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Degradação em cidade gaúcha equivale a 38 superquadras do Plano Piloto

Candiota (RS) ; A exploração de carvão a céu aberto para abastecer a usina termelétrica Presidente Médici durante meio século gerou um passivo ambiental imenso. A degradação ao meio ambiente atingiu uma área de 300 hectares ; o equivalente a 38 superquadras de Brasília.

Um terço desse terreno está em fase de recuperação, com o plantio de eucaliptos e acácias, únicas árvores que resistem às péssimas condições do solo. O que sobra é uma área completamente árida, formada por pedregulhos, restos de carvão, imensas crateras e voçorocas (erosão formada pela água da chuva). A recuperação é difícil porque a terra vegetal retirada do terreno foi perdida, depositada no fundo das covas de carvão. Na Malha 2, abandonada há 25 anos, estão sendo jogados 438 mil m; de entulho da construção da Fase C da usina, obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) inaugurada em janeiro. Nem a Companhia Riograndense de Mineração (CRM) sabe precisar o tempo para a completa recuperação das áreas degradadas e estima que o trabalho estará concluído em ;algumas décadas;.

Na Malha 1, de 60 hectares, que deixou de ser explorada há 38 anos, surgiram drenagens ácidas provocadas por compostos ferrosos expostos após o término da extração do carvão. Faz apenas três anos que começou a ser implantado pela mineradora estatal um sistema de tratamento para despoluir as águas estocadas. ;Isso tem que ser tratado para não poluir os riachos da região;, afirma o assessor ambiental da CRM, Edson Aguiar. Cerca de 45 hectares dessa malha ainda não foram recuperados. Como não nasce vegetação rasteira entre os eucaliptos, o que se espera é a formação de uma camada vegetal pela decomposição das folhas das árvores. Aguiar estima que essa camada vai crescer cerca de 1mm por ano. Tempo de recuperação? ;Vai demorar algumas décadas;, prevê o assessor ambiental.

Ele lembrou que as áreas foram degradadas antes da aprovação das leis ambientais, no fim dos anos 1990, mas acrescentou que é compromisso da empresa recuperar esses terrenos. O assessor informou que o plantio de eucaliptos e acácias foi iniciado há 10 anos. Portanto, esses terrenos ficaram algumas décadas sem qualquer processo de recomposição.

Exploração
A extração de carvão na Malha 1 ocorreu de 1961 a 1973. A Malha 2, de 240 hectares, foi explorada de 1974 a 1986. Na Malha 4, atualmente em operação (a Malha 3 ainda não foi utilizada), estão sendo seguidos os padrões mais modernos de recuperação do solo. A terra vegetal (primeira camada), que tem material orgânico, é retirada e guardada em depósito. Depois, a segunda camada, mais profunda e rochosa, também é armazenada. Acontece, então, a mineração das jazidas de carvão. Concluída a extração, são devolvidas as camadas rochosas e a terra vegetal, para que ocorra o plantio de mudas de árvores nativas.

A CRM autorizou, inicialmente, o Correio a visitar os terrenos degradados e os locais onde ocorre a recuperação modelo. Após duas horas percorrendo viveiros de mudas e plantio de árvores nativas, a empresa informou que não estava mais autorizada a visita à Malha 1, a mais degradada. No acesso ao terreno, que é cercado, há uma guarita com vigias e portões fechados a cadeados. A reportagem precisou caminhar por duas horas pelos campos de uma fazenda vizinha até chegar à Malha 1. Ali há um deserto de pedregulhos no meio de uma típica paisagem de Pampa. Em parte da área crescem eucaliptos ou chircas ; uma planta daninha de até 2m, considerada praga na agricultura. Há restos de cabos de aço espalhados. Nas baixadas, pequenas barragens tentam segurar a erosão. Há dezenas de voçorocas nas ladeiras, algumas com até 5m de profundidade.

Na Malha 2, onde cerca de 100 hectares estão em recuperação, também são visíveis enormes voçorocas ao longo das encostas. Raízes de eucaliptos estão expostas pela erosão. No interior da plantação de árvores, há crateras imensas. Para tentar conter a erosão, foram jogados restos de construção no local. ;São os entulhos das obras da Fase C da usina termelétrica;, informou um funcionário da CRM que acompanhava o Correio. Questionado se esse procedimento estava de acordo com as normas ambientais, ele respondeu: ;Já está degradado, não é?;. Um relatório de vistoria do Ibama, realizado em 20 de outubro do ano passado, registra que os resíduos sólidos de classe A (438 mil m; de terraplanagem, escavações e concretagem) foram ;destinados às áreas mineradas da CRM, devidamente licenciadas para essa disposição;.