Na tarde do último sábado, aos 83 anos, morreu a primeira Miss Brasil, Martha Rocha, em Niterói, região metropolitana do Rio de Janeiro. Com a saúde debilitada há anos, a ex-modelo não resistiu a um ataque cardíaco, seguido de parada respiratória. O corpo foi enterrado ontem, no Cemitério no Santíssimo Sacramento.
Nascida em Salvador, em 19 de fevereiro de 1936, Martha Rocha tornou-se uma celebridade instantânea ao vencer o Miss Brasil, aos 18 anos, em junho de 1954, logo após ter sido eleita Miss Bahia. Por pouco, não foi Miss Universo, em julho daquele ano — ficou em segundo lugar, atrás da candidata dos Estados Unidos, Miriam Stevenson.
O resultado pegou muita gente de surpresa. Quando Martha chegou aos Estados Unidos para competir pela coroa de Miss Universo, pesquisas populares já a consideravam eleita. O motivo da derrota, dizem, seria que a brasileira tinha duas polegadas a mais nos quadris, em relação aos cânones de beleza da época. Anos depois, Martha disse que não sabia se a história era real. “Nos Estados Unidos, nunca ninguém me tirou as medidas”, disse, em sua autobiografia.
Verdade ou não, até os últimos dias, Martha foi considerada uma das mulheres mais bonitas do mundo, injustiçada no concurso em que essa constatação seria oficializada. No intervalo de 66 anos entre a ascensão súbita como celebridade e a morte, ela trabalhou como modelo, assinou centenas de contratos publicitários e foi inspiração para marchinha de carnaval, receita de bolo e modelo de carro.
Ao voltar ao Brasil, mesmo sem a faixa de Miss Universo, Martha teve uma recepção calorosa: foi recebida pelo governador da Bahia à época, Régis Pacheco, aplaudida e seguida por milhares de pessoas em carro aberto. Passou os anos seguintes em jantares, festas, inaugurações e viagens pelo país. Sempre acompanhada pela cabeleireira e por dezenas de fãs. Os últimos anos, no entanto, não foram tão luxuosos quanto os das décadas de 1950 e 1960.
Sem dinheiro, a última residência de Martha Rocha foi uma casa de repouso para idosos, em Niterói. “Não me sinto diminuída, humilhada por isso. Pelo contrário, pois minha dignidade segue sem mácula”, disse ela, no Facebook, em 8 de março de 2019. No dia seguinte, em outra publicação, confessou ter pensado muito antes de falar sobre a situação, “por temer ser mal interpretada” e lamentou ter sido isso “exatamente o que aconteceu”.
Golpe
Antes de chegar à casa de repouso, Martha morou em cobertura com vista para o mar e apartamentos enormes na capital fluminense. Os problemas financeiros começaram em 1995, com a falência da Casa Piano, uma das maiores casas de câmbio do Rio, que pertencia ao ex-cunhado, Jorge Piano, e onde ela havia depositado praticamente toda a sua fortuna. Ele fugiu para o exterior e nunca devolveu nem parte do dinheiro.
“Nem pensei em pedir ajuda, superei meus problemas com suporte de meus dois filhos, duas amigas e do meu trabalho honrado, vendendo os quadros pintados por mim, e ganhando cachê para divulgar o concurso Miss Brasil”, disse Martha, no Facebook, no ano passado. “Para mim, meus amores, este assunto está encerrado. Ponto final", completou.
A fuga de Jorge, entretanto, mudou a vida de Martha, que, de imediato, já teve que vender o apartamento luxuoso onde morava. Se, aos 18, viveu uma rotina agitada de viagens e eventos luxuosos, depois dos 60, passou a acordar cedo para pintar os quadros que vendia para ajudar a pagar as contas. Além do baque financeiro, Martha passou por problemas graves de saúde, como câncer de mama e pneumonia aguda.
Martha ficou viúva aos 23 anos do primeiro marido, Álvaro Piano, que morreu em um acidente de avião, na Argentina, em 1960. Com ele, teve dois filhos: Álvaro e Carlos Alberto. Casou-se novamente com Ronaldo Xavier de Lima, com quem teve a terceira filha, Cláudia. Segundo Álvaro, que confirmou a morte, ontem, a ex-modelo já estava de cama havia muito tempo e não conseguia andar.