A prefeitura de São Paulo entrará com ações civis públicas na Justiça contra as 26 pessoas presas em flagrante neste mês por pichar prédios e monumentos públicos na capital paulista. Com praticamente um caso por dia, o objetivo será o ressarcimento dos danos causados e o pagamento de multas. Após pichações no aniversário de São Paulo, o prefeito João Doria (PSDB) havia prometido "endurecer" com os autores e manter as ações de limpeza, que ainda motivam protestos.
O grafiteiro Mauro Neri, de 35 anos, foi detido por policiais militares na tarde de sexta (27/1), depois de apagar a tinta passada pela Prefeitura em um grafite que ele mesmo havia feito, com aval da gestão do ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD), e pintar uma pilastra no Complexo Viário João Jorge Saad (Cebolinha), na zona sul de São Paulo. No mesmo dia, outros três pichadores foram detidos e liberados mais tarde após serem flagrados por guardas-civis metropolitanos pichando muros nas Avenidas 23 de Maio e Bernardino de Campos, na zona sul.
Neri disse que ficou revoltado ao saber que seus grafites seriam removidos, uma vez que estariam em bom estado, segundo ele. "Eu estava removendo o cinza e escrevendo novas frases onde eu já tinha autorização", disse. O material foi apreendido e foi solicitada perícia técnica. O caso está registrado na 2.; Delegacia do Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania.
Ele estava acompanhado por uma produtora espanhola que veio a São Paulo gravar parte de um documentário sobre arte jovem. O foco na cidade seria "a capital mundial do grafite", mas o grupo se surpreendeu ao saber que as obras estavam sendo removidas.
O grafite apagado foi feito em 2015 e era parte do projeto Cartografitti, da Secretaria Municipal de Cultura. O projeto foi planejado ainda na gestão Kassab, mas executado já com Fernando Haddad (PT) no governo municipal. Neri coordenou o projeto. A proposta era fazer uma série de intervenções em 21 locais estratégicos.
Apesar da prisão, o artista disse que o momento é "positivo" para grafiteiros e pichadores. "Deve ter triplicado o número de pichadores e eles estão agradecendo. Para o vândalo, ser criminalizado é positivo. Vai intimidar quem tinha medo, mas quem tem audácia está muito mais estimulado a continuar. É positivo que se explicite essa discussão, mas a questão é que a polêmica pode estar ofuscando assuntos mais importantes."
Para evitar que pichadores detidos voltem a agir, a prefeitura também pedirá à Justiça a concessão de liminares impondo multas para quem for flagrado danificando novamente os bens públicos, como revelou o Estado. As ações civis públicas, que devem começar a ser protocoladas na próxima semana, terão como base a Lei Federal 7.347/85. Os processos criminais relativos aos crimes praticados pelos pichadores ainda correrão paralelamente
Museu
A administração municipal já começou a sondar os grafiteiros que possam ter interesse em participar do projeto Museu Arte de Rua, que vai pagar artistas de rua selecionados por uma comissão para pintar pontos específicos. Artistas ouvidos pelo Estado se dividiram em relação à proposta.
O grafiteiro Paulo Ito, que ficou famoso internacionalmente na Copa do Mundo, considerou que a ação não vai remediar os erros. "Eu não vou participar em hipótese nenhuma, a não ser que tenha liberdade até para criticar o próprio Doria." Já o casal de grafiteiros Karen Kueia e Diogo Kueio aprovou a proposta. "O ruim é permanecer cinza", disseram.
Os Gêmeos
Outro expoente do grafite na cidade se posicionou na questão. Os artistas plásticos Gustavo e Otávio Pandolfo, conhecidos como Os Gêmeos e dois dos mais respeitados artistas paulistanos no exterior, criticaram nas redes sociais o que chamaram de "desrespeito à arte". Eles publicaram um vídeo em que mostram uma figura humana com os traços que lhes são característicos, de costas, escrevendo em um muro a seguinte frase: "Parabéns São Paulo! Ganhamos mais uma vez o desrespeito com a arte!" A reportagem não conseguiu localizar a dupla.