Apesar da tensão judicial, a aprovação da MP 759 pouco interfere, segundo a Secretaria de Estado de Gestão do Território e Habitação (Segeth), no processo de regularização da capital federal ; considerado o maior do país. A cidade conta com regulamentação própria muito semelhante à do texto votado no Senado, na última quarta-feira (leia detalhes no quadro). Entretanto, a Agência de Desenvolvimento (Terracap) não descarta ;adequações; na legislação do DF. A nova regra entende que, em áreas consolidadas de maneira irreversível, não há outra forma de se resolver legalizar a não ser regularizando os terrenos.
Desde 2015, quando o Executivo local começou um amplo processo de regularização de terras, há pouco consenso. O governo defende que legalizar esses terrenos inibe a ação de grileiros e aumenta a arrecadação de impostos. As críticas mais duras vêm de arquitetos e urbanistas. Para eles, a regularização beneficia quem comprou ilegalmente e não prevê equipamentos públicos, como delegacias, escolas, hospitais e praças. Moradores de áreas como Vicente Pires, Grande Colorado e Lago Oeste comemoram, como é esperado.
Um dos pontos mais celebrados é a diretriz de compra e venda. A aquisição dos terrenos será por negociação direta e aqueles que pagarem à vista terão 25% de desconto. Será permitido o uso do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e o parcelamento pode chegar a 240 meses. A avaliação dos terrenos seguirá o preço de mercado e serão abatidas melhorias, como pavimentação de vias e iluminação pública. É permitida a compra de mais de um terreno, por exemplo um comercial e outro residencial.
Há cinco anos, o servidor público aposentado Renê Lopes Godinho, 66 anos, deixou um apartamento na 315 Norte para viver no Condomínio Vivendas Lago Azul, no Grande Colorado, distante 20km do Plano Piloto. A regularização do imóvel é uma preocupação desde a compra do terreno. ;Era uma angústia não saber quando seria possível regularizar e quanto teria que ser pago. Vamos respirar mais tranquilos;, conta.
A presidente da União dos Condomínios e Associações de Moradores do Distrito Federal (Única-DF), Junia Bittencourt, explica que o texto da MP 759 é uma negociação antiga que pode pôr fim a uma questão que já se arrasta há mais de 25 anos. ;A União está propondo condições favoráveis à negociação. O preço dos imóveis deve ficar dentro de um valor possível de pagamento;, conclui. Segundo cálculo da entidade, 11 mil pessoas podem ser beneficiadas no DF.
Reações
Em 32 páginas, o MPF critica diversos entendimentos da MP 759. O órgão vê inconstitucionalidade em artigos que tratam da regularização fundiária rural e de áreas federais da Amazônia Legal. A nota técnica, assinada pela subprocuradora geral da República Ela Wiecko de Castilho, alerta para o desmatamento e a concentração fundiária, que segundo o documento, ;caminha na direção de grandes posseiros;. Até mesmo o requisito de urgência, necessário para a edição da medida provisória, é questionado pelo MPF.Ainda nas primeiras votações da MP 759, o Instituto de Arquitetos do Brasil manifestou contrariedade ao texto. ;Do ponto de vista urbano, vai ter a legalização sem qualquer contrapartida daqueles que compraram ilegalmente. Dessa forma, condomínios serão privilegiados e o espaço público, prejudicado. Do ponto de vista urbano é um retrocesso. A MP em sua essência privilegia a titulação (de lotes) em vez do planejamento da cidade;, reclama.
Apesar do vaivém da lei, o secretário de Gestão do Território e Habitação, Thiago de Andrade, garante que todos os processos de regularização na capital federal vão obedecer a critérios de risco ambiental e urbanístico. ;Não se pode crer que a MP vai regularizar todos os terrenos. Há critérios e condições a serem atendidas. Os governos terão de regulamentar a lei tendo em vista a particularidade de cada cidade. Aqui, temos o nosso plano diretor de ordenamento territorial;, pondera. Ao todo, 18 mil processos de regularização estão tramitando no DF, entre terrenos do governo do DF e de proprietários particulares.