Jornal Correio Braziliense

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A cada mês, 80 mil toneladas de entulho são jogadas em áreas verdes do DF

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Blocos de concreto, pedaços de madeira e ferro retorcido no meio do cerrado. Entulho acumulado à beira de córregos, às margens de estradas ou no meio da vegetação, destruindo o meio ambiente. Cerca de 80 mil toneladas de todo tipo de material são jogadas nas matas e descampados do Distrito Federal todos os meses. Esse crime ambiental, que se repete diariamente na cidade, é causado por um conjunto de problemas. O primeiro deles é a irresponsabilidade de pessoas contratadas para transportar o entulho, que se desfazem do material à revelia das leis. Mas a principal causa do problema está na falta de uma política de gestão de resíduos sólidos. As empresas coletoras de entulho reclamam da falta de locais adequados para receber as sobras. Hoje, todo subproduto da construção civil é armazenado dentro do Lixão da Estrutural. Para resolver o problema, seria necessário criar as chamadas áreas de transbordo ; terrenos localizados em áreas centrais onde as empresas e os catadores pudessem despejar o material coletado, o que reduziria a descarga em locais irregulares. Para minimizar os danos ao meio ambiente e melhorar a gestão do lixo proveniente da construção, o governo trabalha para identificar áreas dentro do Distrito Federal capazes de receber o entulho. Até o fim de agosto, a empresa contratada para fazer um levantamento de todos os terrenos passíveis de virar áreas de transtornos vai apresentar ao GDF resultados preliminares. O Serviço de Limpeza Urbana (SLU) quer reduzir de 80 mil toneladas para 8 mil toneladas a quantidade de entulho despejada irregularmente todos os meses no Distrito Federal. O descaso com o meio ambiente é visível em todas as regiões do DF. Na pista que liga a QI 27 do Lago Sul aos condomínios, o cerrado virou um depósito de restos de obras. De acordo com a Administração Regional do Jardim Botânico, há cerca de seis meses, equipes também recolhem entulho em uma área às margens da DF-001, próxima ao Altiplano Leste. ;Todos os dias retiramos cerca de 30 caminhões cheios de entulho do local. E sempre aparece mais entulho que as pessoas jogam indiscriminadamente;, relata Francisco Luz da Silva, que trabalha como operador de máquinas. No Setor de Mansões do Lago Norte, também há entulho acumulado em meio ao cerrado. O SLU pediu à Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap) e à Companhia de Desenvolvimento do Planalto Central (Codeplan) um estudo das áreas degradadas que teriam condições de abrigar entulhos. A consultoria contratada está analisando esse levantamento para indicar as melhores sugestões de terrenos com tamanho e características ambientais adequadas a essa destinação. Descarga A idéia do governo é criar cinco áreas de transbordo em diferentes regiões administrativas, para dar mais opções de locais de descarga para os transportadores de entulho. Hoje, a longa distância entre os locais de coleta e o lixão da Estrutural desestimula o cumprimento das regras. Além das cinco áreas de transbordo, onde as empresas coletoras poderão despejar o entulho e fazer uma triagem para a reciclagem, o SLU vai criar 100 ecopontos. A diretora do SLU, Fátima Có, explica que esses locais vão atender carroceiros ou pessoas que quiseram despejar material transportado em uma caminhonete, por exemplo. ;Os ecopontos serão áreas menores, organizadas e divididas por baias e cercas vivas, onde os catadores poderão fazer a separação do material. Poderão receber, no máximo, um metro cúbico de material. As empresas coletoras, que usam contêineres, não poderão despejar nesses lugares, apenas nas áreas de transbordo;, diz Fátima Có. Haverá dois tipos de áreas de transbordo: definitivos, nas quais os entulhos serão usados para cobrir buracos de erosão e ficarão no local permanentemente, e provisórios, onde os coletores poderão despejar o entulho e o SLU ficará responsável por transportá-lo depois até o aterro da Estrutural. O setor da construção civil e as empresas coletoras de entulho têm pressa para ver as medidas saírem do papel. A falta de áreas de transbordo é hoje um empecilho à reciclagem. A reutilização de materiais como o concreto, o ferro e madeira fica praticamente impossível se os empresários não têm um espaço para separar e organizar o material. A Associação das Empresas Coletoras de Entulho (Ascole) montou uma grande estrutura para reciclar os resíduos recolhidos em obras ou reformas, mas ainda não começou a reaproveitar o que é coletado. A associação arrendou uma usina de reciclagem na Fercal, que ainda está parada. ;Cerca de 70% de tudo o que coletamos pode ser reciclado. Isso traria benefícios econômicos e sociais, já que propiciaria uma forma de renda a muitos catadores. Mas não poderemos implementar o projeto enquanto não forem criadas as áreas de transbordo;, afirma Éber Rossi, da Associação das Empresas Coletoras de Entulho. O Sindicato das Empresas de Construção Civil (Sinduscon) criou um programa de gestão de materiais, para reduzir os impactos ambientais gerados pela atividade e pelo descarte de entulhos. O plano, elaborado em parceria com pesquisadores da Universidade de Brasília, proporciona a reciclagem de material, mas esbarra na falta de áreas de transbordo. Lixo rico O presidente da Comissão de Meio Ambiente do Sinduscon, Dario de Souza Clementino, conta que hoje se recicla apenas um pequeno percentual retirado de obras. ;O entulho é um lixo rico, que pode gerar benefícios com sua reutilização. Mas precisamos das áreas de transbordo para que o projeto vá para a frente;, explica Dario. O empenho do sindicato para reduzir o impacto dos resíduos no meio ambiente fez com que o Instituto Ambiental Biosfera concedesse o diploma Destaque Nacional de Sustentabilidade. Todos os passos em direção ao melhor aproveitamento dos resíduos de obras e da construção são essenciais para a preservação ambiental. O depósito indiscriminado de entulho causa desmatamento, assoreamento e contaminação do lençol freático. ;O Distrito Federal precisa de políticas públicas e de um plano de resíduos sólidos. Hoje, há entulho jogado no cerrado em todas as regiões da cidade. Esse material não se degrada como o lixo doméstico, leva anos para se decompor;, lembra Mara Moscoso, do Fórum das ONGs Ambientalistas. O superintendente do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Francisco Palhares, lembra que a resolução 307 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), de 2002, determina que os municípios e o Distrito Federal tomem medida com o objetivo de viabilizar a reciclagem. ;A legislação ambiental exige que os entulhos tenham a destinação correta, com a reciclagem de parte do material. Mas o governo faz vista grossa para esse problema;, critica Palhares.