Um dos fatores que puxam para uma maior taxa de letalidade é a proporcionalidade de pessoas idosas no país, visto que, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), essa parcela populacional está mais propensa a desenvolver um quadro severo da doença. De acordo com levantamento da FGV Social — publicado em abril deste ano com a pesquisa intitulada Onde estão os idosos? Conhecimento contra a covid-19 —, enquanto 9,59% da população brasileira têm mais de 65 anos, a Itália apresenta percentual duas vezes e meia superior. Do total de italianos, 23,3% são idosos. A França aparece em segundo lugar, com 20,75%, seguida por Espanha (19,98%), Reino Unido (18,65%) e Estados Unidos (16,63%).
O fato de o Brasil ter índices menores de população idosa, ao compará-lo com os países analisados nesta reportagem, é um dos motivos que abrandam a letalidade do novo coronavírus no país, expõe a análise. Se, por um lado, o Brasil não tem uma população idosa tão grande proporcionalmente a países europeus, por outro, tem aspectos socioeconômicos de maior vulnerabilidade da população e carência do sistema de saúde que pesam para consequências mais dramáticas diante da epidemia da covid-19.
O médico sanitarista Paulo Buss pontua que o grande número de mortes ocorre, principalmente, pelo atendimento tardio e pela inexistência ou falta de equipamento para infecções graves. “A estrutura etária da população influencia nas mortes causadas pelo coronavírus, mas ela não será suficiente para explicar o desenvolvimento da pandemia e das mortes no Brasil em relação aos países europeus”, pondera o especialista.
As condições socioeconômicas precárias do país provavelmente serão muito mais impactantes do que a questão etária, conforme apontam estudos preliminares que cruzam as mortes por covid-19 no país com dados relacionados à faixa de renda, cor da pele, local de habitação e Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). “Por isso, as ações sociais do governo são tão importantes nesse momento. Diante da quantidade de pessoas desempregadas ou em trabalhos informais, que vendem o almoço para poder jantar, só com o auxílio do governo para manter o isolamento social delas”, argumenta Buss.
Desigualdade social
A desigualdade social, outro vetor que influencia na taxa de letalidade da covid-19, é mais evidenciada no Brasil do que nas demais nações mais afetadas. Segundo Relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), o país é o sétimo mais desigual do mundo. Ao passo que o Brasil tem vantagem diante do novo coronavírus por ter uma população mais nova, mas perde pela dificuldade de acesso ao tratamento, característica marcante ao se tratar de classes mais vulneráveis.
A pandemia chegou no Brasil após cinco anos em meio a uma grande crise social, principalmente para os pobres. “De 2014 a 2019, a renda média do brasileiro caiu cerca de 2%, mas a renda dos 5% mais pobres caiu 39%”, diz o economista Marcelo Neri, em entrevista anexada à pesquisa da FGV Social. “Ao menos, o Brasil contava com uma rede de proteção social estabelecida, com capacidade imediata de chegar aos mais pobres, inclusive os informais, criada por meio do Bolsa Família”.
Outra vantagem do programa assistencial do governo brasileiro é ter um Cadastro Único, que também pode ser usado neste momento para levar ajuda e servir de base para políticas assistenciais. Segundo Neri, a extrema pobreza no Brasil subiu 71% de 2014 a 2018. “A crise afetou esse segmento e nada foi feito. Se reajustar o Bolsa família, que está defasado em 18,8% em relação ao que era, vai gastar 0,1% do PIB (Produto Interno Bruto). Vai gastar muito pouco”, defendeu. (BL e MN)