Restrições impostas por um novo sistema de registro de ponto de servidores adotado pelo governo federal levaram um grupo de agentes do Ibama a abandonarem um flagrante de extração criminosa de madeira na semana passada, no Pará, por causa da impossibilidade de os servidores prosseguirem com o trabalho, dado o acúmulo de horas extras acumuladas.
O caso ocorreu na última sexta-feira, 6. Conforme apurou o jornal O Estado de S. Paulo, os agentes ambientais faziam uma diligência na terra indÃgena Arara, no municÃpio de Altamira, quando se depararam com uma clareira aberta na mata, onde havia cerca de 40 toras de madeira no chão, todas cortadas ilegalmente.
Pelos sinais da ação, o material tinha sido cortado recentemente e estava pronto para ser removido do lugar. Mais algumas horas de trabalho na mata poderiam ter levado, com boa chance, à identificação e prisão dos criminosos. Ocorre que, àquela altura, ninguém mais tinha autorização para seguir no trabalho, porque já tinham vencido o limite de até dez horas de serviços prestados.
A prática de crimes da floresta ocorre, com frequência, em horários e dias de baixa movimentação de pessoas nessas áreas. É de noite e nos fins de semana que aumenta a circulação de caminhões carregados de madeira ilegal na Amazônia.
A origem do problema está nas regras impostas pelo chamado Sistema de Registro Eletrônico de Frequência (Sisref). Esse programa, lançado em julho do ano passado pelo Ministério da Economia, tem o objetivo de acabar com o registro manual na gestão público, centralizando tudo no meio eletrônico. A rigor, o sistema permite que seja feito um banco de horas do servidor, para compensação da jornada extra. Essas horas devem ser computadas como crédito, já que o sistema não prevê pagamento pelas horas extras. O problema é a limitação das horas extras que podem ser acumuladas.
Na semana passada, conforme apurou o Estado, o Ibama enviou um ofÃcio ao Ministério da Economia, pedindo mudanças nas restrições, dadas as peculiaridades das atividades desempenhadas pelos servidores que atuam na fiscalização.
No documento, o órgão ambiental afirma ser "imprescindÃvel a autorização" para que possam ser computadas, como crédito no banco de horas dos servidores, o trabalho excedente, mas sem as restrições atuais incluÃdas no sistema, as quais permitem apenas 2 horas diárias de extras, 40 horas mensais e 100 horas anuais.
Segundo o Ibama, essa escala de trabalho, que só ocorre após autorização pela chefia imediata do fiscal, é resultado do quadro reduzido de servidores do órgão, que regularmente precisam de mais de 24 horas de folga por semana, por causa do volume de trabalho que são chamados a atender. Hoje, a área de fiscalização do Ibama conta com cerca de 700 servidores, um terço do quadro necessário para cumprir essa tarefa.
O pedido do órgão ambiental é ter um tratamento similar ao adotado com o Departamento de PolÃcia Federal, que realiza várias operações na floresta em parceria com o Ibama. As regras de trabalho extra da PF estão disciplinadas por uma portaria especÃfica.
O caso foi levado ao Ministério Público Federal, que deu prazo de dez dias para que o Ibama preste esclarecimentos sobre as limitações do sistema para registrar o trabalho de fiscalização que, quando necessário, é feito em perÃodos noturnos ou fins de semana.
Procurado pela reportagem, o Ministério da Economia, responsável pelo Sisref, não se manifestou até a publicação desta matéria. O Ibama também não comentou o assunto.