Eles estimam que até 1.140 espécies podem desaparecer pelo desmatamento acumulado. ;Esse é um número oito vezes maior do que todas as espécies registradas como extintas no mundo até hoje;, disse o coordenador da pesquisa, Bernardo Strassburg. Desde o ano de 1.500, quando foram feitos os primeiros registros das espécies de plantas no planeta, 139 foram declaradas oficialmente extintas.
Segundo Strassburg, o Cerrado já perdeu metade da área original. ;Se tudo continuar no cenário que a gente chama de tendencial, vai perder um terço do que sobrou nas próximas três décadas;. O Cerrado já perdeu 88 milhões de hectares, o equivalente a 46% da cobertura nativa.
Isso gera problemas ambientais de diversas naturezas. A crise hídrica que a região Centro-Oeste, como o Distrito Federal, passam no momento seria agravada pela falta do bioma e também haveria a emissão de gases de efeito estufa de 8,5 bilhões de toneladas de gás carbônico.;Isso tudo seria consequência direta do desmatamento projetado para os próximos 30 anos;, diz.
Strassburg, que é secretário-executivo do Instituto Internacional para a Sustentabilidade (IIS) e coordenador do Centro de Ciências para a Conservação e Sustentabilidade da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), destaca que o Cerrado é um hotspot mundial de biodiversidade (região biogeográfica que é simultaneamente uma reserva de biodiversidade e pode estar ameaçada de destruição).
Mix de políticas
A pesquisa diz que esse cenário pode ser evitado sem comprometer o aumento da produção agrícola programado, que projeta em torno de 15 milhões de hectares de expansão de soja e cana-de-açúcar nos próximos 30 anos no Cerrado.
;Isso tudo pode ocorrer, desde que aconteça para dentro de áreas que já foram desmatadas, que hoje são utilizadas como pastagens de baixa produtividade. Você melhora a produtividade de pastagens em outros locais, libera algumas pastagens para soja e cana, faz toda essa expansão. Esses 15 milhões de hectares cabem nessa metade do Cerrado que já foi desmatada sem necessitar fazer nenhum desmatamento adicional;, ressalta.
Segundo Strassburg, o Código Florestal Brasileiro estima que os fazendeiros terão que restaurar 6 milhões de hectares, o equivalente a 6 milhões de campos de futebol, caso queiram ficar em conformidade com a lei. O artigo da revista mostra, ainda, que restaurar essa quantidade de vegetação nativa é bom, mas se isso for feito nas áreas otimizadas para a proteção das espécies, se conseguirá evitar 83% desse quadro projetado.
;Ou seja, se você expande a agricultura para áreas já desmatadas e restaura o Cerrado nas áreas mais importantes para as espécies, você consegue evitar 83% do quadro projetado;, diz o pesquisador.
O estudo cita um conjunto de oito políticas públicas e privadas existentes, algumas em aplicação no Cerrado e outras na Amazônia. Mas sugere que algumas delas, como o caso da Moratória da Soja, por exemplo, deveria ser estendida para o Cerrado. O coordenador disse que esse mix de políticas precisa ser coordenado entre si e financiado de forma apropriada.
Além da Moratória da Soja, implantada na Amazônia, que praticamente eliminou a conversão direta de áreas de floresta para o cultivo da soja na região, as políticas em vigor incluem a expansão da rede de áreas protegidas, uma vez que o Cerrado tem hoje menos de 10% de sua área protegida em unidades de conservação. Strassburg diz que seria importante também o aumento do financiamento para conservação, inclusive verbas oriundas de projetos de combate às mudanças climáticas.
Além disso, uma série de políticas nacionais, estaduais e municipais diretamente focadas na preservação de espécies ameaçadas, devem ser fortalecidas. Ele citou o plano de agricultura de baixo carbono, do Ministério da Agricultura, que poderia ser implementado em escala maior, tendo a preocupação de orientar a expansão da soja e da cana para áreas já desmatadas e melhorar a pecuária em outras áreas.
Para tudo isso funcionar, Strassburg afirma ser essencial que haja um planejamento espacial estratégico para identificar as áreas que são prioritárias para a conservação e restauração da vegetação nativa e as áreas onde a expansão da agricultura teria menor impacto ao meio ambiente, além de serem boas para a atividade agrícola.
O estudo conta com a parceria dos ministérios do Meio Ambiente (MMA) e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.
O diretor do Departamento de Conservação de Ecossistemas do MMA, Carlos Alberto de Mattos Scaramuzza, é um dos autores do artigo, segundo o coordenador. Ele espera que o trabalho seja útil para a formulação de políticas públicas ambientais no país e também para mobilizar o apoio necessário para a preservação do Cerrado.