Esse crime, lá no fundo, tem uma autoria coletiva. Não pela execução em si, mas por omissão sistemática, egoísmo, concentração de riqueza, roubalheira. Oprimida, com ou sem consciência, a sociedade brasileira tem sido calada. Por isso, Marielle tornou-se uma voz potente, uma presença forte, mesmo ausente fisicamente, uma lembrança mais viva do que nunca. A execução de Marielle e de Anderson conseguiu o feito de mobilizar, como nada mais, uma população entorpecida. Por todo o Brasil, física e virtualmente, houve protesto. Apareceu a dor; apareceu amor por quem se doou inteira a uma vida de luta pelas minorias.
Há algo maior nisso tudo. As investigações desse crime poderão levar a caminhos mais profundos, desconfio. Igualmente importante, no entanto, é que houve um despertar. A certeza de que não será possível simplesmente esquecer, virar a página, contar mais dois nas estatísticas. Desta vez, não. Não passará e é bom que não passe. É fundamental perdurar a sensação de que há limite para tudo, inclusive para tantas injustiças e vilanias. O povo brasileiro, em sua maioria, é vítima. Mas também precisa ser motor de transformações sociais. Marielle deixou esse legado. É preciso segui-la.