O desembargador Souza Prudente, do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, determinou a suspensão dos efeitos da portaria que nomeou em fevereiro deste ano o ex-missionário evangélico Ricardo Lopes Dias, que foi colocado para chefiar a coordenação de índios isolados da Fundação Nacional do Índio (Funai). Assim, a partir de agora, ele precisa ser afastado de suas funções.
A decisão também determina a suspensão da portaria 167, de janeiro deste ano, que alterou o regimento interno da Funai para permitir que o cargo de coordenador-geral de índios isolados fosse ocupado por uma pessoa sem vínculo efetivo com o serviço público - o que permitiu a designação de Lopes.
"A nomeação dele tem interesses ocultos, a serviço dos interesses dessa associação 'Missão Novas Tribos do Brasil', que vê esses povos como 'não engajados'. Pretende-se o que? Engajá-los no quê? Na civilização da cultura brasileira?", questionou o desembargador.
'Missão Novas Tribos do Brasil' (MNTB) é o nome da associação que, conforme se traz nos autos, Ricardo Lopes atuava como missionário evangélico.
Na ação do Ministério Público Federal (MPF), citada na decisão do TRF1, é pontuado que Ricardo, "a despeito de título de doutor em ciências sociais, possui como única experiência com índios isolados e de recente contato o trabalho na Missão Novas Tribos do Brasil (MNTB), missão de fé cujo propósito declarado é a evangelização dos povos indígenas, especialmente os isolados e de recente contato categorizados pela MNTB como 'povos não engajados'".
Prudente frisa que "qualquer providência de aproximação missionária é uma ameaça a esses povos indígenas". "Eles querem ficar isolados", disse.
O desembargador ressaltou que o direito ao isolamento de povos indígenas está garantido no artigo 231 da Constituição Federal, que determina que "são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”.
Além disso uma convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre povos indígenas também estabelece essa proteção do direito dessa população, pontuando, por exemplo, que eles "deverão ter o direito de conservar seus costumes e instituições próprias”.
"Historicamente, os missionários procuram promover o contato com povos indígenas isolados e de recente contato para evangelizá-los, o que contraria uma política consolidada no Brasil", explicou o desembargador na decisão.
A exoneração ou manutenção de Ricardo Lopes só acontecerá na decisão final de mérito. Por enquanto, ele fica suspenso do cargo. A União ainda poderá recorrer da decisão, que derrubou entendimento da 6ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal. Ela não havia atendido solicitação feita na ação civil pública do MPF.