Rio de Janeiro ; A aposentadoria prevista para o fim deste ano está suspensa e o diretor da Escola Municipal Tasso da Silveira, Luiz Marduk, de 55 anos, assume agora um dos desafios mais importantes de sua vida: evitar o êxodo dos alunos aterrorizados pelo massacre na escola de Realengo, Zona Oeste do Rio. Pai de um menino de 12 anos que também estava no colégio, Luiz diz encontrar forças no carinho que recebe da comunidade. Ontem, o diretor recolheu cada mochila colorida e caderno rabiscado largados nas salas no momento de desespero que tomou conta do colégio na última quinta-feira. Depois, Marduk participou novamente de um novo abraço na instituição de ensino.
Antes de a unidade reabrir as portas para receber seus estudantes, Luiz Marduk repaginará o ambiente que se tornou frio e apavorante. Os muros da escola ganharão um cimento liso para que os alunos possam pintar mensagens de saudade, paz e otimismo. No lado de dentro, as paredes também vão ganhar cores vivas e alegres. As carteiras das crianças serão trocadas.
;Vamos viver a dor até ela acabar e vamos vencer a dor. O grande desafio vai ser afastar o fantasma do medo que fatalmente essas crianças terão, mesmo que sejam transferidas para outra escola. Mas nós vamos convencê-las de que não conseguiremos nos reerguer sem elas. Uma escola só existe se tiver seus alunos e nossa intenção é montar aqui um quartel-general, uma base de esperança;, afirma o professor, com voz calma e segura.
Cada criança receberá tratamento psicológico em casa. Algumas famílias, segundo ele, nem desejam conversar sobre o assunto tamanho o trauma. ;Vamos precisar modificar o ambiente escolar, para diminuir as recordações. Quando a escola reabrir, ela não estará só limpa de sangue, vai estar alegre de novo.;
Há 32 anos na mesma escola, o professor conta que as cenas de horror não saem da sua cabeça. Seu filho, aluno do 7; ano, estava no segundo andar e precisou correr para o terceiro, onde se refugiou com colegas no auditório. O menino estava apavorado e até levou bronca da professora, porque queria sair da sala e procurar pelo pai. O diretor da escola lembra que a maior preocupação era tirar as crianças do prédio enfrentando um ;momento de terror e tristeza;, sobretudo quando teve de passar pelo corpo do atirador e dos alunos baleados.
;Naquele dia, eu cheguei em casa bem tarde e não conseguia dormir. A última vez que olhei o relógio eram 2h30 e antes das 5h eu já estava de pé. Quando me olhei no espelho, me deparei com a realidade. Chorei, chorei, chorei, a ponto de a minha mulher levantar assustada. Fui para debaixo do chuveiro e continuei chorando. Mas respirei fundo e pensei: ;sou o líder daquela comunidade e não posso esmorecer;;, diz Marduk.
Segurança
Luiz não conheceu Wellington Menezes de Oliveira porque ficou afastado da escola, em outro projeto, entre 1986 e 2005, justamente no período em que o atirador passou por lá. Ele afirma que o massacre não aconteceu por falta de segurança do colégio, mas sabe que o crime bárbaro vai trazer discussões importantes.
;Somos preocupados com a segurança, temos portão eletrônico, câmeras nos corredores. Não foi um relaxamento nosso, mas, claro, isso nos fará discutir questõe,s como segurança e bullying. A escola, de uma maneira geral, precisa ser melhor estruturada. Ter um setor de psicologia para detectar e encaminhar casos especiais, no sentido de minimizar esses efeitos que possam ser influenciados pelo bullying. O que aconteceu com a nossa escola marcará uma era de paz e melhorias para todas as outras unidades;, afirma.
O dirigente escolar conta da missão de conversar à exaustão com o filho e garante que ele voltará para a Tasso da Silveira como exemplo do esforço dos estudantes. E só se emociona quando encerra a entrevista: ;Só saio daqui quando conseguir devolver a todos os alunos o orgulho de estudar na nossa escola;.