Com essa tesourada, os recursos do órgão responsável pelo combate ao desmatamento no país passaram de R$ 368,3 milhões para R$ 279,4 milhões, valor insuficiente para cobrir as despesas fixas, estimadas em R$ 285 milhões para este ano. Salles já abriu mão do Serviço Florestal (que foi para a Agricultura) e da Agência Nacional de Águas (ANA), que foi parar no Ministério de Desenvolvimento Regional (MDR). Ele ainda desestruturou o Sistema Nacional do Meio Ambiente, extinguiu a Secretaria de Mudanças do Clima, proibiu funcionários do Ibama de dar entrevistas sem autorização da assessoria de imprensa do ministério, autorizou o leilão de blocos de petróleo no Espírito Santo e no santuário marinho do Complexo de Abrolhos (BA), contrariando relatórios técnicos, e ameaçou investigar funcionários em detrimento de pescadores que disputam o direito de pescar em áreas protegidas. Além disso, o ministro não poupa críticas um suposto exagero na aplicação de multas por desrespeito à legislação ambiental.
Não à toa, Salles ganhou a pecha de antiministro alinhado com o agronegócio entre técnicos, ambientalistas e até parlamentares. O ministro criou o Plano Nacional de Combate ao Lixo no Mar, mas também fez uma proposta polêmica para tentar converter os R$ 250 milhões em multa da Vale pela tragédia de Brumadinho (MG), em investimento em infraestrutura e trilhas para sete parques nacionais do estado, que depois serão alvo de concessões à iniciativa privada. O apelido pega mal no país com a maior biodiversidade do mundo. E fica ainda pior à luz dos dados de 2018 do Global Forest Watch, relatório da Universidade de Maryland, nos Estados Unidos, que indica que o Brasil lidera o ranking do desmatamento de florestas primárias (que não foram afetadas pelo homem), com 1,3 milhão de hectare devastado no ano passado. O número é cerca de três vezes maior que o Congo, que está em 2; lugar.
Na Amazônia, entre agosto de 2017 e julho de 2018, o Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite revelou aumento de 13,7% na área desmatada em relação ao mesmo período no ano anterior. O pior resultado em 10 anos.
Procurado e questionado sobre os planos para conter o desmatamento e o aumento ou a diminuição no número de multas por desrespeito à legislação ambiental, o MMA não comentou o assunto.
Lógica invertida
Outra polêmica no ministério foi o desaparecimento, na sexta-feira, de uma série de mapas de áreas prioritárias para conservação da biodiversidade brasileira do site do MMA. Isso provocou um alarde de possível falta de transparência. Por meio de uma nota, a pasta informou que o endereço eletrônico areasprioritarias.mma.gov.br foi tirado do ar por ;necessidade de ajustes no mapa das Áreas Prioritárias para Conservação, Uso Sustentável e Repartição de Benefícios;. ;Ajustes se fizeram necessários, pois havia um sombreamento entre biomas;, completou. O órgão não explicou, no entanto, porque as matérias relacionadas aos mapas também foram deletadas.
No mesmo dia, funcionários do ICMBio fizeram uma assembleia para questionar por que o assessor especial do ministro, Gastão Donadi, estaria despachando do gabinete e fazendo reuniões sem ter sido nomeado presidente interino. Um grupo de funcionários chegou a procurá-lo, mas não teria sido recebido.
A secretária executiva da Associação Nacional de Servidores da Carreira de Meio Ambiente, Elizabeth Uema, avaliou que a lógica da pasta está ;invertida;. ;Entendemos que é prerrogativa de cada gestão imprimir sua política. Mas, no momento atual, está havendo uma desestruturação do ministério. Áreas fundamentais de conservação ambiental simplesmente foram entregues a outras pastas. O Serviço Florestal saiu com tudo dentro, inclusive, os cerca de 40 funcionários. A ANA também. A lógica foi subvertida. A Agricultura tem como missão institucional o desenvolvimento do agronegócio. Já a área ambiental faz um contrapeso, garante um grau de sustentabilidade às ações;, explicou.
Presidente da Associação dos Servidores da Carreira de Especialistas em Meio Ambiente do DF, Alexandre Bahia Gontijo, trabalha no Serviço Florestal e fala de um ambiente de incertezas. ;Me parece que o ministro acha que as qualificações técnicas dos funcionários são, na verdade, ideológicas. Somos servidores de carreira. Tem gente de esquerda e de direita, progressista e conservador, mas o trabalho é pautado na legislação ambiental brasileira, que está na Constituição e é rigorosa, e nas questões técnicas. Fazemos estudos, experimentos, e chegamos a resultados independentes, sem margem para ideologias. Precisamos conversar, encontrar um caminho. Mas submeter o Meio Ambiente ao setor produtivo não é diálogo, é agenda tendenciosa, conflitos de interesses;, afirmou.
