Responsável por uma das polícias mais letais do Brasil, o governo do Rio de Janeiro diverge sobre a relação de mortos na megaoperação no complexo de favelas do Alemão e na Penha. Segundo a Polícia Militar (PM-RJ), foram 37 óbitos no combate. Já a Polícia Civil contabiliza apenas 17 mortos. A Defensoria Pública e o Ministério Público do estado não receberam da Secretaria de Segurança Pública do Rio a relação com os nomes dos mortos. O Ministério da Justiça também não foi informado.
Um relatório produzido pelo próprio governo fluminense revela que até setembro deste ano 626 pessoas morreram em confrontos com a polícia, registrados nos chamados ;autos de resistência;. Nesse mesmo período, 15 policiais foram mortos em serviço: 10 são PMs e cinco pertencem à polícia civil. Os dados demonstram, segundo especialistas, um elevado índice de abuso de força policial. Em setembro, por exemplo, foram 34 mortes, o que significa mais de uma morte por dia. Nesse mesmo mês, três policiais morreram. O número é quase o mesmo que o registrado oficialmente pela polícia em uma semana de operação.
A assessoria de imprensa da PM-RJ alega que desconhece a identidade dos mortos durante as operações. Porém, no último sábado, a reportagem do Correio presenciou a chegada do corpo de Davi Basílio Alves, 17 anos, ao Hospital Getúlio Vargas, na Penha. O corpo do jovem, morador da Vila Cruzeiro e traficante, foi levado pela própria família. Havia, no local, policiais militares que registraram a chegada do corpo e a identidade.
Já a Polícia Civil apresenta uma lista com nome, idade e bairro onde morava de 13 dos 17 mortos contabilizados pela unidade policial. Esse é o número passado à Polícia Civil pelo Instituto Médico Legal (IML), depois da perícia. A reportagem, entretanto, não conseguiu contato com o IML do estado.
;É preocupante que a secretaria não divulgue essa relação. A sociedade precisa de esclarecimentos de quantas foram as mortes e as respectivas causas;, defende o especialista em Segurança Pública Ignácio Cano. Segundo ele, denúncias sugerem que o número de mortos é ainda maior e que haveria corpos nas comunidades.
OS NOMES
Lista com a identidade de 13 dos 17 mortos nos conflitos, segundo a Polícia Civil
; Valdemiro Carlota, 45 anos, Vila Cruzeiro
; Everson Carlos Conceição Gonçalves, 19 anos, Favela do Jacarezinho
; Wilian Calixto de Andrade, 20 anos, Favela do Jacarezinho
; Jonatan Rosa Bonfim, 21 anos, Favela do Jacarezinho
; Manoel Dionizio da Silva Nogueira, 20 anos, Favela do Jacarezinho
; Felipe Bittencourt de Carvalho, 18 anos, Favela do Jacarezinho
; Emerson de Souza Thomé, 25 anos, Favela do Jacarezinho
; Sergio Silva de Medeiros, 25 anos, Favela do Jacarezinho
; João Carlos dos Santos Alves, 19 anos, Favela do Jacarezinho
; Thiago Ferreira Faria, 22 anos, Alemão
; Anderson Domingues Mendes, 20 anos, Alemão
; Davi Basílio Alves, 17, Vila Cruzeiro
; Rogério Costa Cavalcante (não foram divulgados a idade nem onde ele morava)
Fonte: Polícia Civil
MORADORES COBRAM RESPEITO DA POLÍCIA
; Movimentos sociais do Complexo do Alemão cobram avanços nas políticas públicas para a região e pedem respeito aos direitos humanos. Uma das reclamações está relacionada à forma como muitos policiais têm entrado nas casas, arrombando portas e quebrando móveis. O assunto foi debatido na tarde de ontem durante reunião entre entidades da sociedade civil e de proteção ao meio ambiente que atuam na área. O encontro foi organizado pelo Comitê de Desenvolvimento Local da Serra da Misericórdia (CDLSM), que reúne organizações não governamentais que atuam no Alemão e no seu entorno. As reivindicações foram apresentadas em um documento de três páginas, ;com o objetivo de aprofundar o debate com a sociedade, o Poder Público e a mídia, para além da ocupação militar;. ;São necessários investimentos para tirar do papel um conjunto de propostas e projetos de caráter socioambiental, cultural e nas áreas de educação, saúde, mobilidade urbana, saúde ambiental, esportes, assistência social e segurança pública;, ressalta o documento.