Câmeras de segurança do museu registraram o momento do vandalismo, mas, segundo a Polícia Civil, a a análise da gravação sozinha ainda não permite identificar o autor do crime. Conforme a assessoria da corporação, foi feita perícia e mais investigações estão em andamento para verificar se foi apenas um o autor da ação, classificada como ;uma cretinice; pelo diretor do museu, Rui Mourão.
De manhã, equipe da Polícia Militar de Ouro Preto esteve no local e fez o boletim de ocorrência, que foi encaminhado à delegacia local. As informações foram prestadas por um segurança de plantão e as primeiras análises da câmera de vigilância, segundo técnicos do Museu da Inconfidência, vinculado ao Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), mostraram que a pichação ocorreu antes das 6h. As palavras escritas ocupam cerca de 20 metros e podem ser vistas por quem passa pela Rua Antônio Pereira, que desemboca no espaço público tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
;Chamar este museu de elitista é um absurdo. Está aberto à coletividade e, aos domingos, a entrada é gratuita para os ouro-pretanos;, disse Mourão, referindo-se a um dos termos da pichação e explicando que vai mandar fazer a limpeza assim que possível. ;Vamos esperar o resultado da perícia. Estou procurando o produto indicado para retirar a tinta sem causar danos às pedras;, informou. Ele lembrou que se trata da segunda pichação ao museu ; a primeira ocorreu em 2010, quando foi escrita uma frase contra um político local.
Mourão disse que é preciso prender o responsável pela sujeira deixada no prédio do Inconfidência, o segundo museu federal mais visitado do país, com 150 mil pessoas/ano, atrás apenas do Museu Imperial, de Petrópolis (RJ). Na avaliação do diretor, trata-se de caso semelhante ao da Igreja de São Francisco de Assis, na Pampulha, em Belo Horizonte, igualmente alvo de pichação há quase 11 meses. Assim como a Pampulha, que detém o conjunto arquitetônico moderno, o Centro Histórico de Ouro Preto é reconhecido como Patrimônio Cultural da Humanidade, título concedido em 1980 pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Indignação
Moradores locais, turistas estrangeiros e brasileiros e defensores do patrimônio cultural se disseram horrorizados e revoltados com a pichação. Ao verificar bem de perto a sujeira deixada pelo vândalo, a turista francesa Miky Guichot-Perere observou: ;É o mesmo que pichar o Louvre;, numa referência ao célebre museu de Paris. ;Esta cidade é magnífica, maravilhosa. Já vim a Ouro Preto três vezes e acho tudo muito bonito. Isso que ocorreu não é bom;, afirmou.
A francesa, que trabalha no setor de comunicação, estava acompanhada do casal Vitor Revidiego Lopes, administrador, e Maria Helena, residentes em Artur Moreira, na Região Metropolitana de Campinas (SP). ;Esses atos de vandalismo mostram o quanto somos tolerantes com esse tipo de agressão ao patrimônio, alheio e público. A gente fica triste, é uma situação absurda;, afirmou Vitor. Maria Helena acrescentou que fatos dessa natureza devem ser denunciados e os responsáveis, punidos.
Funcionária de uma loja na Rua Antônio Pereira, a poucos metros da pichação, Lucimar das Graças Fernandes contou ter ficado revoltada ao chegar para trabalhar. ;É absurdo, pois também ;queima o filme; de Ouro Preto, prejudica a nossa cidade.; Os estudantes Guilherme Resende, de 21, aluno de química industrial, natural de Barbacena e há dois anos em Ouro Preto, e Larissa Carvalho, de 20, de engenharia geológica, também criticaram a pichação. ;É um protesto inválido. A pessoa que fez isso deveria escrever tais palavras num cartaz e afixá-lo na parede da casa dela. Aqui, jamais;, disse Larissa, fã incondicional do patrimônio de sua cidade. ;Tenho um apego gigantesco por Ouro Preto;, resumiu. ;Tem que pegar esse vagabundo, fazer ele limpar, pois agrediu o patrimônio brasileiro;, afirmou o aposentado Rubens Tavares dos Santos.
História
Em texto sobre o Museu da Inconfidência, Rui Mourão, que está na direção da instituição há 42 anos, escreveu: ;Rompendo tradição que vinha dos tempos do reinado brasileiro de dom João VI, o Museu da Inconfidência foi o primeiro a se instalar fora da faixa litorânea do país. A criação decorreu de uma ação política. Em 1936, o presidente Getúlio Vargas, que planejava a implantação da ditadura do Estado Novo, resolveu se fortalecer junto à população, apresentando-se como defensor de uma das nossas tradições mais sensíveis. Promoveu o repatriamento dos restos mortais dos inconfidentes condenados a degredo na África, onde se encontravam sepultados. As urnas funerárias, na sua chegada, ficaram longamente expostas à visitação pública no Rio de Janeiro. Assinado o Decreto 965, de 20/12/1938, de criação do museu, a transferência das ossadas para Ouro Preto contou com o acompanhamento de Vargas. (;) O governo de Getúlio Vargas mandou vir os originais do 7; volume dos Autos da Devassa, que continha a sentença condenatória de Tiradentes, e duas traves da forca em que pendeu o mártir da Inconfidência, na Praça da Lampadosa;.
Memória
História maculada
Em 21 de março do ano passado, os olhos dos brasileiros se voltaram para a Igreja de São Francisco de Assis, na Pampulha, em Belo Horizonte, joia da arquitetura moderna projetada na década de 1940 por Oscar Niemeyer (1907-2012). O painel de azulejos de Cândido Portinari (1903-1962) e a lateral de mosaicos foram pichados com tinta spray azul e roxa, numa agressão ao bem tombado nas esferas municipal, estadual e federal do patrimônio. Três pessoas foram denunciadas, e duas delas, presas. O Ministério Público de Minas Gerias conseguiu provas indicando que a depredação fora planejada. Depois de estudos e muita discussão, a superfície ficou livre da sujeira e à disposição dos milhares de visitantes que chegam ao local diariamente.