Com o verão, aumenta o risco de contágio das doenças transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti. A dengue, a zika e a chicungunha costumam ter pico de casos nesse período do ano. E, para 2017, o alerta é alto, de acordo com informações da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
A propagação dessas doenças, no entanto, ainda é cercada de boatos e falta de informação. O Correio conversou com a médica infectologista do Hospital Universitário de Brasília (HUB) Valéria Lima e com o professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Flávio Guimarães, especialista em microbiologia, que deram dicas de como cuidar da saúde nesse período. Confira.
O mosquito
O pernilongo comum também transmite alguma dessas doenças?
Não. "Esse mosquito que nos atormenta à noite não é vetor para essas doenças virais", afirma o professor Flávio Guimarães. Mas é importante lembrar que a zika, diferentemente da dengue e da chicungunha, também tem outros vetores de transmissão: a transfusão de sangue e o contato sexual. Embora a transmissão nesses últimos dois casos seja mais rara, ainda é fundamental seguir os protocolos específicos de prevenção contra a zika.
O Aedes é mais comum em casas do que apartamentos?
Não necessariamente. Embora casas tenham, em geral, um ambiente mais propício para a proliferação dos mosquitos, como jardins, plantas, piscinas e outros reservatórios de água, este não é o critério mais importante. "Depende mais do morador do que do imóvel", destaca Guimarães. "Um morador consciente não é tão problemático", explica, já que em um apartamento com muitas plantas ou com varanda, o risco pode ser igual se não houver proteção adequada.
A picada do Aedes é diferente da picada de outros mosquitos?
Não. A aparência é igual. "Não dá para identificar pela picada, até porque a reação é individual. Algumas pessoas têm reação mais alérgica, avermelhada, outras nem tanto", afirma a médica Valéria Lima.
Há diferença entre o zumbido do Aedes e do pernilongo comum?
Não que seja perceptível aos ouvidos humanos, então é impossível identificar o Aedes assim. O professor Flávio Guimarães ressalta que a principal diferença entre os dois está no comportamento e na aparência.
O aedes tem um horário mais comum?
Sim. Os especialistas apontam que os horários de pico do Aedes são no início da manhã (as três primeiras horas do dia) e no final da tarde, perto do anoitecer. Mas atenção: o mosquito pode aparecer em qualquer horário. "Não quer dizer que ele não pode voar e picar durante o resto do dia, mas ele realmente é mais ativo nesses dois períodos", diz Guimarães.
Aliás, essa é uma diferença de comportamento importante entre o Aedes e o mosquito comum, que tem hábitos mais noturnos. Além disso, o Aedes é "mais agressivo", segundo o professor, e pode picar a mesma pessoa várias vezes, aumentando as chances de transmissão das doenças.
É verdade que o Aedes tem voo baixo, rasteiro, de até um metro?
Sim. O Aedes é um tipo de mosquito que não gosta de voar alto e prefere ficar perto do chão. Mas isso não quer dizer que ele só está presente no térreo. "Ele consegue ;subir; escadas, entrar em elevador;", esclarece o professor. Assim, o Aedes pode chegar aos andares mais altos; a diferença é que ele voa mais perto do chão.
Prevenção
Usar roupas claras ajuda na prevenção?
O professor Guimarães confirma que o Aedes se sente mais atraído por roupas e locais escuros, mas isso ocorre só no período em que o mosquito precisa depositar os ovos. Então, no momento de picar, não, a cor da roupa não faz diferença. O mais importante, segundo ele, é o tipo de roupa. A médica Valéria Lima confirma: usar manga e calça comprida é uma forma de proteção mais eficaz.
O ventilador e o ar condicionado podem afastar o Aedes?
Sim. A médica ressalta que só deixar o ambiente fechado, com ventilação interna, já torna o local mais protegido. Flávio Guimarães acrescenta que o ventilador e o ar condicionado funcionam como uma proteção mecânica, já que o Aedes é um tipo de mosquito mais frágil e com capacidade de voo limitada; além disso, o Aedes prefere locais quentes.
O Aedes se reproduz em água limpa ou suja?
