Otávio Augusto
postado em 21/06/2018 13:52
Após recomendação do Ministério Público Federal (MPF), o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) desistiu de reduzir a área ocupada pelo Quilombo Mesquita, localizado na área rural da Cidade Ocidental (GO), distante 65km da capital federal. No início do mês, como o Correio mostrou, o órgão publicou resolução em que diminuiu em 80% o espaço ocupado pelas 785 famílias. O terreno passou de 4,1 mil hectares para 761 hectares.
A questão foi parar na Justiça e o MPF cobrou explicações para a alteração do território. O Conselho Diretor da Instituição rediscutia a questão do quilombo, quando foi notificada da contrariedade da Procuradoria. O principal projeto para aquela terra é a construção de condomínios de luxo, como outros existentes na região. Quatro ações judiciais tratam da regularização fundiária do quilombo. A nova resolução com a exclusão dos artigos referentes à redução do quilombo será publicada na edição desta quinta-feira(21/6), no Diário Oficial da União.
A área da comunidade é reconhecida pelo Incra desde 2011. O decreto do Incra, agora sem validade, que encolheu a área quilombola não levou em consideração o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), também feito pelo órgão. A demarcação de terras passou a ser direito constitucional em 2003, quando foi editado o Decreto 4.887. Os primeiros registros da ocupação do Quilombo Mesquita são de 1746: 272 anos de história.
As lideranças quilombolas comemoraram a garantia das terras. ;É um alívio para nós. É uma vitória do povo quilombola. O Brasil se mobilizou para defender o quilombo e mostrou que unidos podemos brigar pela garantia de direitos;, destaca Sandra Braga, líder comunitária do Quilombo Mesquita. Contudo, ela destaca a necessidade de continuar ;vigilante;. ;Estamos celebrando, mas observando quais serão as próximas atitudes. Outros quilombos estão sofrendo o mesmo tipo de pressão;, conclui.
Segundo o Incra, o processo de delimitação do território do Quilombo Mesquita não foi encerrado. "Ele terá prosseguimento, respeitando-se todos os trâmites e prazos estabelecidos pela legislação em vigor", destaca, em nota. Contudo, garante que o Conselho Diretor vai acatar os pareceres do MPF e decidiu pela revogação dos artigos que previam a redução.
A procuradora da República Nádia Simas Souza destacou em seu parecer. "O Estado brasileiro deve proteger, incentivar e valorizar as manifestações culturais, com destaque para a cultura afro-brasileira, aí incluídas ;as formas de expressões; e os ;modos de criar, fazer e viver;, como elementos do patrimônio cultural brasileiro", escreveu.
Prejuízos
Com a redução da área quilombola, o módulo fiscal ; índice de área mínima para exploração economicamente viável ; ficou abaixo dos níveis de Goiás e da Cidade Ocidental. As famílias quilombolas ficaram com 0,9 hectare de terra, enquanto o estado tem 75 hectares por família e o município 40 hectares por família.
A situação mobilizou, na semana passada, mais de 90 lideranças quilombolas de 24 unidades da Federação. Eles saíram na defesa da preservação do terreno. A redução, acusam os quilombolas, aconteceu após lobby de políticos e empresários que estariam interessados na região. No Brasil, são mais de 6 mil comunidades quilombolas, sendo 47 somente em Goiás.
Quando a resolução foi editada, o Incra disse que os custos para regularização fundiária do Quilombo Mesquita na forma proposta pelo RTID custaria R$ 1 bilhão em indenização aos donos. ;Tal volume de recursos representa três vezes o orçamento total do Incra para 2018, e 300 vezes o orçamento destinado à regularização de territórios quilombolas para todo o país;, destacou, em nota.
O texto conclui: ;A redução poderia beneficiar a comunidade com a regularização fundiária em um patamar exequível pelo erário, eliminando a insegurança jurídica em que vivem os quilombolas daquele território;.