Com o slogan Crack, é Possível Vencer, o programa de combate à droga lançado na quarta-feira (7) pela presidente Dilma Rousseff prevê um investimento de R$ 4 bilhões em três eixos: prevenção, tratamento e repressão. Repete promessas não cumpridas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, feitas em meados de 2010, como a ampliação dos Centros de Atenção Psicossocial (Caps), e inova em outros itens, a exemplo da inclusão das comunidades terapêuticas na rede de atendimento. Na área da segurança, a instalação de câmeras e o policiamento nas cracolândias foram medidas apresentadas pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que também anunciou concursos, sem data prevista, para a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal. Ao fim do discurso, o ministro transmitiu o sentimento comum entre a maior parte das autoridades e da plateia diante do plano ambicioso: ;Que Deus nos ajude a executá-lo;.
Uma das estratégias será investir nos consultórios de rua, que abordarão dependentes nas cracolândias, incentivando-os a buscar tratamento. A meta é chegar a 308 unidades até 2014, com investimento de R$ 150 milhões. Elas contarão com médico, psiquiatra, enfermeiros e agentes redutores de danos. Hoje, menos de 100 funcionam no país. Outra frente será a ampliação dos Caps especializados em álcool e drogas que funcionam 24 horas ; dos três atuais para 175 em três anos. O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, se comprometeu ainda a abrir 2.462 leitos em enfermarias especializadas, passando a diária de R$ 57 para R$ 200.
Em parceria com entidades sem fins lucrativos, o governo pretende abrir 574 unidades de acolhimento para adultos e crianças, que custarão cerca de R$ 400 milhões. Por meio de apresentação de projetos, financiará as comunidades terapêuticas, instituições que hoje já trabalham com usuários de drogas de forma assistencial, geralmente ligadas a igrejas.
;É preciso separar o joio do trigo. Só trabalharemos com instituições que zelem pelos direitos humanos e pela dignidade humana;, disse o ministro Alexandre Padilha, ao ser questionado sobre denúncias de torturas e abusos praticados dentro de comunidades terapêuticas. Em tom emocionado, a presidente Dilma dirigiu suas palavras aos pais de dependentes químicos. ;São eles que sofrem a dor e a angústia de ver o filho escravizado pela droga. Quero dizer a eles que nós todos, União, estados, municípios, sociedade civil, temos de fazer da dor deles a nossa dor;, disse a presidente. Dilma também afirmou estar segura da viabilidade do plano. ;Esse país que conseguiu tudo isso, ele também vai ter uma política ampla, moderna, corajosa e criativa de enfrentamento às drogas.;
Orçamento
Para especialistas, a rede integrada de atendimento apresentada pelo governo federal é excelente. O problema, aponta Carlos Salgado, membro da Associação Brasileira de Estudos sobre Álcool e Drogas, é saber se todo o orçamento será disponibilizado de fato. ;Será algo bem importante se for executado. Destinar alguns milhares de reais para enfermarias especializadas muda tudo, é algo surpreendente. Mas, diante de tantos outros planos, vamos aguardar;, afirma. O psiquiatra Salomão Rodrigues, diretor da Associação Brasileira de Psiquiatria, também vê com bons olhos as ações anunciadas, mas chama a atenção para a demora nos resultados. ;Não é algo que mediremos em pouco tempo. É uma política a médio e longo prazo, mas que precisa ser iniciada;, diz o especialista.
A presidente Dilma enviou ontem dois projetos de lei ao Congresso como parte do plano de combate às drogas. Um institui o Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública, Prisionais e sobre Drogas (Sinesp). Os estados que não alimentarem o sistema ficarão impedidos de receber recursos federais da área da segurança pública. A outra proposta altera o Código de Processo Penal e a Lei de Drogas para agilizar o processo de alienação dos bens que são produto do tráfico. Também determina um ritmo mais apressado na permissão para incinerar a droga, depois de feitos os exames laboratoriais necessários para atestar sua natureza.
Apuração
Ontem, a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos abriu um procedimento de apuração coletiva de violação de direitos humanos contra parte das 68 comunidades terapêuticas inspecionadas pelo Conselho Federal de Psicologia em setembro deste ano. A ausência de profissionais de saúde e os abusos cometidos dentro de algumas instituições, segundo apontou o relatório, levaram o ouvidor Domingos Sávio Dresch da Silveira a instaurar o procedimento. Ele pede explicações ao Ministério da Saúde e aciona o procurador-geral da República. O órgão é ligado à Secretaria de Direitos Humanos.