Jornal Correio Braziliense

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Reforma na legislação vai incorporar o princípio da insignificância

Uma moça de 30 e poucos anos que furtou pacotes de chiclete em Belo Horizonte, no valor de R$ 98, foi presa e julgada culpada. Rigor bem diferente pesou sobre um homem que sonegou impostos no valor de R$ 3.607. A Justiça entendeu que não houve crime, extinguindo o processo. Ambos os casos estão relacionados em uma pesquisa da Universidade de São Paulo (USP) que analisou todas as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), de 2005 a 2009, em que, para anular a ação, a defesa invocou o princípio da insignificância ; mecanismo que está prestes a ser incorporado ao Código Penal. O estudo minucioso dos 75 acórdãos mostra que o martelo da última instância judicial do país é mais pesado com quem surrupiou objetos de valor reduzido, condenados em 47,8% das ações. Nessa relação, estão pessoas que tentaram subtrair celular de R$ 35 ou mesmo R$ 5 em espécie. Em contrapartida, apenas 27,6% daqueles que fraudaram o sistema financeiro e a administração pública em até R$ 5 mil foram responsabilizados.

As conclusões do estudo corroboram a impressão da sociedade de que o Judiciário é mais tolerante com sonegadores de impostos e pessoas que se apossaram de dinheiro público. Mas derruba o mito de que quem rouba alimentos, casos que costumam ganhar mais repercussão, acaba condenado pela Suprema Corte. Na verdade, em 83% das ações em que o objeto do furto havia sido gênero alimentício, os ministros do STF reconheceram a insignificância do fato, determinando que não havia ocorrido crime. Embora aparentemente positivo, o dado também demonstra que ações do tipo precisam chegar à instância máxima do Judiciário para haver uma decisão alinhada com a Constituição. Em diversos casos, o réu, quase sempre pobre e muitas vezes sem prestação jurídica adequada, aguarda preso por um veredito justo.