Daniel Camargos
Maria Clara Prates
Mais de mil haitianos que migraram para o Brasil em busca de emprego estão no limbo burocrático e não sabem se poderão permanecer aqui. Vítimas da miséria, de uma epidemia de cólera e de um devastador terremoto, que matou mais de 150 mil pessoas em janeiro do ano passado, os haitianos recorrem ao país em busca de oportunidades de emprego e de dinheiro para mandarem aos familiares. Porém, o governo brasileiro, que começou a recebê-los como refugiados, suspendeu os protocolos e não dá sinal do que fará com eles.
Até o início do mês, para conseguirem a permanência, os haitianos davam entrada a um pedido de refúgio e recebiam um protocolo, que possibilita a emissão de documentos e, consequentemente, a procura por um emprego. Porém, o Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), órgão do Ministério da Justiça, afirma que os haitianos não preenchem os requisitos. Com a emissão do protocolo suspensa, os haitianos que chegam ficam limitados às cidades fronteiriças, principalmente Tabatinga, no Amazonas, e Brasileia, no Acre.
;A Polícia Federal cumpre a recomendação de não emitir o protocolo até que o governo decida o que fazer. A decisão deve sair quinta-feira;, informa o superintende da Polícia Federal no Amazonas, Sérgio Fontes. De acordo com a corporação, no ano passado, em Tabatinga, 475 haitianos receberam o protocolo de refugiado. Neste ano, foram mais 342, totalizando 817. Na manhã de sexta-feira, outros 30 haitianos chegaram à cidade da fronteira e mais 74 aguardam atendimento na cidade. Enquanto a decisão não sai, ficam abrigados em ginásios das cidades, com a comida fornecida pela Pastoral do Migrante, da Igreja Católica.
Sérgio Fontes explica que, até que o governo federal tome uma decisão, os haitianos não podem ser expulsos, mas devem ficar nas cidades fronteiriças. ;Eles não têm autorização para passar pelos postos de fiscalização no Rio Solimões ou pelo aeroporto, sem o protocolo de refugiado. Se tentarem, podem ser deportados;, explica o delegado. Além disso, os haitianos que já conseguiram o protocolo de refugiado e estão em outras cidades, como Manaus, devem se apresentar à PF a cada três meses. Caso o governo não conceda um visto especial, serão deportados.
Para ser enquadrado como refugiado, segundo a legislação brasileira, é preciso ter a liberdade ameaçada, em virtude da raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opinião política.
Contaminação
A secretária municipal de Saúde de Brasileia, Antônia Kerdis, informa que a cidade está em alerta devido ao surto de cólera no Haiti. Segundo o Ministério da Saúde, existe o risco de contaminação. ;Estão sendo realizadas todas as medidas de vigilância para que, se houver algum caso, ocorra uma rápida detecção e resposta imediata para evitar a propagação da doença;, informa o ministério, em nota. De acordo com Antônia, 239 haitianos passaram pelo controle de fronteira em Brasileia desde janeiro. ;Não para de chegar. A cada dia chegam mais.;
PF quer barrar ilegalidade
; Um dos motivos alegados para suspender os protocolos para pedidos de refugiados foi uma possível brecha para o tráfico humano. Porém, o superintende da Polícia Federal no Amazonas, Sérgio Fontes, entende que o estímulo para que os haitianos entrem no país ilegalmente é pequeno. ;Assim, eles não vão conseguir os documentos e também não conseguirão empregos;, afirma. O delegado explica que os haitianos formam uma rede de contato e informam os conterrâneos sobre as boas oportunidades de emprego no Brasil, o que motiva um número cada vez maior do fluxo. Fontes diz que os haitianos já aperfeiçoaram a rota e, com o conhecimento do trajeto, passam a gastar menos tempo. ;O que eles gastavam 24 dias antes, agora estão levando 12 dias;, calcula.