Segundo o presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança Adolescente e Juventude da Seção DF da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Charles Bicca, a discussão da maioridade penal jamais deixou de existir. Para ele, o bárbaro ato infracional cometido por uma criança de 12 anos pode chamar atenção para uma discussão ainda mais importante, que é a análise da motivação da prática de tais crimes por jovens com idade cada vez menor.
;Como presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança acho importante entender por que essas crianças têm cometido esses atos;.
O advogado, que estuda o abandono afetivo, associa a omissão dos cuidados de pais e responsáveis aos atos infracionais cometidos por crianças e adolescentes. O abandono afetivo é o descumprimento dos deveres do poder familiar, assistir, criar e educar os filhos, previstos em lei pelos artigos 229 e 227 da Constituição Federal.
;Dentro dos trabalhos que eu fiz, nos últimos 10 anos, sobre a repercussão desse abandono, eu consegui ver índices significativos que correlacionam os temas;, diz. Bicca afirma que 77,6% dos internos da Fundação Casa foram criados sem o amparo dos pais.
O mesmo aconteceu quando o advogado pesquisou o tema nas unidades de internação de Santa Catarina. ;Lá, seis entre 10 menores tiveram uma infância sem o pai. O que se nota é a falta do pai na vida desses internos;, afirma. O especialista escreveu três livros sobre o tema e tem priorizado o asunto na comissão. ;Uma família funcional e presente, seja qual for a composição, é o primeiro freio que esse menor tem no combate à prática de atos infracionais;, completa.
Reeducação
Já o professor de sociologia da Universidade de Brasília (UnB) Lúcio Castelo Branc, acredita que esse tipo de ato infracional pode acelerar uma discussão sobre a punição do menor de idade. Cerca de 30 mil adolescentes hoje estão no sistema socioeducativo, em todo o Brasil. ;É preciso reavaliar essa punição. Reeducar não adianta se o jovem não compartilha dos mesmos valores do restante da sociedade;.Este ano, a questão voltou a ganhar relevância no Congresso Nacional. Em junho, a Frente Parlamentar Mista da Redução da Maioridade Penal foi lançada para discutir as propostas que estão em tramitação na Casa. A mais avançada delas é a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171/1993, que já foi aprovada na Câmara em 2015, mas ainda aguarda apreciação do Senado.
Enquanto não há mudança na lei, a decisão da 1; Vara Especial da Infância e da Juventude de São Paulo prevê que o adolescente de 12 anos culpado pela morte de Raíssa fique internado em uma unidade da Fundação Casa, por prazo indeterminado. De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o período máximo de internação é de três anos. A Justiça ainda deve reavaliar a manutenção a cada seis meses no máximo.