Ingrid Soares, Gabriela Vinhal
postado em 14/04/2018 08:00
;Eu sou, porque nós somos. Eu sou defensora dos direitos humanos, porque nós somos vida.; A frase é da vereadora Marielle Franco (PSol), executada no bairro Estácio, no centro do Rio de Janeiro. O crime, que também deixou morto o motorista da parlamentar, Anderson Pedro Gomes, completa um mês hoje. Após 30 dias de investigação, a Polícia Civil do Rio de Janeiro e a Polícia Federal ainda não apontaram culpados. Enquanto isso, representantes, organizações mundiais e, principalmente, protestos convocados pelo PSol pressionam o governo por justiça. Nas ruas, exigem que os autores sejam presos e bradam juntos palavras de ordem de Marielle, que insistem: ainda está presente.
Era 14 de março, às 21h30, quando a luta e as ideias de Marielle se eternizaram. Ela havia passado quase duas horas no evento ;Jovens Negras Movendo Estruturas;, na Lapa, no Centro da cidade, intermediando uma roda de conversa sobre a militância e a resistência da mulher negra na sociedade. Após o fim do encontro, ela, Anderson e uma assessora dela deixaram o local. Cerca de 4km depois, Marielle e o motorista foram brutalmente alvejados. A assessora sobreviveu. O carro dos suspeitos emparelhou com o veículo onde estavam e os criminosos dispararam. Marielle foi atingida com quatro tiros na cabeça. Anderson, com três nas costas.
Ao Correio, a professora de direito da Universidade de Brasília (UnB) Soraia da Rosa Mendes, amiga de Marielle e colega de militância, ressaltou a importância de ter tido, na política atual, uma figura que retratasse as minorias do país. ;Mulher, negra, lésbica e favelada. A Mari significava, com a sua eleição, um outro modo de fazer política. O que ela era e como ela atuava a distanciava das práticas tradicionais. Não é à toa que ela tenha sido morta na saída de uma roda de conversa de mulheres negras;, disse. ;É revoltante tudo isso que aconteceu. O culpado precisa ser encontrado e punido;, acrescentou.
O inquérito instaurado pela Polícia Civil tem o prazo de 30 dias, que vence neste sábado. Com isso, o órgão deve pedir para que seja prorrogado. Na terça-feira, peritos identificaram fragmentos digitais nas cápsulas disparadas no crime. Até então, a equipe acreditava que a arma do crime seria uma pistola 9mm, no entanto, ontem, disse ser de uma submetralhadora. Essas pistas não seriam suficientes, contudo, para uma comparação com impressões digitais armazenadas em bancos de dados da polícia. No entanto, poderiam ser confrontadas com as de eventuais suspeitos.
O especialista em segurança pública Arthur Trindade afirmou que a polícia ainda conta com tempo para prosseguir nas investigações. Entretanto, se o prazo se alongar, a corporação vai sofrer maior pressão para concluir o caso. ;A polícia ainda tem crédito. No entanto, é uma investigação difícil por conta do estilo do crime. Com o passar do tempo, as pressões aumentarão cada vez mais. Com a proximidade das eleições, o ideal é que o crime seja resolvido o quanto antes.;
Outro caso
A principal linha de investigação, até o momento, é a de motivação política. A equipe da Polícia Civil já ouviu cerca de 50 pessoas, incluindo 12 vereadores da Câmara Municipal do Rio de Janeiro. O ex-vereador Cristiano Girão Matias também prestou depoimento. Ele foi indiciado na CPI das Milícias em 2008, na qual Marielle trabalhou como assessora do deputado estadual Marcelo Freixo (PSol).
Outro fato que entrou na investigação das autoridades foi a morte do líder comunitário Carlos Alexandre, colaborador do vereador Marcello Siciliano (PHS-RJ), um dos convocados para falar à polícia. Carlos Alexandre foi morto a tiros no domingo, na Zona Oeste do Rio, dois dias depois de Siciliano depor na Delegacia de Homicídios sobre o inquérito. Os policiais investigam se o assassinato tem relação com a execução de Marielle e Anderson. Se for comprovado que o líder comunitário é o autor dos disparos, a hipótese de uma possível queima de arquivo será analisada.
Uma das primeiras pistas descobertas pela polícia foi a origem da munição utilizada pelos assassinos. As nove cápsulas ; sendo oito do lote UZZ 18 ; foram vendidas pela Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC), em dezembro de 2006, para o Departamento de Polícia Federal em Brasília. O material foi distribuído para todo o país.