Brasília - A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) de Tráfico de Pessoas da Câmara dos Deputados deu continuidade hoje (6) à investigação do caso de duas modelos brasileiras enviadas à Índia em 2010, onde teriam sido vítimas de cárcere privado e assédio sexual. A responsável pelo recrutamento e envio das jovens, a scouter Raquel Felipe, negou, em depoimento à CPI, o conhecimento e participação em qualquer irregularidade durante os dois meses de permanência de Ludmila e Luana Verri naquele país.
Em 2010, o pai das modelos, Damião Verri, entrou em contato com o consulado brasileiro na Índia para trazer as filhas de volta ao Brasil. Uma delas estava doente e não conseguia trabalhar. Segundo o pai das garotas, a scouter teria quebrado o contrato firmado e não se comprometido com o retorno das modelos. Em audiência anterior da própria CPI, as modelos disseram morar em um apartamento em condições precárias, sem água para beber ou tomar banho. Elas ainda relataram conhecerem outras modelos no país que recorreram à prostituição para quitar dívidas com agenciadores e poder voltar ao Brasil.
Raquel alega que a volta da irmãs teria sido motivada por ciúme, pois uma delas teria tido mais aceitação no mercado indiano, enquanto a outra não conseguiu trabalhar. De acordo com a scouter, também houve quebra de contrato por parte das modelos, que não tinham noções de inglês - exigência para as que são levadas ao exterior. Raquel disse que tomou todas as providências possíveis para o retorno das modelos ao Brasil, mas que não remarcou as passagens de volta, pois a troca de datas só poderia ser feita pelas titulares, que não a fizeram.
Devido à discordância das versões apresentadas pelas modelos e pela scouter na CPI, está em estudo a possibilidade de acareação. O deputado Arnaldo Jordy (PPS-PA), presidente da comissão, informou que o órgão irá incluir na investigação o depoimento de Raquel Felipe à Polícia Federal.
Outro ponto sob investigação e se a scouter tinha conhecimento dos antecedentes do agenciador indiano Vivek Singh, da K-Models Management, responsável pelas modelos na Índia. Raquel informou não saber de qualquer antecedente criminal de Singh, que foi acusado por Ludmila Verri, em audiência anterior da CPI, de ser alcoólatra e de ter tentado abusar sexualmente dela e da irmã.
Raquel informou que falava diariamente com o agenciador indiano por telefone e que nunca notou sinais de embriaguez. De acordo com o presidente da CPI, o agenciador tem extensa lista de antecedentes criminais e que o desconhecimento desse fato pela scouter é negligência.
De acordo Jordy, quando a polícia indiana e os representantes do consulado brasileiro na Índia chegaram ao apartamento das modelos em Mumbai, Ludmila havia sofrido uma entorse no joelho semanas antes. Segundo ela, a entorse aconteceu quando tentou escapar de Singh, que estava bêbado. Raquel Felipe disse não saber sobre aliciamentos por parte de Singh e que o acidente ocorreu devido à um susto que as modelos tomaram quando o agenciador entrou inadvertidamente no apartamento onde moravam, enquanto se depilavam na sala de estar.
Em maio, o Ministério Público Federal (MPF) conseguiu liminar judicial impedindo duas agências de modelo - uma delas a Raquel Management, de Raquel Felipe - de recrutar e enviar modelos do Brasil ao exterior, sob a pena de multa de R$ 100 mil por cada pessoa levada ao exterior irregularmente.
A Justiça ainda determinou o reembolso de cerca de R$ 2,1 mil aos cofres da União pelos gastos com o resgate e o transporte de Mumbai, na Índia, ao Brasil das duas modelos na época com 19 e 15 anos. De acordo com o MPF, não há dúvidas de que, no caso das irmãs Verri, houve tráfico de pessoas. Na CPI, ainda está sendo analisada a existência de trabalho análogo ao escravo e o estímulo à prostituição por meio da contração de dívidas.
A comissão estuda implementar medida conjunta da Polícia Federal e dos ministérios das Relações Exteriores (MRE) e do Turismo (MTur) para o cadastramento de empresas que enviam modelos ao exterior.