Ingrid Soares
postado em 16/08/2018 06:00
O Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou, ontem, o entendimento de que não há a necessidade de cirurgia de mudança de sexo para que se altere o registro civil de transexuais. A decisão da Corte diz respeito ao Recurso Extraordinário 670422, com repercussão geral reconhecida, que começou a ser julgado em novembro de 2017 e tinha sido suspenso após um pedido de vista do ministro Marco Aurélio Mello. O recurso questionava uma sentença do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que permitia a mudança de nome no registro civil, desde que o cliente fosse submetido à cirurgia de transgenitalização. Um caso semelhante havia sido discutido em março, quando foi julgada a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4275.
O ministro Dias Toffoli, relator do recurso, presidiu a sessão e listou pontos na tese, como a possibilidade de mudar prenome e gênero no registro civil sem que fosse exigido nada além de manifestação de vontade, por via judicial ou administrativa; e que não conste a indicação de transexual ou da alteração na certidão para preservar a privacidade de quem a solicitou.
Os ministros destacaram que a mudança não pode conter nenhuma referência ao termo transgênero. ;O transgênero tem direito fundamental subjetivo à alteração de seu prenome e de sua classificação de gênero no registro civil, não se exigindo para tanto nada além da manifestação de vontade do indivíduo, o qual poderá exercer tal faculdade tanto pela via judicial como diretamente pela via administrativa;, diz parte da tese.
No documento também consta que, se o procedimento for feito via judicial, o juiz deve determinar a expedição de mandados específicos para a alteração em outros órgãos públicos ou privados pertinentes que terão a responsabilidade de preservar o sigilo dos atos.
A tese teve a adesão da maioria, ficando vencido apenas o ministro Marco Aurélio Mello. Já tinham votado com o relator os ministros Alexandre Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Rosa Weber. Ontem também foram favoráveis Luiz Fux, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello.
Toffoli ainda readequou pontos específicos do voto e afirmou que o direito pretendido incluiria não só os transexuais, mas os transgêneros, e que a alteração poderia ser feita administrativamente. Antes da decisão do Supremo, transexuais somente podiam adotar o nome social em identificações não oficiais, como crachás e matrículas escolares.
Para Michel Platini, presidente do Conselho de Direitos Humanos do Distrito Federal e representante da Aliança Nacional LGBTI em Brasília, a mudança é para se comemorar. ;É mais uma decisão que traz esperança e preserva os direitos da nossa comunidade. Também tem um efeito pedagógico na sociedade, pois volta a debater o assunto e serve para que se entenda que o preconceito é atrasado;, frisou. ;A decisão diminui ainda os empecilhos que têm sido colocados quando se trata da execução dos direitos LGBTI. Os cartórios, por exemplo, têm dificultado o registro. É mais um instrumento para defender os nossos direitos.;
O presidente do Grupo Gay da Bahia, Marcelo Cerqueira, afirma que o Judiciário tem trabalhado positivamente ao assegurar os direitos das comunidades LGBTI. ;A decisão de obrigatoriedade de cirurgia era autoritária, machista e invasiva, pois obrigava as pessoas a se submeterem a operações complicadas e de recuperação difícil;, ressaltou. ;Com essa mudança, a comunidade começa a ter o direito de participar do mercado de trabalho com o nome e o gênero que se identifica. É um avanço.;
"A decisão de obrigatoriedade de cirurgia era autoritária, machista e invasiva"
Marcelo Cerqueira, presidente do Grupo Gay da Bahia