Continua internado, em estado gravíssimo, o bebê Arthur, baleado dentro do útero materno na última sexta-feira, em Duque de Caxias (RJ). A criança sofreu uma lesão importante na coluna vertebral e encontra-se tetraplégica, mas os médicos dizem que há chances de o quadro ser revertido. A mãe, Claudineia dos Santos, 29 anos, também está internada. A paraibana, residente na Favela do Lixão, havia ido ao supermercado e acabou baleada quando começou um confronto entre traficantes e policiais militares. Dados do Instituto de Segurança Pública (ISP) mostram que o número de homicídios dolosos e por oposição à intervenção policial subiu de 2.424 para 2.809 de janeiro a maio de 2017, em relação ao mesmo período do ano passado. A Baixada Fluminense, onde Claudineia reside, lidera as estatísticas: a quantidade de assassinatos chegou a 1.014 nos primeiros cinco meses deste ano, ante 782 registrados no mesmo período de 2016.
[SAIBAMAIS]Vítima da guerra no comércio ilegal de drogas, Claudineia, que estava com 39 semanas de gestação e esperava ter um parto normal, teve de passar por uma cesariana de emergência ainda na sexta-feira. O tiro entrou pela coxa esquerda dela e perfurou o útero. Por falta de recursos no Hospital Moacyr do Carmo, em que foi realizada a cirurgia, Arthur precisou passar por uma drenagem improvisada dos pulmões logo após o seu nascimento. Foi utilizado o único dreno torácico do hospital no pulmão que havia sido perfurado pela bala e sofria uma hemorragia. O outro pulmão foi drenado utilizando-se um tubo orotraqueal (usado para entubação na traqueia). A criança seguiu para o Hospital Estadual Adão Pereira Nunes, que dispõe de mais recursos de unidade de terapia intensiva. Além da lesão na coluna vertebral, Arthur teve ainda uma orelha dilacerada e uma ferida superficial na cabeça.
O caso é investigado em Duque de Caxias. O pai da criança, Clebson Cosme da Silva, depôs ontem. Também foram ouvidos os seis policiais que estavam na favela durante o tiroteio. As armas deles seguiram para a perícia. Na opinião do coordenador de Segurança Humana da organização não-governamental Viva-Rio, coronel Ubiratan Angelo, independentemente da conclusão da perícia, a causa da tragédia é a política de repressão ao comércio de drogas. ;Se foi reação dos bandidos à operação da polícia ou não, o que importa é que tudo acontece por conta do comércio ilegal. Em uma operação de repressão, os bandidos se sentem ameaçados pelos policiais e atiram. Da mesma forma, quando uma gangue entra em confronto com outra, os policiais intervêm. O policial morre, mata e vai preso;, afirma.
Sem eficácia
Ex-comandante da Polícia Militar do Rio de Janeiro, o coronel considera ineficaz o combate ao crime organizado via ação policial. ;A intervenção da polícia ocorre acreditando-se que vai interromper o tráfico de drogas. Não vai, porque o tráfico é extremamente lucrativo. Se não vemos redução nas vendas, é porque continua havendo demanda. Para interromper a violência, deve haver outra estratégia que não seja a da repressão;, defende. Para ele, o que leva a cada vez mais violência é a não legalização das drogas: ;A droga provoca muito menos mal do que a venda ilegal. O que mata não é a droga, é a arma que está por trás da droga;. O especialista diz que a política de criminalização da venda de drogas é uma ;espada do demônio; sobre a cabeça do policial: ;Quando faz uma operação, ele tem que decidir se está diante de um traficante ou de um usuário, o que abre espaço para a corrupção e a violência;.