Ainda com uma alta taxa de transmissão indicada por estudos internacionais e com a interiorização do vírus, o Brasil parece longe de um controle da doença. Ontem, foram registradas mais 692 mortes pela covid-19, batendo a marca de 58 mil vidas perdidas pela doença. Ao todo, são 58.314 fatalidades. O Ministério da Saúde também confirmou mais 24.052 infecções em 24 horas e, com isso, o país soma 1.368.195 de casos em território nacional. Os números mantêm o Brasil em segundo lugar do ranking mundial das nações mais afetadas pelo novo coronavírus. De acordo com a Universidade Johns Hopkins, o país só fica atrás dos Estados Unidos em números absolutos, que têm 2.564.163 de infectados e 125.928 mortes pelo vírus.
Epicentro da doença no Brasil, São Paulo é a unidade da Federação com o maior número de casos e óbitos desde o início da pandemia. Hoje, o estado tem 275.145 infectados e 14.398 mortes pela covid-19. Apesar dos números, o governador João Doria ressaltou ontem, em entrevista coletiva, que houve uma diminuição de 144 mortes, no comparativo semanal. Enquanto na 25ª semana epidemiológica foram registrados 1.913 óbitos, na 26ª, foram confirmados 1.769.
“É uma boa notícia que deve ser registrada, mas evidentemente com moderação. Vamos manter o foco nas medidas de controle da pandemia, aumentar capacidade de testagem e também no atendimento do sistema de Saúde no estado de São Paulo”, afirmou Doria.
Coordenador executivo do Centro de Contingência da Covid-19 do Estado de São Paulo, João Gabbardo pontuou que, além da redução de mortes, na 26ª semana, foi observado o menor aumento percentual de toda a série histórica. “Essa semana tivemos 14% de aumento. E podemos observar que o crescimento vem caindo gradativamente, de forma sustentada.”
Máscaras
Mesmo com a diminuição, a interiorização do vírus, tendência observada em todo o Brasil, é visível no estado, já que apenas 26 dos 645 municípios não registraram infecções pelo novo vírus. Para tentar controlar de forma mais eficaz a disseminação da covid-19 na unidade federativa, o governador João Doria anunciou que, a partir de amanhã, a Vigilância Sanitária poderá multar pessoas ou estabelecimentos comerciais que desrespeitarem o uso de máscaras em espaços comuns.
A pessoa que estiver sem máscara em espaços públicos, como praças, será multada em R$ 500. Já em estabelecimentos comerciais, a multa prevista é de R$ 5 mil por pessoa sem a proteção. O valor arrecadado pelas multas será revertido para o programa Alimento Solidário, que distribui cestas de alimentos para famílias carentes.
“Queremos atingir 100% das pessoas usando máscaras, pois isso reduz sensivelmente a possibilidade de transmissão do coronavírus”, justificou Doria, que também anunciou o retorno da veiculação da campanha publicitária de conscientização sobre o uso do acessório.
Outros estados
Além de São Paulo, outros nove estados ultrapassaram a marca de mil óbitos cada. São eles: Rio de Janeiro (9.848), Ceará (6.076), Pará (4.870), Pernambuco (4.782), Amazonas (2.792), Maranhão (2.012), Bahia (1.800), Espírito Santo (1.621) e Alagoas (1.032). Juntas, as dez unidades da federação somam 49.231 mortes, ou seja, 84,4% de todos os óbitos. No Brasil, apenas Tocantins e Mato Grosso do Sul têm menos de 200 óbitos, com 195 e 75 mortes, respectivamente.
Ontem, o Ministério da Saúde anunciou que está trabalhando em três frentes para sanar as dificuldades de estados e municípios no abastecimento de medicamentos utilizados nas unidades de terapia intensiva (UTIs), como o kit de intubação de pacientes com covid-19.
O Ministério da Saúde iniciou um processo de compra por meio de um pregão eletrônico para aquisição centralizada desses medicamentos, no qual os estados poderão ser co-participantes.
Além disso, o órgão fez requisição administrativa do excedente da produção da indústria farmacêutica nacional para distribuir para os estados que não estavam conseguindo comprar. A pasta chegou a acionar, ainda, a Organização Pan-americana de Saúde (Opas) para buscar uma cotação de fornecedores internacionais a fim de regularizar a situação.
Brasil tem “grande desafio”, diz OMS
Diretor executivo da Organização Mundial de Saúde (OMS), Michael Ryan afirmou, ontem, que “não há dúvida de que o Brasil ainda enfrenta um grande desafio” em sua luta contra a covid-19. “Ele continua a reportar mais de 30 mil casos por dia”, disse ele. “Uma resposta abrangente é necessária em todos os níveis, e o nível de infecção está alto”, destacou a autoridade da OMS.
