Jornal Correio Braziliense

Brasil

RJ: Abastecimento volta ao normal, mas risco de contaminação é alto

Número de vítimas na região serrana já passa dos 700

Aos poucos, as concessionárias responsáveis pelo abastecimento da região serrana do Rio de Janeiro concluem os trabalhos de recondicionamento das estações de tratamento e voltam a fornecer água aos municípios atingidos pela chuva. Ontem, a Nova Cedae, que atende Teresópolis e Sumidouro, informou que voltou a operar com 100% da capacidade e a concessionária Águas de Nova Friburgo estima índice de 65% de funcionamento.

Apesar de a estrutura de bombeamento e as estações de tratamento voltarem a funcionar, especialistas ouvidos pelo Correio apontam para o risco de contaminação das águas. De acordo com o presidente da Associação Brasileira de Geologia de Engenharia Ambiental (ABGE), Fernando Kertzman, a mudança dos cursos d;água e a grande quantidade de material orgânico levado para os mananciais com os deslizamentos prejudicará a qualidade da água pelos próximos três meses, pelo menos. ;Nesse primeiro momento, o problema é a qualidade da água. Ela vem com muito barro e matéria orgânica em suspensão. É importante que se oriente a lavar os reservatórios assim que volte o abastecimento. Até julho, ainda vai ter muito trabalho.;

O coordenador do Programa de Pós-Graduação em Tecnologia Ambiental e Recursos Hídricos da Universidade de Brasília (UnB), Marco Antônio Almeida de Souza, afirma que, apesar de o abastecimento ter sido regularizado, os agentes públicos devem orientar a população a não beber nem usar a água para cozinhar, pois apesar de as estações de tratamento funcionarem, os dutos que se ligam aos reservatórios das cidades e das casas podem estar contaminados. ;Em muitos casos, é aconselhável cessar o fornecimento por segurança, para baixar o risco de saúde pública. A água não é recomendável para consumo potável, ingestão e cozimento;. Souza acrescenta que outra característica dessa água é a ;dosagem de segurança;, que aumenta a quantidade de cloro. Por isso, a doação de água mineral para as vítimas é tão importante.

De acordo com o engenheiro sanitarista, moradores da região urbana correm o risco de contaminação com doenças como o tifo e a leptospirose e de região rural com a contaminação das cisternas com fertilizantes químicos. A presença de corpos, no entanto, não é uma preocupação, segundo o especialista. ;O pior problema quando se tem inundação é a mistura de resíduos. O esgoto é misturado com essas águas e aparece uma série de doenças típicas de regiões inundadas que são posteriores à tragédia. Quando começar a secar, surgem os problemas de saúde pública. A poeira contém contaminação;, pontua o professor. Preocupados com a poeira, moradores já circulavam de máscaras pela região.

Ontem, voltou a chover forte na serra fluminense. Os moradores ficaram assustados, temendo novos deslizamentos. Apesar da chuva, as equipes continuaram o trabalho de desobstrução das estradas. Para amenizar a dor dos aproximadamente 14 mil desabrigados das chuvas, os governos estadual e federal iniciaram mobilização para construção de casas populares e distribuição de recursos para pagamento do aluguel social. Uma fazenda de 190 hectares em Teresópolis foi desapropriada para a construção de 500 moradias. As obras terão início em fevereiro e custarão R$ 24 milhões.

De acordo com balanço da Defesa Civil divulgado ontem, 701 pessoas morreram em decorrência da tragédia. Mas o número pode ser maior, pois as equipes ainda não conseguiram ter acesso a algumas regiões rurais. Para vencer o isolamento ocasionado pela destruição de vias, o Exército vai construir uma ponte móvel na zona rural de Teresópolis. O Ministério da Integração informou que enviará 4 mil cestas de alimentos para o estado. A polícia encontra dificuldade para fiscalizar a entrega de donativos. Ontem, dois suspeitos foram presos acusados de tentar desviar caminhão repleto de doações que saía da Zona Norte, da capital.

ALERTOU OU NÃO ALERTOU?
Durante a entrevista a jornalistas, concedida em Nova Friburgo, o governador do Rio, Sérgio Cabral, se irritou e responsabilizou o Instituto de Meteorologia (Inmet) por não ter enviado alertas sobre as chuvas que causariam a maior devastação já sofrida pela região serrana do Rio. Segundo Cabral, os informativos repassados á Defesa Civil não eram detalhados. ;A Defesa Civil do estado repassou às cidades um alerta que ela recebe todos os dias, de chuva moderada a forte. O que você interpreta de chuvas moderadas a fortes, se toda vez você recebe o mesmo relatório?; questionou. O Inmet, no entanto, rebate afirmando que o aviso enviado na segunda-feira, dia 11, frisava a anormalidade do tempo na região. ;O aviso previa condições meteorológicas favoráveis à ocorrência de chuva moderada a forte, com trovoadas e rajadas de ventos no sul fluminense, região serrana e Vale do Paraíba do Rio de Janeiro. Também um significativo acumulado de chuva em todo o estado;, afirma o meteorologista Hamilton Carvalho.

Esplanada a postos

Ana Elisa Santana

As vítimas das chuvas na região serrana do Rio poderão sacar a primeira parcela do aluguel social na primeira semana de fevereiro. Segundo o governador do estado, Sérgio Cabral, as prefeituras dos sete municípios atingidos já fazem o cadastramento de desabrigados para a aplicação dos R$ 30 milhões que foram repassados pela União. O benefício deve ser distribuído entre 5 mil famílias, durante um ano.

O governador sobrevoou ontem, com os ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo; da Integração Nacional, Fernando Bezerra; e da Defesa, Nelson Jobim, as áreas afetadas de Nova Friburgo e Teresópolis. Em seguida, reuniram-se com outras autoridades estaduais e municipais na prefeitura de Nova Friburgo para discutir a logística de auxílio às vítimas.

Cabral afirmou que está negociando com o governo federal alterações no programa Minha Casa, Minha Vida para acelerar a construção de 5,6 mil casas populares e abrigar as famílias que estão alojadas em abrigos improvisados. Outra medida para a recuperação dos municípios é um plano econômico para possibilitar capital de giro ao comércio e reconstruir a infraestrutura em turismo, indústria e produção agrícola locais.

O ministro Fernando Bezerra afirmou, em Nova Friburgo, que deve se reunir hoje com os ministros da Fazenda, Guido Mantega, e da Casa Civil, Antônio Palocci, para discutir a questão. Disse também que passará a visitar a região devastada de duas a três vezes por semana para acompanhar o resgate e socorro às vítimas, seguindo determinação da presidente Dilma Rousseff.