Parentes e amigos de desaparecidos políticos da ditadura militar deram depoimentos nesta quinta-feira (28/2) à Comissão da Verdade do estado de São Paulo. Entre eles, a neta de David Capistrano, um dos dirigentes do Partido Comunista Brasileiro (PCB). A jornalista Cecília Capistrano fez um relato emocionado do sofrimento da família com o desaparecimento do avô.
Ela disse que após ter passado a atuar na clandestinidade e se mudado, em 1972, para a Checoslováquia, David decidiu retornar para o Brasil, em 1974. ;Todos pediam para que David não voltasse, sabiam que algo de ruim estava para acontecer;, disse Cecília.
Segundo os registros da Comissão da Verdade, David desapareceu em 1974, ao longo do percurso entre as cidades de Uruguaiana (RS) e São Paulo, quando viajava de carro para reencontrar a família. ;O relato que eu queria dar é desse sofrimento que vai passando de geração em geração;, dclarou.
A família de Elson Costa, outro militante do PCB que sumiu durante a ditadura, pediu à Comissão a mudança no atestado de óbito. Ela quer que o documento no qual consta Elson como ;desaparecido;, passe a constar ;assassinado por tortura;.
De acordo com José Miguel Soares Winsk, sobrinho de Elson Costa, seu tio foi torturado durante 20 dias, além de ter recebido uma injeção com líquido para matar cavalos. O corpo teria sido jogado em um rio na cidade de Avaré, interior de São Paulo. ;Segundo depoimentos extraoficiais, ele foi levado para uma chácara em Itapevi, onde funcionava um centro de tortura;, disse.
Elson desapareceu em janeiro de 1975, segundo testemunhas, após ter sido preso em um bar ao lado de sua casa em São Paulo, enquanto tomava café da manhã. ;A família o procurou das mais diferentes maneiras, escrevendo cartas ao Ministério da Justiça. A viúva escreveu ao presidente da República;, disse Winsk.
Genivaldo Medeiros da Silva, amigo do desaparecido José Montenegro de Lima, relatou que esteve preso e recebeu tortura no DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna) por cerca de 20 dias.
Ele disse que foi preso pela polícia dez dias depois do desaparecimento de José Montenegro. O amigo estava sumido desde 29 de setembro de 1975. Genivaldo relatou à comissão que, quando chegou ao DOI-Codi, os torturadores diziam que Montenegro estava morto ;e que se eu não colaborasse ia morrer também;.
Outra amiga de Montenegro, a médica Albertina Duarte, trabalhava no Hospital das Clínicas de São Paulo no período em que ele desapareceu. Segundo ela, o amigo atuava como um facilitador entre os militantes, articulando a ida de muitos deles ao centro médico. ;Ele montava estratégias de atendimento;, disse.
Como os integrantes do PCB viviam na clandestinidade, muitos dos tratamentos médicos e cirurgias de que precisavam eram feitos de modo precário. A própria Albertina era quem fazia as intervenções. A médica disse que não podia nem mesmo contar com estoques de sangue durante as operações.
Albertina relatou, em um depoimento emocionado, que chegou a esconder muitos dos seus pacientes militantes no banheiro do hospital, para que não fossem reconhecidos. Em certo momento, começou a reparar que fichas médicas passaram a desaparecer do seu consultório. Em 1968, no município de Sorocaba, ela também foi presa durante sete dias.