É difícil imaginar que um inimigo invisível teria a capacidade de esvaziar ruas e encher milhões de cabeças de dúvidas e receio. De unir diferentes classes e setores em prol do bem-estar geral e, ao mesmo tempo, servir de argumento para suscitar ideologias políticas e dividir opiniões. Sem vacina ou tratamento, o novo coronavírus provoca uma onda de reações, agravadas pela capacidade de matar. Quase 18 mil brasileiros perderam as vidas em decorrência da doença, que não tem prazo para ir embora. O lockdown, medida de bloqueio total, já acontece em cidades do Rio de Janeiro, Pará, Tocantins, Amapá, Roraima e Paraná. A tendência, segundo estudiosos, é que vivamos um “efeito sanfona”, precisando equacionar a liberação e restrição de atividades pelos próximos anos.
No Rio, estado que confirmou 227 mortes pela doença no período de 24 horas, um recorde, a previsão é de adotar um lockdown intermitente durante dois anos. Em uma análise técnica-científica levantada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), os pesquisadores afirmam que é necessário endurecer o isolamento social para reduzir o ritmo de crescimento de infectados pela covid-19 e capacitar o sistema de saúde para dar conta da demanda. A não adoção de medidas imediatas pode levar a um período prolongado de escassez de leitos e insumos, “com sofrimento e morte para milhares de cidadãos e famílias do estado do Rio de Janeiro”, diz o documento.
Em São Paulo, epicentro da doença no Brasil, o Ministério Público estadual trabalha junto ao governo para avaliar a possibilidade de adoção do bloqueio total. Apesar de endurecer as medidas de isolamento e prorrogar os prazos de reabertura de serviços não essenciais, a medida não está prevista no horizonte próximo.
A técnica de lockdown intermitente leva em conta a incidência de casos, a capacidade do sistema de saúde em receber novos pacientes e a aderência da população às regras de higienização e distanciamento. O objetivo é controlar a disseminação, permitindo equilibrar o crescimento e conseguir assistir aos doentes, evitando mortes desnecessárias. Nesse sentido, as variações de cada região contam, mas a manutenção de intermitência é considerada a estratégia para os demais estados. “Teremos que nos preparar para várias reaberturas e talvez alguns retornos ao isolamento de forma a preservar o sistema de saúde e a vida das pessoas”, estima a presidente executiva do grupo Sabin, Lídia Abdalla.
Bioquímica de formação, Lídia, que lidera um dos principais players de medicina diagnóstica do país, reconhece o desafio contemporâneo e as mudanças irreversíveis que a pandemia encabeçou no campo das relações, dos negócios, da saúde, de vida. “Acredito que quando sairmos da pandemia, encontraremos um novo mundo.” (BL)