Ser mulher é desafiar uma condição assustadora. A cada duas horas, uma mulher é assassinada no Brasil. E o pior: estamos longe de estancar essa sangria. A desigualdade de gênero e o machismo tornam a mulher uma isca para inimigos que podem parecer invisíveis, embora não sejam.
Como vimos nos últimos dias, são maridos, companheiros, parceiros, homens de casa, íntimos. Embora eles compartilhem uma vida com essas mulheres, não hesitam em ofender, perseguir, espancar, torturar, matar. Uma triste e revoltante realidade, que levou, em uma semana, Veiguima Martins, de 56 anos, esfaqueada e queimada pelo marido (que acabou também morto por inalar fumaça) e Diva Maria Maia da Silva, de 69 anos, assassinada a tiros pelo companheiro (que também atirou no filho do casal).
Não podemos jamais estancar a dor dessas famílias, não podemos sequer consolá-las com nossos pedidos por justiça ou nossa solidariedade. É dever do Estado, dos políticos e das demais autoridades criar políticas públicas, leis e condições de acolhimento dignas a mulheres vítimas de violência. É nosso dever criar filhos longe da cultura do machismo na qual crescemos. É dever de todos refletir sobre o que coloca mulheres na situação de presas fáceis para criminosos em potencial, disfarçados e protegidos por seus papéis sociais, como o de marido ou de pai.
A luta só está começando. E folgo em saber que uma geração inteira de jovens feministas se mexe na intenção de um ;basta; coletivo. Cientes de que o corpo lhes pertence, essas meninas o tratam como inviolável por qualquer outro que não tenha permissão de tocá-lo. Cientes de que são livres e têm o direito de ser, elas não suportam um relacionamento que aprisione ou dite regras.
Além de cientes, elas são conscientes de que essa atitude individual de proteção é também e, antes de tudo, um ato político e solidário a gerações de mulheres que sofreram caladas e vivem aprisionadas em suas próprias casas, com pavor de quem dorme ao seu lado.