Apesar do apelo do presidente Jair Bolsonaro para que o Congresso Nacional mantenha os vetos que fez ao novo marco do saneamento, a decisão de retirar a permissão para que as empresas estatais possam renovar seus contratos, sem licitação, por mais 30 anos, gerou críticas de parlamentares e ameaças de derrubada. Ontem, o autor do projeto original e relator no Senado, Tasso Jereissati (PSDB-CE), criticou o veto ao artigo 16, justamente o que trata da renovação dos contratos de programas, defendido como “importante de ser mantido” pelo presidente.
Jereissati disse esperar que as restrições impostas pelo presidente possam ser derrubadas no Congresso. “Depois da costura dificílima na Câmara, passamos para o Senado e refizemos o acordo. Foi destruído com um veto desnecessário, que cria uma crise política e uma polêmica ao redor do projeto que estava entrando na hora certa”, lamentou o senador.
O contrato de programa, modelo adotado entre municípios e empresas estatais para prestação do serviço, só pode ser feito entre dois entes públicos. Por isso, impede que a iniciativa privada entre no setor, não promove a concorrência e, portanto, não estimula competição e eficiência, explicou Jereissati. No entanto, o senador disse que, apesar de o seu projeto original ter proposto que, à medida que acabassem os contratos, os municípios teriam de fazer uma licitação para conceder a prestação do serviço, foi convencido de que a renovação por 30 anos é importante.
“Os governadores começaram a argumentar que o grande ativo que as empresas estaduais têm para serem privatizadas, buscarem capital, como está fazendo a Sabesp, ou atraírem fundos de investimentos, são os contratos com os municípios. Se retirar isso, elas não valem nada”, assinalou o senador. “O governo vetou e eu critiquei porque cheguei à conclusão de que os governadores estão certos”, acrescentou Tasso.
Os governadores de vários estados querem fortalecer as estatais para levantarem recursos necessários aos investimentos que a lei impõe. As metas de universalização dos serviços são 99% para abastecimento de água e 90% para coleta e tratamento de esgoto até 2033. “É preciso um tempo de transição. Isso não é da noite para o dia”, sustentou.
Competitividade
Na justificativa do veto, o governo argumentou que os dispositivos contrariam os objetivos do marco legal, que busca promover competitividade e eficiência por meio de contratos de concessão com licitação. Por isso, o Executivo tenta convencer os parlamentares a manterem o texto como saiu do Planalto. No entanto, alguns senadores argumentam que o governo quebrou o acordo para que não houvesse alterações no Senado, a fim de evitar a volta do projeto para a Câmara dos Deputados. As lideranças governistas dizem que não havia acordo para não vetar o trecho e sustentam que o combinado era manter o conteúdo de outros artigos, o que foi feito.
Na cerimônia da sanção presidencial, o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, afirmou que foram 11 vetos, apesar de o Executivo ter divulgado justificativa de apenas três. O texto, no entanto, teve 12 cortes. Os parlamentares se disseram surpresos com a extensão da intervenção palaciana. O senador Otto Alencar (PSD-BA) disse que barrar o artigo 16 contrariou a palavra empenhada das lideranças do governo.
“Esse é um ato contra os interesses das empresas estatais, que vai lesar muito os seus ativos, vai dificultar muito as ações”, lamentou. Na mesma linha, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), alertou que “compromissos são feitos para serem cumpridos”.
Universalização e serviço básico
A nova lei do saneamento básico visa ampliar a presença do setor privado na área, pois, atualmente, os serviços são prestados majoritariamente por empresas públicas estaduais –– a ideia é estimular a concorrência. O texto aprovado pelo Congresso pretende universalizar o saneamento. Prevê coleta de esgoto para 90% da população e fornecimento de água potável para 99% do país até o fim de 2033. Para o ministro Paulo Guedes, da Economia, a nova lei vai gerar entre R$ 600 bilhões e R$ 700 bilhões de investimentos no setor. “São 100 milhões de brasileiros que não podiam lavar as mãos. Na verdade, 100 milhões sem esgoto e falta de água limpa para 35 milhões de brasileiros”, disse o ministro da Economia, Paulo Guedes.
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