diretor do CEF 4, Carlos Ramos Mota, 44 anos, foi assassinado por um traficante, dois ex-alunos e um aluno na própria casa (veja memória). Ele combatia o repasse de drogas entre os 1,2 mil alunos do lugar. A mensagem no banheiro feminino, encontrada no último dia 4, quando a Justiça decretou a prisão preventiva dos assassinos, impedindo que eles respondessem ao processo em liberdade, dizia: ;Foi o Carlos e agora será a nova diretora. Assinado: ?;. ;Pode ter sido uma brincadeira de mau gosto de alunos, mas fotografei e fiz o registro na polícia para me precaver;, ressaltou a diretora que, apesar dos esforços para tranqüilizar professores e alunos, ainda teme a volta da violência no local.
O delegado chefe da 35ª DP, Michel Alves, não descarta a possibilidade de uma ameaça real. ;Enviamos o texto para a perícia levantar possíveis autores. Os funcionários devem registrar as ameaças para ajudar nosso trabalho;, aconselhou. Segundo Márcia, o problema da violência no CEF 4 se concentra no turno da noite. ;Alguns professores continuam com medo. Mas as aulas não serão comprometidas;, afirmou. Com a difícil missão de apagar a mancha deixada pelo assassinato de Carlos, a diretora teme que alunos se afastem do colégio. ;A escola está segura. O triste incidente serviu como um alerta para investimentos na proteção dos estudantes;, ressaltou a professora.
Apesar das ameaças no ambiente escolar, Márcia Brants garante que dará continuidade aos trabalhos iniciados no semestre passado, como o combate ao tráfico de drogas e a implementação da educação integral. ;Não vamos recuar. Estamos trabalhando em conjunto com as secretarias de Segurança Pública e de Educação para recuperar a paz e garantir um ensino de qualidade. Professores não precisarão mais lidar com bandidos. Isso será feito pela polícia;, contou Márcia. Uma aluna da 6ª série afirma que a escola tenta não fazer alarde para não assustar pais e estudantes. ;Uma amiga me falou da ameaça. É ruim ver a escola com medo, queremos paz;, desabafou a menina.
Monitores
Como se não bastasse o temor de uma nova tragédia, o CEF 4 suspendeu a educação integral na tarde de ontem por falta de monitores, uma das ferramentas de combate à violência nas escolas públicas do DF. Dos sete monitores que auxiliavam os estudantes, apenas um voltou a trabalhar após as férias. ;Tivemos que suspender hoje (ontem) para não prejudicar os alunos. Estamos dependendo de voluntários, que não cumprem o horário de trabalho;, disse uma professora, que preferiu não se identificar. Hoje, a escola atende 300 alunos no sistema integral de educação, dos turnos matutino e vespertino. Os estudantes entram às 7h15 e ficam até as 16h, período em que desenvolvem atividades fora do currículo escolar, como dança, teatro e línguas estrangeiras.
Segundo o coordenador da Educação Integral no DF, Paulo Mostardeiro, os novos monitores do CEF 4 ; universitários da cidade que recebem uma bolsa auxílio do governo local ; chegarão até a próxima segunda-feira. ;O fato de a escola ficar numa área distante dificulta a contratação;, explicou. Além disso, uma das instituições de ensino superior que atendiam o CEF 4 abandonou o programa. A diretora do colégio não descarta a possibilidade de que os monitores não tenham voltado por medo. ;Eles saíram em um período crítico, logo após o assassinato do professor;. Hoje, às 15h, representantes da Secretaria de Educação e de escolas do DF se reunirão no Centro Administrativo do GDF, em Taguatinga, para debater os rumos da educação integral na cidade. Atualmente, o programa atende 140 colégios.
Morte por encomenda
Na madrugada de 20 de junho, o diretor do Centro de Ensino Fundamental (CEF) 4 do Lago Oeste, Carlos Ramos Mota, 44 anos, foi assassinado na própria casa, em uma chácara da região. Segundo a polícia, a tragédia foi motivada por uma discussão entre ele e Gilson de Oliveira, 31, que teria ido ao colégio cobrar dívidas de drogas de estudantes. Depois de ter sido avisado pelo diretor a não voltar mais ao colégio, o homem convenceu os ex-alunos da instituição Carlos Lima do Nascimento, 22, e Benedito Alexandre do Nascimento, 19, e o aluno do CEF 4 Alessandro José de Sousa, 19, a participarem do crime que chocou toda a comunidade da região.
