Segundo a pesquisadora Olívia Oliveira, nove das 27 amostras coletadas nos litorais da Bahia e de Sergipe foram analisadas pelo Instituto de Geociências da UFBA, em uma parceria com as universidades federais de ambos estados e com a Universidade Estadual de Feira de Santana (BA). O material coletado pelo Instituto teria sido cadastro no Lepetro, laboratório vinculado a Universidade, com unidades nas áreas de química, geologia, geoquímica, microbiologia, petróleo e meio ambiente. Nesta quinta, a pesquisadora revelou que, após fazer a separação física e desidratação do material disseminado na areia e água do mar, o óleo total foi injetado em um equipamento que obtém uma espécie de "impressão digital" do material fóssil.
Após analisar as amostras, os pesquisadores compararam os resultados com os resultados das análises de petróleo disponíveis na literatura e no banco de óleos do Lepetro. Segundo Oliveira, o laboratório armazena amostras de múltiplas bacias do Brasil e dos principais países produtores de petróleo. Por meio disso, teria sido encontrada uma correlação do óleo presente nas praias com um dos tipos de petróleo produzido tipicamente na Venezuela.
A professora reforçou, no entanto, que não se pode descartar a possibilidade de o material se tratar de combustível de navio. Ela ressaltou que, apesar de uma possível origem venezuelana do material, não é possível apontar responsáveis pela contaminação das praias brasileiras. "Quando falamos de Venezuela, temos que separar a questão geográfica do país em si. Esse óleo que analisamos apresentou extrema similaridade com um óleo que é produzido, formado, originado, na bacia da Venezuela. Porém, pode ter sido qualquer um que contaminou, que comprou o óleo e carregou até aqui, não temos a mínima ideia e não compete a nós, como geoquímicos, dizer o que aconteceu", concluiu.
Em contraponto, o presidente Jair Bolsonaro afirmou, ainda nesta quinta, ter "quase certeza" que o derramamento de óleo é criminoso. A declaração foi dada no Fórum de Investimentos Brasil 2019, em São Paulo.
Desde o início de setembro, poças de óleo vêm surgindo no litoral do país. Pelo menos 139 locais em 63 municípios diferentes foram afetados até agora. De acordo com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), a substância que está poluindo a costa brasileira trata-se de petróleo cru. A Petrobras também avaliou que o líquido encontrado não é produzido pelo Brasil. No momento, as investigações das causas e dos responsáveis pelas manchas de óleo são conduzidas pela Polícia Federal (PF), Marinha, Ministério da Defesa, Ibama, com auxílio da Petrobras e do Corpo de Bombeiros do Distrito Federal (DF).
"O Ibama realiza o monitoramento ambiental e a gestão da emergência no caso das manchas de óleo que atingiram as praias do nordeste. Desde o dia 02 de setembro o Instituto vem estabelecendo uma série de ações, juntamente com o Corpo de Bombeiros do Distrito Federal (DF), Marinha e Petrobras, com o objetivo de investigar as causas e responsabilidades do despejo, no meio ambiente, do petróleo cru que atingiu o litoral nordestino", constatou o Ibama, em nota oficial. O Instituto ainda acrescentou que "permanece atento às novas áreas com presença de óleo, realizando as vistorias e orientações necessárias".
O Ministério do Meio Ambiente também confirmou, em nota, que a indicação de origem Venezuelana do Petróleo se baseia em "análise técnica laboratorial da Petrobras". A pasta enfatizou que a hipótese considerada no momento é de que o óleo teria sido derramado "a partir de navios que trafegaram ao longo da costa brasileira, e não necessariamente de campos do governo ditatorial venezuelano".
O professor do departamento de Engenharia Florestal da UnB, Humberto Angelo, vê o incidente como uma "tragédia ambiental". Ele esclarece que, além de ter um impacto significativo na fauna aquática e na microfauna -ou seja, aquilo que não se enxerga na natureza, e que constitui a base da cadeia alimentar da fauna marítima-, o derramamento de petróleo também gera um custo social. "É preciso pagar para retirar esse óleo. Os municípios e praias afetadas por isso vão sofrer um impacto imenso na questão do turismo, principalmente nessa época do verão, em que se recebe um contingente enorme de turistas", defendeu Angelo.
[SAIBAMAIS]"É um prejuízo ambiental, social e econômico. Porque, com esses vazamentos, você também desemprega pescadores, todos aqueles que vivem do turismo e da pesca, que tem um marco na praia", acrescentou o especialista. Ele ainda explica que muitos moradores da região podem ser afetados indiretamente, ao consumirem frutos do mar e outros alimentos contaminados pelo petróleo. "Essa população que tem uma dieta a base de frutos do mar vai ter um custo imenso também no sentido financeiro, porque vão ter que aumentar o valor de sua alimentação."
Venezuela nega
Apesar da série de indícios supostamente encontrados pela Petrobras e por pesquisadores da UFBA, o país governado por Nicolás Maduro negou, hoje, que a Venezuela tenha qualquer relação com óleo encontrado no litoral brasileiro. Em comunicado oficial, a estatal Petróleos de Venezuela S.A. (PDVSA) rechaçou "categoricamente" as suspeitas, consideradas "infudadas". "Não existe evidência alguma de derrame de óleo cru dos campos petroleiros da Venezuela que pudessem haver gerado danos no ecossistema marinho do País vizinho", afirma o comunicado.
A estatal ainda alegou que não recebeu relatos de clientes ou filiais sobre uma possível desagregação ou derrame nas proximidades da costa brasileira. A empresa também apontou que as instalações de petróleo do País venezuelano ficam a uma distância de aproximadamente 6.650 quilômetros das praias do Brasil. Por fim, o comunicado reforçou o "compromisso ambiental do governo venezuelano", e criticou o que chama de "afirmações tendenciosas que pretendem aprofundar as ações unilaterais de agressão e bloqueio" a Venezuela.
*Estagiária sob supervisão de