Jornal Correio Braziliense

Cidades

Detran anuncia redução de mortes e sociedade debate lei seca

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No mesmo dia do lançamento de uma campanha contrária à lei que proíbe os motoristas brasileiros de ingerirem bebidas alcoólicas antes de dirigir, o Departamento de Trânsito do Distrito Federal divulga balanço que revela queda nos índices de acidentes fatais e mortes nos 24 dias em que a norma está em vigor. Segundo o Detran, as tragédias nas vias caíram 39% e o total de óbitos, 24%. Esse será o principal argumento usado pelo órgão para defender a nova legislação durante a audiência pública promovida hoje pela seccional DF da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF). O evento reunirá representantes do Ministério Público e do governo local, advogados e pessoas ligadas ao comércio para debater a constitucionalidade da Lei Federal nº 11. 705/08, que instituiu a tolerância zero à combinação álcool e volante. A presidente da OAB-DF, Estefânia Viveiros, não vê problemas jurídicos na lei. ;Essa história de que ninguém pode produzir provas contra si próprio é verdade. Mas o interesse da coletividade se sobrepõe ao individual. E todos os números apontam para queda das mortes;, destacou. Já os donos de bares e restaurantes pretendem aumentar a pressão para derrubar a chamada lei seca. A partir de hoje, eles colocam nas ruas a campanha Responsabilidade, sim! Radicalismo, não! Os empresários esperam convencer as autoridades de que a nova regra é radical. Eles alegam que o movimento no setor caiu pelo menos 50% desde 20 de junho, quando a lei entrou em vigor. De lá para cá, segundo o Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Brasília (Sindhobar), foram demitidos cerca de 100 funcionários. No último fim de semana, os estabelecimentos começaram a fechar as portas com duas horas de antecedência porque a clientela sumiu. Botons e panfletos Garotos-propaganda da campanha, os garçons usarão camisetas personalizadas e botons. Além de panfletos e suportes para copos, eles vão distribuir adesivos para carros aos clientes. No site www.bebercomresponsabilidade.com.br, o Sindhobar pretende reunir mais de um milhão de assinaturas em um abaixo-assinado virtual. O lançamento oficial da campanha movimentará o bar Chiquita Bacana, na 209 Sul, a partir das 19h de hoje. ;A gente quer mostrar que, assim como o governo, queremos segurança no trânsito, mas sem radicalismo;, discursou o presidente do Sindhobar, Clayton Machado. ;O problema é o seguinte: se não houver flexibilização da lei, teremos uma avalanche de empresas quebradas;, completou Marcelo Braconi, um dos diretores da entidade. Crítico da tolerância zero, o garçom Antônio Bezerra, 42 anos, foi um dos primeiros a vestir a camisa da campanha. ;Não pode mais tomar duas taças de vinho e dirigir? É duro demais;, comentou ele, que não bebe nada com álcool. Escolta amiga Enquanto as normas estão em vigor, os brasilienses têm encontrado alternativas para voltar para casa depois de beber, sem ferir a legislação. O serviço Escolta Amiga, criado por uma empresa de delivery em parceria com seis estabelecimentos do Plano Piloto, transportou 120 clientes que não deixaram de se divertir, nem de beber, no último fim de semana. ;O pessoal das cidades-satélites está até pagando adiantado para não correr o risco de não ter motorista;, contou o dono da empresa, Luciano Santos Oliveira. O serviço funciona nos bares Chiquita Bacana, Libanus, Beirute, Gate;s Pub, Braühaus e nos restaurantes Carpe Diem. O cliente vai ao estabelecimento no próprio carro, mas, na hora de ir embora, pede ao garçom um motorista para levá-lo em casa. Um motoboy segue o veículo e conduz o ;chofer; de volta ao bar. O Escolta Amiga custa entre R$ 10 e R$ 30, dependendo do endereço do cliente. Enquanto isso, o Detran espera a notificação do Tribunal de Justiça do DF para se manifestar, em um prazo de 72 horas, sobre a importância da nova lei. Só depois de receber os argumentos do órgão de trânsito, o tribunal decidirá sobre o mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado por um servidor do Senado Federal que não quer se submeter ao teste do bafômetro quando for parado em uma blitz. Em âmbito federal, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade impetrada pela Abrasel tenta revogar a lei. O Supremo Tribunal Federal deve julgar o pedido em agosto. O ARGUMENTO DE CADA UM Representantes do Detran, da Abrasel e da OAB-DF adiantam o que defenderão na audiência pública de hoje Jair Tedeschi Diretor-geral do Detran/DF ;Estou levando a minha estatística que fala na redução do número de acidentes e mortes. A lei veio para dar uma chacoalhada. É como se dissesse: chega, basta. Com a aplicação da lei, os índices caíram consideravelmente. Pode ser por conta da fiscalização mais rigorosa? Pode. Mas também é fato que o Detran começou as blitzes e a divulgar as imagens dos motoristas alcoolizados muito antes da mudança na legislação. E, no meu entendimento, ela não é inconstitucional. Só mudou a tolerância ao teor alcoólico no sangue. Ela não impede o cidadão de fazer nada. Ao contrário, qualquer um pode beber à vontade. Só não pode dirigir depois. Agora, penso que a sociedade, o sindicato dos bares e restaurantes e a Abrasel não têm como negar: depois da lei, menos pessoas morreram.; Ouça: importância da lei seca Aluísio Xavier de Albuquerque Conselheiro seccional da OAB-DF ;Vou defender a inconstitucionalidade dessa lei. Ela ofende o princípio da razoabilidade e do bom senso que toda lei deve ter, pois mexe com a sociedade brasileira como um todo. Não estou falando apenas do grupo que gosta de se encontrar no fim de tarde ou dos que eventualmente exageram. Mas das famílias normais, que se reúnem para o Natal e fazem um brinde. Porque ninguém poderá voltar dirigindo. Faz parte da cultura do brasileiro que um festejo inclua sempre um brinde com bebida alcoólica. Essa lei muda isso e bate de maneira mais forte no menos favorecidos. Eu posso ir a uma festa, beber e voltar com motorista. E as famílias mais modestas? Que facilidade em termos de transporte coletivo a cidade oferece a elas?; Ouça: lei seca é inconstitucional Fernando Antônio Cabral Presidente da Abrasel ;O posicionamento da Abrasel é muito claro desde o princípio: combater a inconstitucionalidade. Tem a questão da razoabilidade. Tínhamos uma lei que aceitava determinado teor alcoólico no sangue. De uma hora para outra, esse nível caiu a zero. Além disso, tem a questão da proporcionalidade. A multa é de R$ 957 para um delito pequeno. Além de ser desproporcional, o motorista ainda corre o risco de perder a CNH. As pessoas estão tendo a impressão de que a lei tem o poder de uma varinha de condão e, de um momento para o outro, resolverá todos os problemas de trânsito. A lei não gera resultado. O que gera resultado é a fiscalização. Se há 10 anos as autoridades brasileiras tivessem cobrado o cumprimento do Código de Trânsito Brasileiro com o mesmo rigor, quantas vidas teriam sido poupadas?; Ouça: legislação não é razoável