Brasil

MP denuncia 16 pessoas por homicídio

Executivos da Vale e da Tüv Süd teriam feito %u201Cvista grossa%u201D para o alto risco na barragem que se rompeu. Investigações apontam que conluio entre as duas empresas foi para que a mineradora mantivesse a boa imagem para o mercado e para os acionistas

Documentos falsos, relações promíscuas, omissão da verdade ao poder público, à sociedade e aos acionistas e investidores, laudos forjados acobertando a tragédia iminente e, na conta final, 270 vítimas —259 mortos e 11 ainda desaparecidos. O rompimento da Barragem 1 da Mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho, completa um ano no sábado, e, ontem, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) denunciou à Justiça 16 pessoas (veja a lista) por homicídio doloso duplamente qualificado, e por diversos crimes ambientais, como destruição de matas, poluição de rios e devastação da fauna.
As empresas Vale e a Tüv Süd também foram denunciadas pelos mesmos crimes ambientais. Entre os mortos, estavam funcionários da mineradora e de empresas terceirizadas, moradores do município e turistas.

“Os denunciados apostaram alto ao fazer vista grossa a uma situação que gritava pelo Plano de Ações Emergenciais para Barragens de Mineração, para não colocar em risco a imagem da empresa no mercado e diante dos acionistas”, disse o procurador-geral de Justiça de Minas Gerais, Antônio Sérgio Tonet.

A conclusão das investigações demonstra a existência de um conluio entre a Vale e a Tüv Süd para esconder a situação de segurança de várias barragens mantidas pela mineradora. Na denúncia, as autoridades deixam claro que “com apoio da Tüv Süd, a Vale operava uma caixa-preta com objetivo de manter uma falsa imagem de segurança da empresa de mineração, que buscava, a qualquer custo, evitar impactos sobre sua reputação, e consequentemente, alcançar a liderança mundial em valor de mercado”.

Nas apurações, promotores e delegados encontram uma lista sigilosa, denominada Top Ten (Dez Mais, em inglês), em que executivos apontavam as barragens em situação incalculável de risco, conforme disse o coordenador do núcleo criminal da força-tarefa encarregada das investigações, promotor William Pinto Coelho. Na lista, a Barragem 1 ocupava o oitavo lugar com probabilidade de falha.

“Eles sabiam sobre a real situação de gravidade das barragens, e, mesmo assim, se valeram de laudos falsos sobre as condições de estabilidade”, explicou. O promotor destacou que o rompimento da Barragem da Mina do Córrego do Feijão começou bem antes de 25 de janeiro de 2019.
Conforme o MPMG, a acusação de homicídio doloso duplamente qualificado decorre da investigação de que os crimes foram praticados por meio que resultou perigo comum, “já que um número indeterminado de pessoas foi exposto ao risco de ser atingido pelo violento fluxo de lama”. O rompimento da barragem ocasionou o vazamento de aproximadamente 12 milhões de metros cúbicos de rejeito de mineração.

Além da oferecer denúncia, o MPMG encaminhou à Justiça pedidos cautelares de prisão do gerente-geral da Tüv Süd, Chris-Peter Meier, “alegando que, apesar de sistematicamente procurado, não se dispôs a contribuir para as investigações”. Também foi pedida a suspensão das atividades profissionais de todos os denunciados e a proibição de se ausentarem do Brasil.

Em nota, a Vale informou que “expressa sua perplexidade ante as acusações de dolo, e que é importante lembrar que outros órgãos também investigam o caso, sendo prematuro apontar assunção de risco consciente para provocar uma deliberada ruptura da barragem”. Também em nota, a Tüv Süd explicou que “um ano após o rompimento, suas causas ainda não foram esclarecidas de forma conclusiva”. (Colaborou Deborah Lima, estagiária sob supervisão da subeditora Rachel Botelho)

 

Quem é quem na tragédia

Da Vale:

1. Fabio Schvartsman (diretor-presidente);
2. Silmar Magalhães Silva (diretor do Corredor Sudeste);
3. Lúcio Flavo Gallon Cavalli (diretor de Planejamento e Desenvolvimento de Ferrosos e Carvão);
4. Joaquim Pedro de Toledo (gerente executivo de Planejamento, Programação e Gestão do Corredor Sudeste);
5. Alexandre de Paula Campanha (gerente executivo de Governança em Geotecnia e Fechamento de Mina);
6. Renzo Albieri Guimarães de Carvalho (gerente operacional de Geotecnia do Corredor Sudeste);
7. Marilene Christina Oliveira Lopes de Assis Araújo (gerente de Gestão de Estruturas Geotécnicas);
8. César Augusto Paulino Grandchamp (especialista técnico em Geotecnia do Corredor Sudeste);
9. Cristina Heloíza da Silva Malheiros (engenheira sênior junto à Gerência de Geotecnia Operacional);
10. Washington Pirete da Silva (engenheiro especialista da Gerência Executiva de Governança em Geotecnia e Fechamento de Mina);
11. Felipe Figueiredo Rocha (engenheiro civil, atuava na Gerência de Gestão de Estruturas Geotécnicas).

Da Tüv Süd:

1. Chris-Peter Meier (gerente-geral da empresa);
2. Arsênio Negro Júnior (consultor técnico);
3. André Jum Yassuda (consultor técnico);
4. Makoto Namba (coordenador);
5. Marlísio Oliveira Cecílio Júnior (especialista técnico).