Entidades e parlamentares criticam gestão
Fora do Ministério do Meio Ambiente (MMA), a gestão do ministro Ricardo Sales também vem sendo alvo de críticas de especialistas e de parlamentares.
O coordenador de políticas públicas da ONG Greenpeace, Márcio Astrini, avaliou que as iniciativas de Salles estão na contramão da preservação ambiental. ;Não tem nenhuma medida que fortaleça as políticas de proteção ambiental, como aumentar o combate ao desmatamento da Amazônia, principal problema do setor;, criticou. Ele lembrou que Salles ;foi a segunda opção; do presidente Jair Bolsonaro, pois a primeira era não ter ministério.
A relação do ministro com os funcionários da pasta incomoda o coordenador do Greenpeace. ;As notícias diárias são de exoneração, pedido de demissão e ameaça aos trabalhadores. Ele fala mal de multas, de servidores do Ibama ou de licenciamento ambiental. Hoje, no ministério, há muita confusão. O ministro critica os órgãos que deveria melhorar, capacitar;, observou. ;Os funcionários estão vendo um desmonte generalizado;, completou.
O deputado federal Rodrigo Agostinho (PSB-SP), que preside a Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, tem uma visão parecida. ;Acho normal o ministro da Agricultura defender agricultura e o de Minas e Energia defender a mineração, mas não acho normal um ministro do Meio Ambiente não defender o meio ambiente. Temos informações sérias de que está sendo feito um desmonte da fiscalização. Inúmeras funções relevantes no ministério não foram preenchidas. Ele liberou a exploração de petróleo em Abrolhos contrariando pareceres técnicos, o que é inimaginável;, lamentou.
Para o professor de direito ambiental da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Rômulo Sampaio, Salles precisa dialogar mais com as outras pastas, sem enfraquecer os órgãos fiscalizadores. ;Um alinhamento do MMA com o Ministério da Agricultura, por exemplo, pode ser bom, mas essa relação não deve simplesmente atropelar as necessidades do meio ambiente. Fazer reformas estruturantes não é necessariamente ruim. Sabemos que alguns órgãos nunca funcionaram como deveriam, mas não pode enfraquecer;, alertou. O estudioso avisa que as políticas de proteção ao meio ambiente no Brasil já estão combalidas. Ele considera sensato que a sociedade civil demonstre resistência ao olhar para as propostas do ministro para evitar o enfraquecimento do MMA. (LC)
Entidades e parlamentares criticam gestão
Fora do Ministério do Meio Ambiente (MMA), a gestão do ministro Ricardo Sales também vem sendo alvo de críticas de especialistas e de parlamentares.
O coordenador de políticas públicas da ONG Greenpeace, Márcio Astrini, avaliou que as iniciativas de Salles estão na contramão da preservação ambiental. ;Não tem nenhuma medida que fortaleça as políticas de proteção ambiental, como aumentar o combate ao desmatamento da Amazônia, principal problema do setor;, criticou. Ele lembrou que Salles ;foi a segunda opção; do presidente Jair Bolsonaro, pois a primeira era não ter ministério.
A relação do ministro com os funcionários da pasta incomoda o coordenador do Greenpeace. ;As notícias diárias são de exoneração, pedido de demissão e ameaça aos trabalhadores. Ele fala mal de multas, de servidores do Ibama ou de licenciamento ambiental. Hoje, no ministério, há muita confusão. O ministro critica os órgãos que deveria melhorar, capacitar;, observou. ;Os funcionários estão vendo um desmonte generalizado;, completou.
O deputado federal Rodrigo Agostinho (PSB-SP), que preside a Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, tem uma visão parecida. ;Acho normal o ministro da Agricultura defender agricultura e o de Minas e Energia defender a mineração, mas não acho normal um ministro do Meio Ambiente não defender o meio ambiente. Temos informações sérias de que está sendo feito um desmonte da fiscalização. Inúmeras funções relevantes no ministério não foram preenchidas. Ele liberou a exploração de petróleo em Abrolhos contrariando pareceres técnicos, o que é inimaginável;, lamentou.
Para o professor de direito ambiental da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Rômulo Sampaio, Salles precisa dialogar mais com as outras pastas, sem enfraquecer os órgãos fiscalizadores. ;Um alinhamento do MMA com o Ministério da Agricultura, por exemplo, pode ser bom, mas essa relação não deve simplesmente atropelar as necessidades do meio ambiente. Fazer reformas estruturantes não é necessariamente ruim. Sabemos que alguns órgãos nunca funcionaram como deveriam, mas não pode enfraquecer;, alertou. O estudioso avisa que as políticas de proteção ao meio ambiente no Brasil já estão combalidas. Ele considera sensato que a sociedade civil demonstre resistência ao olhar para as propostas do ministro para evitar o enfraquecimento do MMA. (LC)