O avanço da covid-19 não se dá apenas nos centros urbanos, comunidades rurais também estão preocupadas com o avanço da doença. Os quilombos brasileiros já notificaram 26 mortes, conforme o último levantamento divulgado pela Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq).
De acordo com a entidade, os dados revelam uma alta taxa de letalidade da doença entre os quilombolas. Já são 150 casos confirmados com média de um óbito a cada dois dias. “A desigualdade do enfrentamento ao coronavírus, que já se mostra evidente nas periferias urbanas, terá um impacto arrasador nos quilombos, se a doença mantiver este ritmo de alastramento e letalidade”, afirma a Conaq.
A quilombola Givânia Maria da Silva, doutoranda em sociologia na Universidade de Brasília (UnB), pontua que as dificuldades encontradas nos quilombos para conter o vírus são uma “extensão do que as comunidades já vivem historicamente”. A falta de acesso às políticas públicas de saúde, de educação de infraestrutura, além da falta de regularização dos quilombos são alguns dos problemas estruturais citados por Givânia que contribuem para a crise nas comunidades.
Enquanto a Fundação Cultural Palmares, instituição ligada ao Governo Federal, registra cerca de 4 mil quilombos no país, o movimento quilombola, por meio da Conaq, reconhece aproximadamente 6 mil. Conforme explica Givânia, quase duas mil comunidades quilombolas não podem produzir nas terras que habitam por não terem o registro governamental. Dessa forma, a população é obrigada a se locomover para a cidade em busca de trabalho.
“O alastramento maior (da doença) nos quilombos é, sobretudo, em comunidades que têm mais contato com as cidades”, afirma a especialista. Além das questões de sustento e renda, grande parte da população das comunidades precisa se dirigir às cidades em busca de atendimento de saúde.
A Conaq afirma que “situações de dificuldades no acesso a exames e de negação de exames a pessoas com sintomas têm sido relatadas pelas pessoas dos quilombos”. Givânia pontua que as comunidades e o movimento quilombola estão agindo por conta própria: “O governo não tem atuado em absolutamente nada na linha de proteger as comunidades quilombolas”.
Resposta
Outro ponto de preocupação é a falta de acesso à internet, energia e telefones celulares dentro dos quilombos, que, segundo ela, dificulta a solicitação do auxílio emergencial de R$ 600. De acordo com a Conaq, governos estaduais e federal não disponibilizaram amparos emergenciais e medidas de proteção efetivas aos quilombos no Brasil. “Infelizmente, já temos estragos e não temos a ilusão de que ficará apenas nisso”, afirma a quilombola.
Como resposta, o Ministério da Saúde pontua que “é responsável pela articulação de ações e fomento a políticas públicas”, mas que cabe aos gestores municipais a organização, execução e gerenciamento dos serviços e ações locais que garantam o acesso das populações quilombolas nos seus territórios.
O Ministério da Cidadania afirma que as orientações para movimentação e saque do auxílio estão publicadas na cartilha para Grupos Populacionais Tradicionais e Específicos, disponível no site do órgão. Dentre as soluções pontuadas pelo conteúdo está a locomoção até centros urbanos e acesso ao site ou aplicativo, além da obrigatoriedade de um número de celular. Procurado, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos não respondeu até o fechamento desta matéria.
*Estagiária sob a supervisão de Andreia Castro