Em depoimentos na 35ª DP (Sobradinho II), o quarteto disse que se embriagou até as 4h daquele sábado para assassinar o professor. Benedito é autor confesso do disparo. Os outros dois ajudaram a atrair o professor para fora de casa. Gilson ficou esperando dentro do carro. Todos tiveram a prisão preventiva decretada e aguardarão o julgamento atrás das grades. Um semana após a tragédia, uma professora do CEF 4 ; que não quis se identificar ; recebeu uma ameaça de morte pelo telefone. Diante do temor de novos atentados contra funcionários, a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal deslocou dois policiais militares para fazer a segurança da escola durante os três turnos ; matutino, vespertino e noturno.
Campanha pela paz
Quem passar em frente ao Centro de Ensino Fundamental 4 (CEF 4), no Lago Oeste, em qualquer dos três turnos de aulas, verá um policial militar guardando o portão de acesso. Uma conquista da comunidade escolar depois que uma tragédia marcou o local: o assassinato do então diretor Carlos Ramos Mota, 44 anos, por dois ex-alunos e um traficante no dia 20 de junho deste ano. Agora, para evitar as agressões em vez de remediá-las, o Sindicato dos Professores do Distrito Federal (Sinpro-DF) vai lançar uma abrangente campanha contra a violência nas escolas. A idéia é formar um grupo que formule políticas públicas pela paz.
O lançamento oficial da campanha será só em 14 de agosto, em solenidade no auditório do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT), mas a mensagem já está nas ruas há mais de um mês, em outdoors com a frase: Quem bate na escola, maltrata muita gente. ;A escola deixou de ser um ambiente quase sagrado para dar lugar a pichações, ameaças a professores e alunos e até a assassinatos. Só neste ano, seis professores já foram agredidos por alunos ou pais. Criamos essa campanha para agir, em vez de ficar fazendo mobilizações de tragédia em tragédia;, comenta o presidente do Sinpro, Antonio Lisboa.
Além do assassinato do diretor, outra violência que chocou a opinião pública foi a agressão ao professor Valério Mariano, espancado por um ex-aluno em 29 de maio ao tentar proteger o patrimônio da escola, um outro CEF 4, mas o de Ceilândia.
O colégio do Lago Oeste, a propósito, está mudando de nome. Agora se chama Centro de Ensino Carlos Mota, em homenagem ao educador que decidiu não compactuar com o tráfico e acabou silenciado por uma bala no quintal de casa. A tragédia, no entanto, não desmotivou a comunidade local, que continua buscando a paz.
No início do mês, a escola passou por mais um momento difícil, quando os acusados quase foram soltos graças ao fim dos 30 dias estipulados para a prisão temporária. A Justiça, no entanto, decidiu mantê-los presos até o julgamento ao acatar o pedido de prisão preventiva feito pelo delegado responsável pelo caso. ;Os professores ficam com medo porque existem parentes e amigos dos assassinos estudando na escola;, explica o assessor jurídico do Sinpro, Washington Dourado. ;Por isso, caso a Justiça liberte os criminosos vamos orientar os professores a suspender as aulas e pedir remoção para outras cidades;, completa. O sindicato contratou um advogado para atuar como assistente da acusação no caso. ;Vou ficar atento à movimentação da defesa e municiar o Judiciário com mais informações sobre o crime;, explica o criminalista Sérgio Viana.
O crime está vinculado ao tráfico de drogas segundo apurou a polícia. Mota discutiu com Gilson de Oliveira, 31, que teria ido ao colégio cobrar dívidas de drogas de estudantes. O traficante teria então convencido Carlos Lima do Nascimento, 22, e Benedito Alexandre do Nascimento, 19, ex-alunos do colégio, e Alessandro José de Sousa, 19, que era aluno na época a matarem o diretor. Benedito é o autor confesso do tiro.
Além do policiamento em três turnos na escola, os moradores ainda pedem a reabertura do posto policial da comunidade, que fica perto do centro de ensino. ;Foi prometido pelo governo na época do crime, mas não aconteceu;, lamenta a viúva de Carlos Mota, Rita de Cássia Pereira, 43 anos. ;Mas não vamos desistir, por isso estou fazendo um abaixo-assinado. Já temos mais de três mil pedidos e vamos entregar o documento ao secretário de segurança;, promete.
A campanha do Sinpro vai usar como símbolo a morte de Carlos Mota e quer levar a discussão a todas as esferas possíveis. ;Queremos conversar tanto com o governador quanto com o servidor das escolas. O importante é que possamos pensar em opções para ajudar o poder público;, conclui Antonio Lisboa.
Segundo o assessor especial da Secretaria de Educação para a segurança, Mauro Gleisson, a ajuda é bem vinda. ;Já chamamos o Sinpro e ficamos felizes com a possibilidade de somarmos. Nós ocupamos espaços distintos, mas não conflitantes;, defende.