Na véspera da implantação da Lei de Acesso à Informação nos órgãos públicos, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso, está preocupado com o livre acesso a processos que tramitam na Corte. Ele deixa a presidência em abril e um de seus últimos atos foi encaminhar uma nota técnica com ideias e rotinas para ser apreciada pelos ministros.
Um dos assuntos abordados no documento é a adoção de regras para a omissão total de inquéritos, os chamados ;processos ocultos;. Essa é uma categoria ainda mais restritiva que a do segredo de Justiça, pois o processo deixa de existir para o público externo e fica disponível apenas para um grupo de 236 funcionários do STF. Atualmente, essa classificação é adotada em processos de extradição e a critério dos relatores nos demais processos criminais.
;Há casos, todos sabemos, em que a divulgação do andamento do processo criminal ou de informações sobre diligências não cumpridas atenta contra a segurança da sociedade e do Estado. Para essas hipóteses, não deve haver, ao menos inicialmente, acesso externo. Processos e diligências devem permanecer sob sigilo;, defende Peluso.
Outro tema discutido é o uso de iniciais para identificar partes em inquéritos, inovação implantada por Peluso em março do ano passado. Atualmente, são os relatores que decidem se mantém as iniciais ou se abrem o nome completo dos envolvidos. A ideia de Peluso é que todos os ministros ratifiquem sua ideia, uniformizando o padrão do Tribunal.
O presidente também adotou em sua gestão a prática de eliminar dos arquivos do STF qualquer referência em inquéritos e ações penais quando a pessoa for inocentada ou tiver cumprido a pena. Ele acredita que a medida é justa porque, além de facilitar a ressocialização, essas informações deixam de constar em certidões criminais emitidas pela Justiça.
Ao todo, Peluso acredita que 13 situações permitem a eliminação de qualquer rastro sobre a parte, nove a mais do que determina o Conselho Nacional de Justiça. Ele acredita que a limitação da informação evitaria que ;pesquisas processuais nos sítios eletrônicos dos tribunais sirvam a fins inadequados, motivados por mera curiosidade;. Mas uma vez, o objetivo é que os ministros validem a iniciativa.
Em reunião administrativa na quarta-feira (28/3), o ministro Marco Aurélio Mello disse que as ideias de Peluso vão contra o princípio constitucional da publicidade e transparência. ;Não cabe ao Poder Judiciário definir o regime de publicidade dos processos que nele tramitam sob pena de incidir em arbítrio;, disse. Ele foi apoiado pelo ministro Carlos Ayres Britto, futuro presidente do STF.
Marco Aurélio também criticou outra inovação da gestão de Peluso: a exigência de certificado de identificação digital para que o público tenha acesso à maioria dos processos, mesmo que eles não estejam sob segredo de Justiça. O cartão de identificação custa cerca de R$ 110, e o ministro acredita que a limitação econômica daqueles que não tem dinheiro para adquiri-lo é um filtro desnecessário.
Por outro lado, a restrição de informações foi defendida pelos ministros Antonio Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski. ;Todos somos favoráveis à transparência e à publicidade, mas quando se trata de principios constitucionais, se tem que fazer uma ponderação de valores, como a dignidade da pessoa humana. A publicidade não pode ser um princípio absoluto;, disse Lewandowski. Devido à polêmica, o ministro Luiz Fux decidiu pedir vista para analisar melhor as propostas de Peluso.