“Há muitas situações desafiadoras no Brasil”, analisou Ryan, mencionando a existência de áreas populosas nas cidades, com muitas pessoas vivendo em condições ruins, além de dificuldade para acesso em muitas áreas rurais. “Não podemos subestimar o tamanho e a complexidade de um grande país como o Brasil”, afirmou, mas citando também o fato de que o país mostrou “tremenda capacidade” na área de saúde em ocasiões anteriores, seja combatendo doenças, seja no desenvolvimento de vacinas.
Ryan disse que o Brasil deveria “vincular os esforços dos níveis federal e estaduais de modo muito mais sistemático”, em sua resposta à doença, pedindo um foco em “uma abordagem abrangente”. Ele disse que é fácil criticar um país em particular, mas que é preciso que cada nação encontre seu caminho nessa luta. Sobre as Américas em geral, ele considerou a situação “difícil”, já que a região representa a metade dos casos e quase 50% das mortes globais pela doença. O Brasil representa cerca de 25% dos casos e das mortes das Américas, apontou.
Politização
O diretor executivo disse que o pedido da OMS para que se evite a politização do vírus “vale nas duas direções”. Segundo ele, pode haver o caso de que seja necessário dar apoio a um governo “que pode não ser nossa escolha preferida”, mas é preciso haver unidade nacional contra o inimigo comum. “Não podemos continuar a permitir que a luta contra esse vírus se torne uma luta ideológica. Não podemos vencer esse vírus com ideologias.”
Segundo ele, todos devem se questionar se estão fazendo o suficiente para conter o vírus. A líder da resposta da OMS à pandemia, Maria Van Kerkhove, também comentou a situação, dizendo que falaria sobre uma questão mais geral. “Precisamos que pessoas estejam conosco, com a ciência, conforme comunicamos isso a vocês, conforme adaptamos nossas diretrizes, modificamos nossas abordagens”, argumentou. “Sabemos o que funciona para suprimir a transmissão e para reduzir a mortalidade, vamos fazer isso.”
Em outro momento da coletiva, Ryan disse encorajar as pessoas a usar “a linguagem apropriada”, ao ser questionado por um jornalista da China sobre declarações do presidente dos EUA, Donald Trump, de que a covid-19 era o “vírus chinês”. “Muitas pessoas pelo mundo usaram linguagem infeliz”, reconheceu, pedindo foco no que é necessário fazer no momento para combater a pandemia.
Juiz quebra o sigilo de Beltrame
O juiz Magno Guedes das Chagas, da 1ª Vara da Fazenda Pública de Belém, decretou a quebra dos sigilos bancário e fiscal do secretário de Saúde do Pará, Alberto Beltrame, de outros seis agentes públicos e duas empresas, todos investigados pelo Ministério Público do estado por supostas fraudes na aquisição milionária, sem licitação, de garrafas pet vazias para armazenar álcool em gel doado ao Pará. Beltrame é presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass).
De acordo com o boletim atualizado ontem, pela Secretaria de Saúde do Pará, o estado tem 101.207 infectados e chora a morte de 4.870 vítimas do novo coronavírus.
A investigação mira um contrato firmado em 24 de março, com dispensa de licitação, entre a Secretaria de Estado de Saúde e a empresa Marcoplas Comércio de Móveis Ltda., para compra de 1.740.000 garrafas pet pelo montante de R$ 1,7 milhão. O MP argumenta que os valores estão além do praticado no mercado.
Na semana passada, endereços ligados ao secretário de Saúde do Pará foram vasculhados pela Polícia Federal em outra investigação, esta sobre supostas fraudes na compra de R$ 50 milhões em respiradores pulmonares.
Procurado, o Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass) não quis se pronunciar.
Teste de vacina após aval da Anvisa
Governador de São Paulo, João Doria afirmou que o governo estadual aguarda a liberação final da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para que o Instituto Butantã possa iniciar os testes clínicos da Coronavac, uma vacina contra o novo coronavírus que está sendo desenvolvida em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac. “Tenho certeza que a Anvisa fará (a liberação) esta semana”, afirmou o governador, em entrevista coletiva. Segundo ele, foram cadastrados 9 mil pacientes voluntários para esta fase. Doria também disse que o Ministério da Saúde deu “um passo importante” para o desenvolvimento de outra vacina, em parceria com a Universidade de Oxford, no Reino Unido e o laboratório britânico AstraZeneca.