Correio Braziliense
postado em 29/01/2020 19:04
Um levantamento do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids) com 1,7 mil entrevistados de sete capitais brasileiras revela que 90,3% da população de transexuais e travestis já sofreu discriminação em decorrência da identidade de gênero. O Índice de Estigma em relação às pessoas vivendo com HIV/AIDS – Brasil é um estudo inédito no país com entrevistas feitas somente com pessoas que vivem com HIV/Aids. Os dados divulgados nessa nesta quarta-feira (29/1), celebra o Dia Nacional da Visibilidade Trans.As entrevistas foram feitas entre abril e agosto de 2019 em Manaus (AM), Brasi%u0301lia (DF), Porto Alegre (RS), Salvador (BA), Recife (PE), Sa%u0303o Paulo (SP) e Rio de Janeiro (RJ). O recorte da população trans que vive com HIV/Aids foi apresentado durante reunião no escritório da Organização Pan-americana da Saúde (OPAS), em Brasília. Para se ter uma ideia, comentários discriminatórios por parte de familiares dos entrevistados afeta 80,6% dos participantes ouvidos. Outros 74,2% relataram, também casos de assédio verbal, 69,4%disseram sofrer exclusão de atividades familiares e 56,5%, agressões físicas.
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Há, ainda, a privação do trabalho. De acordo com o levantamento, 36,7% estão desempregados, 63,9% tiveram dificuldades para atender necessidades básicas como alimentação, moradia ou vestuário nos últimos 12 meses e somente 12% disse ter trabalho em tempo integral. Mais uma vez, comparando com os entrevistados cis¨22,5% declararam ter trabalho integral.
Retrato da opressão
A forma com que a população trans é tratada na sociedade é fonte de vários problemas emocionais. Dentre eles, o levantamento cita ansiedade, depressão, insônia e estresse, por exemplo. Um total de 57,4% já foi diagnosticada com algum desses problemas. O texto divulgado pela Unaids alerta, ainda, que há uma relação direta entre a discriminação relacionada à identidade e a ligada ao estado sorológico positivo. Das pessoas trans entrevistadas, 33% se afastaram da família, “29,8% desistiram de se candidatar a uma vaga de emprego, 27,7% deixaram de participar de eventos sociais, 24,2% relataram que decidiram não buscar apoio social e 12,7% procuraram atendimento de saúde.Além disso, 36,3% se sentem culpadas por viverem com HIV/Aids sendo que uma a cada cinco diz se sentir suja por conta da infecção. Junto com os dados relacionados à saúde dessa população, também divulgado pela Unaids, os números alertam sobre “a urgência da expansão e do aprimoramento dos serviços e políticas de atenção a%u0300 saúde mental das pessoas que vivem com HIV/AIDS, principalmente para as populações-chave e mais vulneráveis.
Para se ter uma ideia, em escala global, essa parcela da população mundial tem 12 vezes mais chances de contrair HIV. Levantamentos do Ministério da Saúde de 2018 apontam que, no Brasil, a infecção de HIV entre a população trans pode chegar a 36,9%. Para piorar, há despreparo de parte dos profissionais da saúde pública para lidar com o problema de uma parcela da população que, marginalizada, já enfrenta, de pronto, dificuldades para procurar assistência médica.
O Índice de Estigma apontou que 31,9% dos entrevistados do recorte trans relataram ter passado por situações desagradáveis envolvendo profissionais de saúde. O medo de um mal tratamento ou de que um médico revele seu estado sorológico positivo para o HIV sem consentimento acomete 36,3% das pessoas ouvidas e 13,9% já teve de ouvir comentários negativos ou fofocas por viverem com HIV. Outras 11,1% relataram ter vivido alguma situação de diminuição do contato físico ou precauções extras (como utilização de duas luvas, por exemplo)”, e profissionais de saúde já dispararam agressões verbais contra 6,5% das participantes da pesquisa.
Estigmatizadas
Para a assessora de apoio comunitário do Unaids no Brasil, Ariadne Ribeiro, a pesquisa é importante “pois foi feita por pessoas que vivem com HIV, entrevistando pessoas que vivem com HIV”. “Essa empatia permite trazer outros dados. Esses dados são importantes, principalmente, porque são inéditos e porque mostram que dentro das populações-chave, a trans tem um estigma não apenas relacionado ao HIV, mas à vivência dessa identidade em desconformidade com o que a sociedade espera dela. Falamos de sinergia de vulnerabilidade que impede o acesso dessas pessoas ao sistema de saúde”, alerta.A iniciativa brasileira para a realizac%u0327a%u0303o deste estudo ine%u0301dito no pai%u0301s, tornou-se possi%u0301vel grac%u0327as a uma parceria entre diversas organizac%u0327o%u0303es e instituic%u0327o%u0303es: Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV e AIDS (RNP%2b); Movimento Nacional das Cidada%u0303s Posithivas (MNCP); Rede Nacional de Adolescentes e Jovens Vivendo com HIV e AIDS (RNAJVHA); Rede Nacional de Mulheres Travestis e Transexuais e Homens Trans vivendo e convivendo com HIV/AIDS (RNTTHP); ONG Gestos – Soropositividade, Comunicac%u0327a%u0303o e Ge%u0302nero; Programa Conjunto das Nac%u0327o%u0303es Unidas sobre HIV/AIDS (UNAIDS) no Brasil; Programa das Nac%u0327o%u0303es Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) no Brasil; e Pontifi%u0301cia Universidade Cato%u0301lica do Rio Grande do Sul (PUC-RS).
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