Rio de Janeiro ; O sábado de guerra colocou em tensão máxima os dois lados em combate, sob risco iminente de invasão policial e confronto direto. Dentro do Complexo do Alemão, na Zona Norte do Rio, 500 traficantes foram acuados pela ofensiva da polícia e passaram a considerar a possibilidade de rendição. No cerco montado em volta do complexo de favelas ; o conjunto é tido como o mais violento e importante para o narcotráfico no Rio ;, 800 militares da tropa de elite do Exército e a Polícia Militar fluminense se preparavam para invadir o Morro do Alemão, com o suporte de policiais federais e apoio de helicópteros da Aeronáutica e da Polícia Civil. A PM deu o recado mais de uma vez: iria invadir o conjunto de favelas e, a exemplo do que ocorreu na Vila Cruzeiro, na quinta-feira, retomar o território dominado pelo tráfico. No fim do dia, os primeiros traficantes se renderam e se entregaram, sem armas, à polícia.
Diante da possibilidade do ;banho de sangue;, como aventaram entidades e militantes de defesa dos direitos humanos, um emissário foi até os traficantes para evitar um confronto direto com a polícia: José Júnior, coordenador da organização não governamental Afroreggae. Ele anunciou as primeiras rendições no meio da tarde, após breve conversa com traficantes. No local indicado pela PM, uma esquina na entrada do Morro da Grota, os primeiros bandidos se apresentaram. Um tanque de guerra aguardava os traficantes, entre eles Diego da Silva dos Santos, conhecido como Mister M. Ele é tido como braço direito da chefia do tráfico no Alemão. Ele foi apresentado à polícia pela mãe.
A operação no conjunto de favelas foi realizada sob intensos tiroteios, intensificado a partir das 17h, inclusive com arremesso de uma granada por parte da polícia. Os tiroteios ocorreram em diferentes favelas. A ação policial esteve concentrada no Complexo do Alemão, para onde cerca de 200 traficantes fugiram na quinta-feira após a tomada pela polícia da favela da Vila Cruzeiro, no Complexo da Penha. Os dois complexos são vizinhos e, assim que o Batalhão de Operações Especiais (Bope) da PM entrou na Vila Cruzeiro ; com o suporte de tanques blindados da Marinha ;, os bandidos fugiram para as favelas do Alemão. A estimativa da polícia é de que eles se somaram a mais 300 traficantes que comandam o crime na região.
Dezenas de pessoas foram presas ontem na base do Morro do Alemão. Moradores das imediações manifestavam discordância com as prisões: ;Só estão levando os ;noias;;, gritavam, numa referência a usuários de drogas que, para esses moradores, não teriam relação com o tráfico. Nas proximidades da Estrada do Itararé, a mais vigiada pela polícia, podia ser percebida uma relativa tranquilidade da população. Pouco depois do bloqueio feito por militares do Exército e da Marinha, nas ruas e nas vielas que cruzam a Itararé ; ainda na parte plana do complexo de favelas ;, moradores conversavam nas portas de casa e crianças jogavam bola.
Quase todas as esquinas da Itararé eram vigiadas por militares do Exército. Eles portavam fuzis e tinham como principal função dar apoio e orientação à população. Um tanque Urutu, da Marinha, foi colocado na estrada. A mira estava voltada para a rua onde deveria ocorrer as rendições de traficantes, conforme a definição da Polícia Militar, e para o próprio Morro do Alemão. Ação aliada ao cerco do Morro do Alemão, uma vistoria na Vila Cruzeiro, identificou dinamites, armas de fogo e drogas que antes estavam em poder dos traficantes. Mas era do cerco policial montado em torno do Alemão que partiam os principais recados para os traficantes isolados nas favelas. Durante todo o dia, e também no início da noite, o comando da PM mantinha a ameaça de invadir o morro para prender os bandidos. O prazo dado era o dia de ontem, até ;o sol se por;.
Se as rendições não fossem expressivas, em termos numéricos, a Polícia Militar ameaçava entrar no complexo do Alemão ainda durante a noite de ontem. A Polícia Federal vai dar suporte. Vinte e dois policiais do Comando de Operações Táticas da PF já estão no local e outros oito chegariam à noite.
FERIDOS E MORTOS NO HOSPITAL
Dois dias depois da operação que expulsou os traficantes da Vila Cruzeiro, um carro estacionou no início da noite de ontem à frente do Hospital Getúlio Vargas transportando o corpo de um adolescente de 17 anos, que morava na favela. O motorista se identificou como Sindiclei Vieira à reportagem do Correio e disse que o ;sobrinho distante; traficava drogas na favela. ;Encontramos o corpo no mato, já em decomposição. Ele estava sumido há três dias.; Uma mulher que dizia ser sogra do adolescente afirmou que o jovem ganhava do tráfico R$ 100 por semana. ;Eu ia conseguir tirar ele, mas não deu tempo. A polícia pode prender, mas não pode matar.;