Jornal Correio Braziliense

Brasil

Comissões da verdade ouvem no Rio militares perseguidos na ditadura

Segundo o consultor da Comissão Nacional da Verdade Paulo, os membros das Forças Armadas foram o grupo mais afetado

Rio de Janeiro ; As comissões Nacional e Estadual da Verdade do Rio de Janeiro ouviram nesta segunda-feira (12/8) dois militares que sofreram perseguição política e tortura na ditadura militar (1964-1985) por causa das preferências políticas ou discordâncias em relação a crimes cometidos pelo regime. Segundo o consultor da Comissão Nacional da Verdade Paulo, Ribeiro da Cunha, do Grupo de Trabalho Militares Perseguidos, os membros das Forças Armadas foram o grupo mais afetado.

"Um dos aspectos nefastos do pós-64 é associar todos os militares à ditadura, o que não é verdade. Muitos lutaram pela democracia. É um aspecto que precisa ser resgatado para as novas gerações, inclusive para as novas gerações de militares, para que tenham orgulho desses militares e os identifiquem como parte da construção do Estado democrático", disse o pesquisador, que estima que cerca de 7,5 mil militares tenham sofrido algum tipo de perseguição nos primeiros anos depois do golpe.



Com um mapa da Base Aérea do Galeão, Bezerra apontou os prédios para onde eram levados os prisioneiros. Segundo ele, soldados não podiam se aproximar nem da calçada desses locais, e tinham ordens para liberar, sem fazer perguntas, a entrada de dois veículos que eram usados para levar soldados ao interior da base, um opala cinza e outro bege. Carros de outras forças e da polícia também deixavam detidos, movimento que chegou a ser de três entradas por dia. "Os prisioneiros eram levados na mala, dentro de sacos, ou encapuzados. Não sabíamos se eram homens ou mulheres".

Proibido de pedir baixa, ele contou que era vigiado na rua e impedido de obter promoções, porque havia ficado marcado como subversivo. Hoje, o advogado relatou que tinha seus armários frequentemente revistados, tinha que fazer a ronda sem munição e chegou a ter os pertences vasculhados em casa por um homem do serviço secreto, que enganou sua família disfarçando-se de amigo da faculdade. "Os militares foram as primeiras vítimas do golpe e dos tiranos. Em 1964, eles já sabiam quem era a favor e quem era contra, e fizeram uma vigilância constante. Muitos foram presos e assassinados".



O segundo a depor, o soldado Belmiro Demétrio, foi expulso da Aeronáutica por se declarar brizolista. Depois de dizer aos militares em uma partida de futebol que admirava Leonel Brizola, que até então havia governado o Rio Grande do Sul, onde ele servia, na Base Aérea de Canoas, Demétrio chegou a ser preso e ameaçado de morte.

"Falei que Brizola era o homem que podia alavancar a nação brasileira e passei a ser observado como inimigo", conta ele, que foi preso e teve a baioneta do fuzil apontada contra seu peito enquanto estava deitado no chão. "Atiraram e a bala bateu a uns 30 centímetros da minha cabeça. Quando me tiraram da cadeia, me colocaram para fazer serviço de sentinela. Eu tinha que tirar guarda sem munição e era sempre o último a ser rendido. Diziam que eu recebia maus tratos porque era subversivo. Chegaram a me dizer: ;é melhor você morrer, porque você descansa e a gente se livra logo de você;".

Mais depoimentos estão sendo colhidos nesta tarde, com filhos de militares perseguidos. Amanhã (13), as comissões farão novas sessões durante a manhã e a tarde. Os relatos podem ser acompanhados ao vivo pela internet.