Nas duas. Embora esse mosquito tenha preferência por água limpa, o mito de que ele só se reproduz em águas cristalinas e limpas já foi desmentido. "É um mosquito versátil, que consegue se multiplicar até em água bem poluída", alerta Guimarães.
Existe um local do corpo mais visado pelo Aedes?
Os braços e as pernas são os principais alvos, já que o Aedes tem preferência por locais mais expostos. Por isso, os especialistas aconselham o uso de calça e manga comprida. O rosto, por exemplo, não é um local tão comum.
Qual é a frequência ideal de limpeza dos ambientes?
O tempo ideal indicado por órgãos públicos é de, no máximo, sete dias para a verificação dos utensílios que podem acumular água. O professor Guimarães explica que o prazo foi definido com base no ciclo de vida do mosquito, que leva de cinco a sete dias para passar da fase do ovo para a fase adulta.
O vinagre pode ser usado para combater a reprodução do Aedes?
Talvez. Por ser ácido, o vinagre, colocado em quantidade alta nos reservatórios de água, poderia atrapalhar a reprodução do mosquito. Mas, como o Aedes é considerado versátil e resistente, o uso de uma quantidade pequena não teria tanto efeito.
O mesmo vale para a água sanitária: é fundamental ficar atento às recomendações oficiais! Atualmente, a indicação é de 2 ml do produto para cada litro de água.
A planta crotolária pode ajudar na prevenção do mosquito?
Não há evidências científicas disso.
Comer inhame pode auxiliar na batalha contra a dengue?
Também não há evidências.
E o complexo B?
As vitaminas do complexo B, encontradas em alimentos como vegetais, cereais integrais, leite, carne e ovos, já parecem mais eficientes. De acordo com o professor da UFMG, existem pesquisas demonstrando que a ingestão do complexo em concentração maior deixa a pessoa com um cheiro desagradável para o Aedes, mas o especialista alerta que essa não é uma proteção muito eficaz.
Peixes comem as larvas do mosquito?
Sim. Para locais com corpos d;água adequados para a criação de peixes, este é um dos métodos de prevenção que pode ajudar.
A essência de cravo pode afastar o mosquito? E o própolis?
Estes são conhecimentos populares repassados com frequência, mas que não têm evidências científicas.
Quais remédios usados com frequência não podem ser tomados por quem contraiu dengue?
A aspirina é um deles, já que tem propriedades que diminuem a capacidade de coagulação sanguínea. A dengue pode levar a complicações hemorrágicas, então a aspirina pode piorar esse caso.
Uma parte da comunidade científica e médica acredita que o paracetamol, por ter componentes de certa toxicidade, pode afetar o fígado, que também costuma ser danificado com a dengue.
No caso de suspeita de dengue, o mais importante é procurar um médico para ter o diagnóstico e o tratamento corretos.
Já existe vacina para a dengue?
Sim. A vacina foi aprovada pela Vigilância Sanitária. A médica Valéria Lima confirma que a eficácia é boa e que a vacina protege contra os quatro tipos existentes da dengue. Ela pode ser aplicada em pessoas de 9 a 40 anos. No entanto, há contraindicações, então é necessário consultar um médico.
No entanto, a vacina ainda não está disponível na rede pública. Lima afirma que o Ministério da Saúde está analisando a situação para determinar o melhor uso do produto. A demora acontece porque a vacina deve ser tomada em três doses com intervalo de um ano, então não serve como contenção de epidemia, e sim como prevenção a longo prazo. Além disso, há um risco de desistência entre cada dose, o que acarretaria em gasto desperdiçado de recursos públicos.
Quais são os principais erros na prevenção e no diagnóstico dessas doenças?
"Na prevenção, o mais importante é o alerta contínuo enquanto comunidade", alerta a médica do HUB.
O maior erro no diagnóstico é que, em geral, ele é tardio. É importante procurar avaliação médica. O paciente deve conhecer os sintomas e até ficar atento aos vizinhos, pois a presença da doença por perto aumenta o risco de propagação. "Se o tratamento não for feito desde o início, há chance de morte, principalmente com a dengue", afirma Valéria.
Para as mulheres, principalmente em idade fértil, o cuidado deve ser intensificado por causa da dica. O planejamento de reprodução é fundamental.
*Estagiária sob supervisão do editor Humberto Rezende