Brasília ; Localizado a menos de 20 quilômetros de São Paulo, o município de São Bernardo do Campo sustenta há três anos uma política de tratamento antidrogas completamente oposta à adotada na capital paulista.
Apontada como modelo ideal por psicólogos e instituições ligadas aos direitos humanos, a terceira maior cidade da região metropolitana e quarto maior município do estado definiu como diretrizes do tratamento a liberdade, os vínculos comunitários e a individualidade de crianças e adolescentes como prioridades da política assistencial antidrogas.
;A internação é fundamental mas, sempre que possível, deve ocorrer em aberto. O que aprendemos é que não há fórmula única para todo mundo. Nossos técnicos usam a expressão ;tem muito menino para além da droga;;, explicou Lumena Furtado, secretária adjunta de Saúde de São Bernardo do Campo.
Segundo ela, as terapias adotadas mostraram a necessidade de manutenção dos vínculos para que essas crianças consigam refazer suas vidas. ;Tínhamos o cuidado centrado em hospitais psiquiátricos até 2008. Em 2009, remodelamos;.
A estratégia adotada em São Bernardo, que ainda não tem levantamentos oficiais sobre os resultados, ocorre em quatro tipos de estrutura. Entre elas estão os centros de Apoio Psicossocial Álcool e Drogas (Caps), que têm unidades separadas para adultos e para crianças e adolescentes. No caso dos Caps juvenis, 100 funcionários são responsáveis pelo atendimento aos usuários.
;São serviços que funcionam 24 horas, fundamentais para que em qualquer hora de crise esses jovens possam ser atendidos", disse Lumena. ;Outro dia, um adolescente me contou que foi para casa e passou por uma confusão no bairro. Ele disse que tinha duas opções: sumir de novo na ;boca; ou ir para o Caps;. A secretária contou que o adolescente pediu dinheiro à mãe para pagar o ônibus até o centro, onde ficou por cinco dias e voltou para casa.
São Bernardo do Campo tem 780 mil habitantes. Desse total, 517 pessoas estão em situação de rua. Além dos Caps, o município montou 56 pontos de atendimento, denominados Consultórios de Rua, articulados com a rede de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS), com profissionais da saúde mental, da saúde básica e pelo menos um assistente social. Nesses espaços são realizadas atividades e intervenções psicossociais e educativas na rua, e a equipe conta com insumos para tratamento de situações clínicas comuns, material para curativos, medicamentos e preservativos.
Lumena ainda destaca que existem as repúblicas terapêuticas, que o Ministério da Saúde define como unidades de acolhimento provisório. ;É uma residência provisória para os jovens que moram na rua ou que têm dificuldades com a família. A partir do atendimento no Caps, essa pessoa é convidada a morar de quatro a seis meses na república;, explicou.
Segundo a secretária, crianças e adolescentes, durante o período de residência, são estimuladas a retomar os estudos e a visitar museus e cinemas. ;Muitos afirmam que foi a primeira experiência em uma sala de cinema;, disse Lumena, acrescentando que ;essas moradias têm ajudado a reocupar a cidade e a reorganizar as famílias. As mães são convidadas a visitar. No inicio resistem, mas depois vão e levam um bolo;.
Pedro Paulo Bicalho, coordenador da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia (CFP), considera a política de São Bernardo um exemplo. ;São políticas que devem ser olhadas, copiadas e servir como modelo para o país;.