Jornal Correio Braziliense

Brasil

Entre história e mito, gaúchos comemoram o Dia da Revolução Farroupilha

Os festejos remetem ao aniversário da revolução que começou no dia 20 de setembro de 1835 e foi a mais longa guerra separatista da história do Brasil

No dia 20 de setembro, milhares de gaúchos participam dos festejos pelo Dia da Revolução Farroupilha. Por todo o Rio Grande do Sul, a data é comemorada com desfiles, acampamentos tradicionalistas, apresentações artísticas e outros eventos nos quaisa cultura gaúcha é exaltada.

Os festejos remetem ao aniversário da revolução que começou no dia 20 de setembro de 1835 e foi a mais longa guerra separatista da história do Brasil. A resistência da proclamada República Rio-Grandense diante do Império do Brasil, que durou quase dez anos, é lembrada com orgulho pelos que se identificam com o gauchismo e com os valores farroupilhas de Liberdade, Igualdade e Humanidade. No entanto, pesquisadores da história gaúcha afirmam que a percepção popular sobre os acontecimentos da Guerra dos Farrapos está distorcida.

[SAIBAMAIS];Hoje a gente tem essa ideia de que os farroupilhas eram abolicionistas, de que eles eram defensores de grandes ideais. Eu acho que se as pessoas soubessem mais a respeito, elas se desiludiriam e se afastariam um pouco das festividades;, afirmou o historiador e jornalista Juremir Machado da Silva, autor do livro História Regional da Infâmia: o destino dos negros farrapos e outras iniquidades brasileiras, ou como se produzem os imaginários.

O pesquisador afirmou que a história está longe de ser o que a tradição propagou no imaginário popular. ;Foi uma revolução de proprietários, uma revolta de fazendeiros. A população mais pobre simplesmente foi levada ;de roldão;. Os negros foram usados como ;bucha de canhão; e, depois, foram traídos;, contou.



A percepção ;romantizada; dos gaúchos sobre o que foi a Guerra dos Farrapos levou Juremir a acreditar que as pessoas comemoram muito mais um certo ;mito; da vida no campo e das tradições gauchescas do que propriamente a história da revolução. ;As pessoas precisam de elementos que sirvem para agregar, para que elas pertençam a uma tribo e possam vibrar em comum. Normalmente, são motivos de ordem histórica aproximativa, um mito fundador que tem uma suposta história de grandeza e de grandes feitos;.

Por isso, apesar da visão crítica sobre o passado farroupilha, o jornalista e historiador não acha que as comemorações de 20 de setembro sejam reprováveis. ;Elas podem até ser consideradas positivas na medida em que as pessoas se reúnem, se sentem felizes e organizam clubes de ajuda mútua, como são os Centros de Tradições Gaúchas (CTGs);, avaliou Juremir, e concluiu: ;Eu não acho que a comemoração seja prejudicial. O que fica é a questão da verdade histórica, que precisa ser amparada naquilo que os documentos permitem dizer;.

Tradição gaúcha
Já para o presidente do Movimento Tradicionalista Gaúcho, Nairo Callegaro, a comemoração é uma forma de resgatar e preservar valores que estavam presentes na proclamação da República Rio-Grandense pelo general Antônio de Souza Neto. ;Ele era um dos mais idealistas e agiu por um ideal de república, de liberdade, de garantia de direitos à população. Pensamentos que, décadas mais tarde, foram confirmados com a proclamação da República do Brasil;, ressaltou Callegaro.

O presidente do MTG disse, ainda, que a celebração da Revolução Farroupilha é um evento da cultura brasileira. ;Temos orgulho de ser brasileiros. Nosso movimento não é separatista, mas de preservação de valores culturais e artísticos, da nossa identidade regional, dos nossos costumes;.

Para Callegaro é natural que cidadãos de cada estado brasileiro sintam orgulho de suas tradições e desejem mostrá-las para o resto do País. ;Eu recebi cariocas há pouco, pessoas que ficaram encantadas. Elas vêm pra cá em setembro para participar das atividades comemorativas, e os amigos gaúchos daqui vão ao Rio em fevereiro para aproveitar o carnaval de lá. Há uma troca de culturas;, concluiu.