Brasil

Número real de casos pode chegar a 8 milhões

Total de infectados é até seis vezes maior do que dado oficial. É o que revela a maior pesquisa brasileira sobre a covid-19, divulgada ontem. País registrou mais 48 mil positivos em 24h e baterá, hoje 1,5 milhão de confirmações da doença

Com mais 48.105 infecções em 24 horas, o Brasil soma 1.496.858 testes positivos para o novo coronavírus. No entanto, o total de brasileiros infectados pode chegar a 8 milhões. É o que aponta o Epicovid19-BR, estudo desenvolvido pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e financiado pelo Ministério da Saúde. Pela primeira vez, o país pode visualizar o tamanho do iceberg — e não só a ponta — para determinar o nível de subnotificação a partir das análises estatísticas baseadas na realidade. O número de óbitos diários, ontem, foi 1.252, totalizando 61.884 vidas perdidas.

O estudo foi dividido em três fases: 14 a 21 de maio, 4 a 7 de junho e 21 a 24 de junho. As 133 cidades brasileiras com maior densidade entraram para a avaliação, com, pelo menos, 200 testes realizados em cada uma das fases. Para aferir a infecção, foram aplicados os testes rápidos de sangue, fornecidos pelo Ministério da Saúde. Foram selecionadas por sorteio 89.397 pessoas para participar da avaliação epidemiológica. “Se fosse uma corrida de Fórmula 1, o Brasil era o carro que estava acelerando mais rápido na pista da segunda para terceira fase, mas tivemos uma desaceleração. Então, o pneu começou a ficar desgastado e, felizmente, o nosso carro diminuiu de velocidade”, afirmou Hallal.

A partir da diferença entre o número de casos notificados e o número de pessoas com anticorpos, a pesquisa inferiu que há 6 vezes mais pessoas com anticorpos para a covid-19 do que o número de casos notificados.  “O tamanho total do iceberg do coronavírus é muito maior do que o que aparece nas estatísticas porque muitas pessoas têm quadros menos graves e não procuram serviços de saúde, não fazem testagem”, explicou o pesquisador responsável pelo estudo e reitor da UFPel, Pedro Hallal.

Ao multiplicar o atual número de casos positivos por seis, o Brasil teria mais de oito milhões de infectados. O pesquisador ressalta, contudo, que o país não teria, necessariamente, esse número de infecções, já que a amostra da pesquisa é de 133 cidades, o que representa um terço do Brasil. “É normal ter mais pessoas com anticorpos do que casos confirmados, até pela definição de caso, mas se esse número é exatamente oito milhões, depende da dinâmica das outras 5,3 mil cidades que não foram incluídas na amostra dessa pesquisa”, esclareceu. 

A pesquisa também mostrou que, em um mês e meio, o Brasil dobrou o número de infectados pelo novo coronavírus, ao passo que o isolamento social apresentou quedas. Na primeira fase do teste, o grupo constatou que 1,9% da população apresentava anticorpos para a covid-19. Duas semanas mais tarde, a indicação já era de 3,1% de infectados, um salto de 53%. Por fim, até 24 de junho, o percentual já estava em 3,8%, ou seja, 23% a mais do que na avaliação anterior. 
Somadas as três fases da pesquisa, foram identificadas 2.064 pessoas com anticorpos, ou seja, que têm ou já tiveram infecção pelo coronavírus. 

Isolamento
A diminuição da adesão às medidas de isolamento também foi levada em consideração na pesquisa, sendo apurada a frequência com que os entrevistados saíam de casa. Na primeira fase, 20,2% afirmaram quebrar a quarentena diariamente; 56,8%, apenas para atividades essenciais; e 23,1% disseram não sair. Já na terceira fase, os números foram de 26,2%, 54,8% e 18,9%, respectivamente. 

A queda na adesão representa maior risco de infecção — mesmo para quem não sai de casa. Isso porque a análise mostrou, ainda, que 39% das pessoas que moram com pessoas que testaram positivo para o vírus também contraíram a doença. Essa conclusão foi possível porque, havendo uma pessoa positiva no âmbito da pesquisa, todos os habitantes da mesma casa também eram testados. 

Questionado se haverá uma mudança de recomendação por parte do Ministério da Saúde diante da constatação do baixo isolamento social, o secretário-executivo da pasta, Élcio Franco, afirmou que cabe ao gestor local o estabelecimento das medidas de distanciamento social. “Isso já está pacificado e decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF)”, indicou.

Ricos e pobres 
Uma das grandes variações notadas na pesquisa foi feita ao se comparar a população por nível sócio-econômico. Dividido em cinco grupos, dos 20% mais pobres aos 20% mais ricos, a avaliação mostrou que, ao se levar em conta os dois extremos, o risco de contrair a doença é mais que o dobro entre os mais vulneráveis. Isso ocorreu de forma sistemática nos três momentos. Enquanto, no fim de maio, 2,1% dos mais pobres atestaram positivo; no grupo dos mais ricos, a marca ficou em 1%. Já entre 21 e 24 de junho, a diferença foi de 4,1% para 1,8%.