A caça de animais silvestres é proibida no Brasil há mais de cinco décadas. Contudo, um projeto de lei pode mudar este cenário. A matéria ainda é analisada na Comissão de Meio Ambiente da Câmara. O texto pretende mudar a política nacional de manejo da fauna, que, na prática, vão permitir o abate de animais silvestres. O tema volta ao centro da polêmica já que o autor do projeto, o deputado federal Valdir Colatto (PMDB-SC) que que a matéria vá ao plenário logo após o recesso. Ambientalistas são contrários a aprovação.
No último mês, o projeto seria debatido na Comissão de Meio Ambiente, mas acabou retirado de pauta. Prestes a completar dois anos, desde a criação do projeto, em outubro de 2016, ele teve 24 andamentos, entre requerimentos, despachos e apresentação de parecer. Segundo o texto do projeto, tal mudança seria necessária para conter algumas espécies consideradas invasoras e que oferecem perigos à produção agropecuária. O argumento trouxe o apoio da bancada ruralista. O texto reduz as multas e a prisão para quem for pego caçando irregularmente, prevê a criação de áreas de reserva para caça e espaços para a comercialização.
A principal crítica de ambientalistas é que o projeto passa a permitir a autorização dos órgãos ambientais à caça de animais silvestres mediante a apresentação de um plano de manejo. Isso, segundo os especialistas, impede a fiscalização. O projeto também precisa ser analisado pelas comissões de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça, antes de ir ao plenário.
Em consultas populares, o projeto não é bem avaliado. No portal da Câmara, 1.511 pessoas avaliaram a proposta. Somente 2%, 33 votos, como positivo. Um abaixo-assinado contrário na internet tem quase 174 mil adesões. Uma campanha com artistas nacionais promovida pela ONG Ampara Animal pede a preservação da fauna brasileira e se manifesta contra a caça. Entidades como Greenpeace e WWF Brasil já se posicionaram contra.
A lei não tem sustentabilidade e se for aprovada será um retrocesso, defende Warner Bento Filho, analista de políticas públicas do WWF-Brasil. ;Esse projeto foi feito sem nenhum estudo prévio que nos dissesse se a ideia é boa ou não é. O projeto não situa nenhum estudo, avaliação ou dado que sustente que isso possa ser feito de maneira sustentável. Pelo princípio da precaução, é preciso debater. Seria um retrocesso imenso. Passamos dessa fase em 1967. Antes dessa lei a fauna não tinha nenhuma proteção do Estado;, avalia.
O deputado Valdir Colatto defende que essa é uma proposta para regulamentar uma área que não tem regras nem controle. ;Não é um projeto que libera a caça, mas sim, que muda a política para a fauna. O que estou propondo é a caça de controle para animais que viraram pragas e trazem prejuízos econômicos e de saúde. Quero que coloque em votação na volta do recesso. Hoje como está não tem regra, nem controle;, destaca, ao acrescentar que cada unidade da Federação tem um entendimento sobre o tema. ;Precisamos votar logo esse texto;. O Correio não localizou o relator da matéria, deputado Nilto Tatto (PT-SP).
;Legislação moderna;
Fernando Fernandes, presidente da Confederação de Tiro e Caça do Brasil (CTCB), apoia a modificação. ;Comecei a caçar com 12 anos. Hoje, estou com 61. Continuo sendo contra caçar animais silvestres, mas temos que ter uma legislação moderna, assim como em Portugal, Espanha, França, Canadá e Argentina. Deve-se permitir a caça em períodos determinados e ter fazendas específica para isso. Hoje, na verdade, não existe controle sobre nada;, explica.
Ele mora em Miami e garante que caça regularmente nos Estados Unidos. ;Nunca tive problema. O que acontece é que tem caça no Brasil inteiro, só que isso não é fiscalizado, não é controlado. Precisamos que haja uma legislação para que as espécies sejam caçadas para terem predadores. Há casos críticos como de búfalos selvagens, jacarés gigantes e javalis;, pondera.
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) permite desde 2013 a caça ao javali. O animal não é nativo da fauna brasileira e por isso não existem predadores naturais. Eles foram introduzidos no Rio Grande do Sul na década de 90 e tiveram sua criação permitida por órgãos do governo, a princípio para servir como carne ;exótica;. Como a carne não foi bem aceita, a população cresceu massivamente.
O que muda
; O projeto anula a Lei de Proteção à Fauna (Lei n; 5.197/67), que proíbe o exercício da caça profissional.
; O projeto de lei também retira da Lei de Crimes Ambientais (Lei n; 9.605/98) o agravamento até o triplo da pena de detenção de seis meses a um ano, e multa, por matar, perseguir, caçar, apanhar ou utilizar animais sem licença, se isso for feito durante caça profissional.