O pedido de habeas corpus para o goleiro Bruno Fernandes das Dores de Souza, acusado de sequestrar e assassinar a ex-amante Eliza Samudio, que tentava provar na Justiça a paternidade do filho, traz à tona a polêmica do tratamento que deve receber um preso suspeito de cometer crime hediondo. Criminalistas evitam comentar as chances de o goleiro responder às acusações em liberdade, mas criticam o tempo de prisão do acusado, que está há oito meses numa cela em galeria especial na Penitenciária Nelson Hungria, em Contagem, na Grande BH. Por outro lado, o promotor de Justiça Francisco Santiago, que se dedicou a mais de mil júris, tem uma avaliação contrária. Para ele, qualquer um que comete um crime bárbaro deve aguardar o julgamento detido, independentemente do tempo. A perspectiva é de que o julgamento ocorra neste ano.
;Sou rigoroso e inteiramente contra a ideia de colocar um acusado de crime hediondo para responder em liberdade. Ao segregar um homem, precisamos avaliar o tipo de crime e não se ele é réu primário ou se tem bom comportamento. O goleiro Bruno é acusado de um crime brutal, bárbaro, covarde e a juíza viu motivos para mantê-lo preso. Ele foi denunciado e vai a júri popular, é o que ele deve aguardar;, defende o promotor, que atua nos casos do Bando da Degola, em que dois empresários foram assassinados por um grupo de estelionatários, e da morte do torcedor cruzeirense morto em espancamento por integrantes da Galoucura. Nestes dois processos há acusados em liberdade.
;A gente luta para manter os acusados presos. Espero que a Justiça negue o habeas corpus, porque o crime foi grave no dia, é grave hoje e vai ser grave sempre. Assim como fui favorável à prisão dos torcedores da Galoucura na morte do estudante e do Bando da Degola, penso que Bruno deve ficar preso;, argumenta.
Hoje, desembargadores da 4; Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais devem julgar o pedido de habeas corpus do ex-craque do Flamengo. O advogado de defesa, Cláudio Dalledone Junior, vai tentar convencer os magistrados de que o goleiro preenche requisitos para aguardar o julgamento em liberdade.
Críticas
Conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/MG) e docente da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), Leonardo Bandeira destaca três argumentos para analisar necessidade da prisão: garantia da ordem pública, conveniência ao processo durante fase de produção de provas e depoimento de testemunhas e aplicação da lei.
;Para a juíza do caso, a prisão é necessária e não conheço seus argumentos porque não tive acesso aos autos. Mas a prisão já se prolongou por tempo mais que razoável. Em tese, isso caminha para punição antecipada, no mínimo, um constrangimento ao acusado pela demora no julgamento;, considera. ;Ele ainda não foi julgado definitivamente e não pode ser responsabilizado pelo suposto ato.;
Para o professor de direito processual da PUC Minas Leonardo Marinho, a gravidade do crime e o clamor público são argumentos considerados vazios pelo Supremo Tribunal Federal (STF). ;O que me incomoda profundamente é o tempo que ele está preso, à espera de julgamento. Não conheço o processo nem os fundamentos para mantê-lo preso e, por isso, não posso opinar sobre a necessidade da prisão, mas a Justiça não pode permitir que a prisão processual se transforme em antecipação da pena. Clamor público e a gravidade não causam prejuízos ao processo em si e são argumentos abstratos para o STF;, afirma o criminalista.
No domingo, o Estado de Minas revelou a rotina do goleiro na prisão, indicando regalias na cela, como a permissão de dividi-la com o amigo Luiz Henrique Romão, o Macarrão, e o direito a banho quente.
Para entender
De acordo com o inquérito, Eliza e o bebê, suposto filho do goleiro, foram sequestrados por Luiz Henrique Romão e Sérgio Rosa Sales, primo de Bruno, no Rio de Janeiro, e trazidos para o sítio do atleta, em Esmeraldas, na Grande BH, em 4 de junho. A vítima teria sido mantida em cárcere privado até o dia 10, quando teria sido morta fora dali. O ex-policial Marcos Aparecido dos Santos, o Bola, é apontado como o executor. A criança foi entregue à ex-mulher, Dayanne de Souza. Bruno, Macarrão e Sérgio respondem por sequestro e cárcere privado (pena de 1 a 3 anos), homicídio qualificado ( 12 a 30 anos) e ocultação de cadáver (1 a 3 anos). Bola é acusado de homicídio qualificado e ocultação de cadáver. Em liberdade, Fernanda Gomes de Castro responde por sequestro e cárcere privado de Eliza e do bebê. Dayanne, Wemerson Marques de Souza e o caseiro do sítio, Elenilson Vitor da Silva, são acusados de sequestro e cárcere privado do menor.