Despachos internos e uma viagem cancelada. O ministro da Educação, Fernando Haddad, preferiu passar os últimos dois dias dando poucas explicações sobre o novo vazamento no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que, pelo terceiro ano consecutivo, apresenta falhas em sua organização. Apesar de algumas mudanças na agenda como ministro, ele confirmou presença no penúltimo fim de semana dos encontros entre os pré-candidatos à prefeitura de São Paulo nas caravanas zonais, organizado pelo Diretório Municipal do PT. Mas o futuro como pré-candidato à prefeitura e a permanência na pasta passam por um teste de fogo. Dentro do Palácio do Planalto, a avaliação é de que, caso o problema do Enem tome proporções nacionais, Haddad poderá ter que repensar a carreira política.
O entendimento palaciano é de que, por enquanto, o ministro da Educação está blindado no episódio do Enem, já que o caso ainda está restrito ao Ceará, distante do eixo Rio-São Paulo. Mas a crônica do vazamento no exame vem ganhando fôlego. O Ministério Público Federal (MPF) no Ceará entrou ontem com pedido para anular a prova em todo o país. E a Defensoria Pública da União (DPU) vai recomendar hoje ao Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) a anulação das questões vazadas para todos os estudantes ou a anulação do exame.
O instituto responsável pelo exame, que custou R$ 238,5 milhões, deve receber a notificação do MPF no Ceará dentro de alguns dias. ;O Inep quer corrigir uma violação de igualdade com uma discriminação odiosa, apontando os alunos do colégio em Fortaleza como os únicos responsáveis. Não podemos dizer que foram só esses candidatos que tiveram conhecimento antecipado da prova. Os efeitos são nacionais;, ponderou Oscar Costa Filho, procurador da República no Ceará.
No caso da recomendação da DPU, o instituto terá um prazo de 10 dias para acatar as ações. Segundo o titular do Ofício de Direitos Humanos e Tutela Coletiva, o defensor público federal Ricardo Salviano, a medida adotada pelo Ministério da Educação (MEC) ; de limitar a anulação da prova aos estudantes do Colégio Christus ; é injusta.
;O concurso é nacional e tem efeitos nacionais. Sempre que acontece algum problema, o MEC quer tratar de forma individualizada. Mas, a partir do momento em que o Enem deixou de ser apenas uma avaliação para ser também um processo seletivo, deve respeitar os processos de isonomia;, afirma Salviano. O defensor deverá entrar com ação na Justiça Federal contra o Inep caso a recomendação não seja seguida.
Prejulgamento
A pressão pelo tratamento nacional à polêmica envolvendo o Enem deste ano vem também da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A Comissão de Educação e Cidadania da seccional do Ceará afirmou ontem que o cancelamento das provas dos alunos do Christus se configurou como um prejulgamento, pois foi feito em pouco tempo. ;O MEC tentou arranjar um bode expiatório para não assumir que, pelo terceiro ano consecutivo, houve alguma fraude. Trataram os alunos do Christus de forma diferenciada;, afirmou o presidente da comissão da OAB-CE, Edmir Pereira Martins.
Na única entrevista que o ministro concedeu até o momento, Haddad disse ter convicção de que os cadernos do pré-teste, aplicado no Colégio Christus, foram reproduzidos e distribuídos aos alunos por funcionários da escola. ;A busca por isonomia é o pilar do Enem, ele tem que garantir isso. Seja quando o aluno é prejudicado por uma ação a qual ele não deu causa, seja quando ele é favorecido por uma ação que ele não deu causa. Não se trata de punição, mas de busca de igualdade de condições;, argumentou.
Os 639 alunos da escola particular de Fortaleza poderão refazer o Enem em 28 e 29 de novembro, quando a população carcerária também será submetida ao exame. Um dia antes, ocorrerá o primeiro turno das prévias do PT para a prefeitura de São Paulo. Até o momento, além de Haddad, Marta Suplicy, Eduardo Suplicy, Jilmar Tatto e Carlos Zaratini anunciaram que farão parte da sondagem.