São Paulo - Quinta-feira, às 16h40, é hora da aula de ensino religioso em uma das quatro turmas do 9; ano da Escola Estadual Doutor Alberto Cardoso de Mello Neto, na região norte da capital paulista. A escola é uma das poucas do estado que oferecem a disciplina aos seus alunos do último ano do ensino fundamental.
A professora Miriam de Oliveira é a responsável pela aula. Historiadora e psicóloga, ela trabalha no colégio há oito anos. Há três, dá aulas do que prefere chamar de ;história das religiões;. Na primeira quinta-feira do mês de agosto (4), Miriam falou para cerca de 30 alunos sobre o cristianismo. ;Por volta do ano 300, o Império Romano adotou o cristianismo como sua religião oficial;, explicou aos alunos. ;A partir daí, a religião se espalhou por outros cantos do mundo e acabou chegando ao Brasil, com os jesuítas. Hoje, quase todo mundo é cristão aqui no nosso país.;
O foco na história foi a solução encontrada por São Paulo para que as lições de ensino religioso constassem dos currículos da rede pública sem privilegiar qualquer crença, conforme determina a Constituição Federal. Apesar de só os alunos do 9o ano terem aulas específicas sobre religião ; isso quando há demanda dos pais ;, todas as escolas estaduais trabalham o conteúdo de forma transversal, em outras disciplinas. De acordo com a Secretaria Estadual de Educação, prevalece o aspecto histórico.
Uma lei estadual e uma resolução do Conselho Estadual de Educação de 2001 normatizaram o ensino religioso no estado. Elas garantiram o espaço para a disciplina nas escolas estaduais, mas também estabeleceram exigências na formação dos professores responsáveis pelas aulas e prioridade para a correlação do ensino sobre religião com a educação regular.
;Foi bom [criar regras];, disse a presidenta do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), Maria Izabel Noronha, que defendeu a adoção do modelo em reuniões com representantes do governo. ;Sou favorável ao fortalecimento da formação humana, com conteúdo sobre história da religião, para que o aluno compreenda as diferenças entre as crenças;, justifica.
Essa fórmula, porém, não é unanimidade entre os educadores. Na opinião da coordenadora do programa de pós-graduação da Universidade Metodista e professora da Universidade de São Paulo (USP), Roseli Fischmann, o ensino religioso transversal delega responsabilidade demais aos docentes e expõe os alunos da rede pública a possíveis transgressões à Constituição. ;A Constituição diz que o Estado não pode defender nem discriminar crença nenhuma. Contudo, o professor, que representa o Estado na escola, é um ser humano;, pondera Roseli. ;O ser humano tende, naturalmente, a defender sua crença.;
Para ela, o ensino religioso é um ;risco que poderia ser evitado;. A professora acredita que os conceitos sobre diversidade e respeito, que são abordados nas aulas, poderiam ser repassados aos alunos em outras disciplinas que não a específica de religião.
Cecília Regina Bigatão, diretora da Escola Doutor Alberto Cardoso, discorda. Há mais de 20 anos à frente da escola, ela diz que é perceptível a diferença no comportamento dos alunos que já passaram pelas aulas de ensino religioso. ;O que é a amizade, amor, está mais claro para eles.;
A diretora reconhece que é preciso ter atenção redobrada com o ensino religioso para que todas as crenças sejam respeitadas. Ela garante que esses cuidados são tomados na escola que dirige e, por isso, os resultados são muitos bons. ;Nunca tivemos uma reclamação de um pai sobre o conteúdo das aulas;, conta. ;Não impomos nada às crianças. Todas são livres para ter sua religião;. Na antessala da diretoria, há um altar. Em cima dele, fica uma Bíblia aberta.