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Série de erros põe inocente na cadeia em Minas Gerais

O tecnólogo em redes de computadores Guilherme Assunção Outeiro, de 38 anos, passou neste fim de semana pelos momentos mais difíceis da sua vida. Ele estava com a família em casa, no Edifício JK, no Bairro Barro Preto, Região Centro-Sul de Belo Horizonte, quando foi acordado, às 6h da manhã de sábado, por policiais civis da Delegacia de Pedro Leopoldo, na região metropolitana, usando toucas ninja e armamento pesado. Por eles, ficou sabendo que havia um mandado de prisão expedido em seu nome pela Justiça de Sete Lagoas. A acusação: sequestrar e manter em cárcere privado uma jovem de 17 anos, que no dia 5 viajou para Salvador (BA).

Antes que os policiais fizessem uma varredura de duas horas no apartamento, revirando quartos e outros cômodos sem encontrar qualquer indício de participação do tecnólogo no crime, ele explicou para os civis que havia perdido todos os documentos em setembro de 2008 e que, na ocasião, registrou boletim de ocorrência na Área Integrada de Segurança Pública do JK. ;Mostrei o BO e contei a eles que a pessoa que encontrou os documentos usou minha carteira de identidade e CPF para adquirir linhas telefônicas, que tive restrições no Serasa e recebi até ameaças do falsário;, disse Guilherme. Mesmo assim, ele foi levado algemado para a Delegacia de Pedro Leopoldo. Foram apreendidos o computador, o celular do acusado e até o controle da televisão.

Depois que o tecnólogo já estava atrás das grades, a verdadeira história começou a aparecer: dois anos e seis meses depois do registro de queixa pela perda dos documentos, o falsário conseguiu comprar duas passagens aéreas para Salvador, uma em nome de Guilherme e a outra para a adolescente, com partida no dia 5 e retorno em 7 de março, pelo Aeroporto Internacional Tancredo Neves, em Confins. A jovem havia dito à família que viajou para a Bahia em companhia de amigos. Como não retornou no dia previsto, os parentes começaram a telefonar e ela informou que não tinha data certa para voltar. Os familiares, então, suspeitaram de que a garota estava sendo orientada por alguém que a mantinha em cárcere privado.

Prisioneiro

A denúncia dos parentes da jovem deu origem à sequência de equívocos da polícia e da Justiça, que resultou na prisão de Guilherme. Depois de ter a casa revirada e ser conduzido algemado, ele foi fichado, tirou fotos, prestou depoimento para a equipe policial de plantão e chegou a ser encaminhado ao presídio de Pedro Leopoldo. ;Tive que usar o uniforme vermelho (da Subsecretaria de Estado de Administração Penitenciária). Não tinha chinelo e fiquei descalço na cela;, disse o tecnólogo.

O advogado de Guilherme, Hudson Maldonado Gama, denuncia uma série de irregularidades. Ele afirma que, ao chegar à Delegacia de Pedro Leopoldo, não teve acesso ao inquérito. ;Falei para a delegada de plantão sobre as nossas dúvidas, que a mãe da adolescente não registrou queixa de sequestro, mas apenas informou à polícia que ela foi viajar e não teve mais notícia dela. Eles me falaram que procuravam uma testemunha, mas ela estava curtindo o carnaval de Salvador. Não me deixaram ver o inquérito, o que contraria dispositivo expresso da Constituição e o estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil.;

Segundo ele, a delegada informou que o inquérito estava com a Justiça. ;Mentira. A Justiça não fica com os autos da investigação. Como um advogado pode fazer a defesa de alguém, se não tem acesso aos autos? Fiquei na porta da delegacia, que foi fechada, e falei que só sairia dali após uma solução;, disse Gama, que já foi delegado. O cliente dele só foi liberado às 18h de sábado.

O advogado ressalta que, por ter bons antecedentes e domicílio fixo, não haveria a necessidade de a Justiça decretar a prisão preventiva de Guilherme, por cinco dias. ;Ao mesmo tempo que prenderam um inocente, negaram a ele o direito de defesa.; Quando os policiais civis foram ao edifício JK, eles já tinham as imagens do falsário que comprou os bilhetes aéreos, mas não as cenas da pessoa que embarcou com a menor, o que, segundo eles, justificaria a prisão do tecnólogo. Só depois é que foram buscar as imagens em Confins.

Gama deverá entrar com ação indenizatória em favor de Guilherme. O delegado Sérgio Fleury Paranhos Belizário, que preside o inquérito, informou que prisão foi feita dentro dos preceitos legais e que o acusado foi liberado assim que a situação ficou esclarecida. A polícia descartou a possibilidade de a adolescente ter sido sequestrada. O delegado disse ainda que não houve cerceamento ao trabalho do advogado do tecnólogo.